Uma em cada três infecções hospitalares envolve bactérias resistentes a antibióticos

Uso excessivo de antibióticos após cirurgias preocupa o Centro Europeu de Prevenção e Controlo de Doenças. Esta quinta-feira é divulgado o retrato das infecções por bactérias resistentes a antibióticos.

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Paulo Pimenta

A Europa evolui a vários ritmos na redução do uso de antimicrobianos, em especial de antibióticos, numa tentativa de travar o aumento da resistência de bactérias a estes fármacos. Certo é que ainda há focos de consumo excessivo. Além de colocar isso em evidência, os mais recentes estudos do Centro Europeu de Prevenção e Controlo de Doenças (ECDC, na sigla inglesa) concluíram que uma em cada três bactérias que estão na origem de infecções nos hospitais europeus é resistente a antibióticos.

A totalidade das conclusões dos estudos do ECDC sobre prevalência de infecções, consumos de antibióticos e resistência em 2016-2017 é apresentada esta quinta-feira, Dia Europeu do Antibiótico, em Bruxelas.

Entre 29 países analisados (28 do Espaço Económico Europeu mais a Sérvia), a proporção de antibióticos de largo espectro administrados nos hospitais varia entre 16 e 62%. No topo está a Bulgária, logo seguida pela Itália. Portugal aparece em oitavo lugar, perto dos 50%. O que quer dizer que quase metade dos antibióticos prescritos na amostra de hospitais e unidades de cuidados continuados portugueses analisada são fármacos que actuam sobre um grande número de espécies de bactérias (como as cefalosporinas de terceira geração, piperacilinas e inibidores da beta-lactamase).

Os antimicrobianos nem sempre são necessários e o seu uso tem uma relação directa com o aumento da resistência das bactérias. Sem a interrogação deste ciclo, começam a esgotar-se opções terapêuticas. O que o ECDC volta a focar é que há espaço para melhorias em muitos hospitais. Até porque as infecções relacionadas com os serviços de saúde continuam a ser uma das suas principais fragilidades. E todos os anos há cerca de 8,9 milhões de infecções nos hospitais com doentes agudos e unidades de cuidados continuados, estima. “Mais de metade são consideradas preveníveis.”

Os estudos demonstram ainda que um em cada três utentes hospitalizados recebeu, pelo menos, um antimicrobiano – dados que resultam da análise dos fármacos administrados num determinado dia.

Antibióticos pós-cirurgia

Um dos aspectos relativamente ao qual o ECDC demonstra maior preocupação tem a ver com a administração de antimicrobianos para prevenir infecções relacionadas com procedimentos cirúrgicos. Metade dos fármacos usados com esse efeito (54,2%) foram administrados durante mais de um dia, “embora a profilaxia [prevenção] antimicrobiana contínua após o término da intervenção não seja recomendada”. Uma dose é “geralmente suficiente”, afirma.

Numa tabela liderada, pela positiva, pela Escócia e Irlanda do Norte, e, pela negativa, pelo Chipre e Roménia, Portugal aparece exactamente a meio: mais de 40% dos medicamentos para profilaxia cirúrgica são administrados durante mais de um dia. A profilaxia cirúrgica é a terceira causa mais comum de prescrição de antibióticos nos 29 países estudados, a seguir ao tratamento de infecções com origem fora do hospital e infecções hospitalares.

Completando este quadro, um outro estudo do ECDC, com 23 países do continente europeu, demonstrou que uma em cada dez prescrições antimicrobianas foi para profilaxia, apesar de os casos para que esta é indicada serem limitados, nota. Nas unidades de cuidados prolongados observadas, 29% dos antimicrobianos tiveram o mesmo fim, a grande maioria (74%) para prevenir infecções do trato urinário. “Embora isso possa reduzir o risco de infecção em mulheres, não há evidências sobre sua eficácia quando aplicadas amplamente a pacientes idosos”, aponta.

Para o ECDC estas proporções podem “representar um uso desnecessário” de antimicrobinaos.

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As medidas de prevenção e controlo destas infecções têm feito o seu caminho nos últimos anos. Dos 1275 hospitais que o ECDC analisou, de 28 países da Espaço Económico Europeu mais a Sérvia, 76% dizem ter directrizes quanto ao uso de antimicrobianos e 54% afirmam que dedicam tempo a esta problemática.

Sem entraves – como técnicas de prevenção e controlo – estas bactérias multirresistentes tem a capacidade de se disseminar entre animais, humanos e o meio ambiente. A directora regional para a Europa da Organização Mundial de Saúde, Zsuzsanna Jakab, apela, por isso, a uma acção concertada como a “única maneira” de manter os antimicrobianos a funcionar.

“[O sector da] "saúde humana, animal e ambiental é igualmente responsáveis pelo uso correcto dos antimicrobianos e por evitar a ameaça da resistência antimicrobiana. À medida que nos esforçamos para garantir que esses medicamentos são usados correctamente na comunidade e nos sistemas de saúde, um sector sozinho não resolverá o problema”, declara, citada no comunicado do ECDC.

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