O trabalho vem comigo para casa

A escravidão do telemóvel, dos dois e-mails do trabalho e dos três telemóveis que nos "dão”, do computador, das chamadas constantes, a qualquer hora, em qualquer dia, ao jantar durante a semana, ao sábado no cinema, quando estamos com amigos ou familiares.

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Marco Duarte

Nem podia ser de outra maneira. Chamam-lhe flexibilização, ou tempos modernos, se preferirem.

Nós chamamos-lhe escravidão. A escravidão do telemóvel, dos dois e-mails do trabalho e dos três telemóveis que nos "dão”, do computador, das chamadas constantes, a qualquer hora, em qualquer dia, ao jantar durante a semana, ao sábado no cinema, quando estamos com amigos ou familiares, na praia durante as férias.

Porquê? Porque o trabalho tem de aparecer feito e ai de quem não o faça, há objectivos a cumprir, semanais, mensais, anuais. Se não cumprirmos, apelidam-nos de incompetentes à frente de toda a gente e quem não cumprir acaba na rua.

A precariedade é constante mas a exigência é sempre maior entre relatórios, minutas, contratos, perguntas e respostas, mais relatórios, reuniões, procedimentos, registos diários, estatísticas e análise de dados, de manhã à noite, sete dias por semana, 365 dias por ano.

Temos um tempo de resposta mínimo para os e-mails: cinco minutos. É tudo registado pelos recursos humanos, à primeira falha temos uma chamada de atenção, à segunda uma reunião com o coordenador de departamento e à terceira um incumprimento. Mesmo quando o e-mail cai às 23h e a vida dorme ou quer dormir. O sistema não pára e os telemóveis também não: estão sempre ligados, estão sempre na ficha.

E os recursos humanos também têm incumprimentos? E as chefias também têm incumprimentos?

O trabalho vem comigo para casa todos os dias e dorme comigo todos os dias. Não há limites, apenas objectivos, cada vez mais distantes, e eu, e todos nós, cada vez mais cansados, cada vez mais distantes, separados, zangados, divorciados, a troco de nada, o ordenado mínimo se dividirmos o salário pelas 260 horas mensais mais uns trocos.

Mas não podia ser de outra maneira. É a flexibilização do trabalho, mas como somos jovens temos de aguentar. Resta saber até quando.

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