Arquitectos brasileiros vencem Prémio RIBA com residência estudantil feita com a ajuda dos alunos

Auxiliado pelo designer Marcelo Rosenbaum, o atelier Aleph Zero conquistou o júri deste importante prémio internacional com um projecto para uma zona rural e remota do Brasil.

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A residência estudantil da Escola Canuanã, no estado de Tocantins Aleph Zero
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A residência estudantil é um pavilhão construído em madeira e tijolo artesanal Aleph Zero
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Preparadas para o clima tropical, as paredes construídas em tijolo artesanal permitem uma ventilação natural Aleph Zero
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“Na verdade o projecto acaba virando uma grande varanda”, diz o arquitecto Gustavo Utrabo Aleph Zero
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O edifício organiza-se à volta de três pátios Aleph Zero
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Marcelo Rosenbaum, um dos mais importantes designers brasileiros, e o Aleph Zero, um jovem atelier de arquitectura, foram os vencedores do Prémio Internacional RIBA, atribuído de dois em dois anos pelo Royal Institute of British Architects (RIBA), a associação profissional de arquitectos do Reino Unido. O RIBA 2018, anunciado na terça-feira à noite, distinguiu uma residência para estudantes da Escola Canuanã, construída numa zona rural e remota do Brasil.

O estúdio de Marcelo Rosenbaum é conhecido pelo seu design social que tem uma forte componente de intervenção na comunidade, o chamado “design de comunidade”. Já a dupla de jovens arquitectos do atelier Aleph Zero, Gustavo Utrabo e Pedro Duschenes, tem pouco mais de 30 anos e uma obra ainda escassa.

O projecto dos arquitectos brasileiros “ilustra o valor imensurável da boa arquitectura educativa”, diz o comunicado de imprensa do prémio, cujo júri foi presidido pela arquitecta norte-americana Elizabeth Diller. A última edição do RIBA distinguira, também por uma escola, a Universidade de Engenharia e Tecnologia em Lima, no Peru, o atelier irlandês Grafton Architects, das arquitectas Yvonne Farrell e Shelley McNamara, curadoras da última Bienal de Arquitectura de Veneza.

A residência estudantil agora premiada consiste num pavilhão construído em madeira e tijolo artesanal para uma escola no estado de Tocantins – encomenda da Fundação Bradesco, que tem uma acção de décadas dedicada ao apoio da escolaridade em comunidades rurais do Brasil. Situada numa fazenda do município de Formoso do Araguaia, a residência com 25 mil metros quadrados destina-se a albergar 540 crianças da Escola Canuanã, com idades entre os 13 e os 18 anos, que vivem em zonas distantes do estado.

A metodologia utilizada pelos arquitectos, explicou Gustavo Utrabo ao PÚBLICO numa breve conversa telefónica, foi a do projecto A Gente Transforma, de Marcelo Rosenbaum, muito conhecido no Brasil. “Tentámos criar um engajamento nas pessoas, escutar as pessoas.” Passou-se do design de comunidade à arquitectura de comunidade. Ouviram-se administradores, professores, mas principalmente os utilizadores futuros do edifício – as crianças. “O objectivo é criar um vínculo entre a comunidade e a ideia do projecto. A metodologia veio para colaborar com o entendimento do lugar.” 

Na memória descritiva que encontramos no site do atelier Aleph Zero, Gustavo Utrabo e Pedro Duschenes citam “a imensidão do cerrado, a infinitude do céu e os saberes populares” como premissas do projecto. “Como intervir num lugar marcado pelo trabalho manual da lavoura e pela natureza indígena”, num mundo que, ao mesmo tempo, se globaliza e perde as memórias locais? O projecto, justificam, incentivou “técnicas construtivas locais”, como os tijolos moldados em terra, sublinhando a importância de novos modelos de habitação sustentável.

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A residência estudantil é um pavilhão construído em madeira e tijolo artesanal para uma escola no estado de Tocantins Aleph Zero

O pavilhão é, na prática, uma grande cobertura metálica, capaz de criar uma extensa zona de sombra, sobre uma estrutura de madeira pré-fabricada com um núcleo central feito em tijolo. “Na verdade o projecto acaba virando uma grande varanda”, explica Gustavo Utrabo ao PÚBLICO. Uma grande varanda com dormitórios e espaços flexíveis de estudo e lazer adaptados ao clima tropical e às altas temperaturas que se sentem no Verão em Tocantins.

O espaço da residência organiza-se de forma simétrica, com alas para raparigas e rapazes, à volta de três pátios. Os dormitórios deixam, no entanto, de ser grandes espaços colectivos para se dividirem em 45 quartos com capacidade para seis alunos cada um.

“O projecto mostra como a arquitectura pode ser um instrumento de transformação social. [Os arquitectos] trabalharam de perto com as crianças para identificar as suas necessidades e desejos. Procuraram criar um ambiente que pudesse ser uma casa longe de casa, onde as crianças pudessem desenvolver, ao mesmo tempo, um forte sentido de individualidade e de pertença”, acrescenta o comunicado do RIBA. Os jovens arquitectos relatam que foi uma alegria ver as crianças a apropriarem-se do espaço: “Quisemos ser prescritivos sem ser arrogantes, dar apoio sem ser paternalistas, encorajar o crescimento e o desenvolvimento sem tornar as crianças mimadas.”

Rosenbaum e Benguela, também citados pelo comunicado de imprensa, explicam que o espaço facilita a interacção entre público e privado: “Uma socialização entre o colectivo, a natureza e o indivíduo, religando as crianças e os jovens com as suas origens e o ecossistema circundante”.

O presidente do RIBA, Bem Derbyshire, citado pelo jornal brasileiro Folha de São Paulo, destacou o carácter “filosófico e cuidadoso” dos arquitectos e considerou o trabalho “impressionante”.

O Prémio RIBA 2018 ganha novas leituras neste Brasil saído das últimas eleições presidenciais em que o futuro da educação foi um dos temas mais fracturantes.

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