Futuros médicos deixam de ter de “marrar” no Harrison para escolher especialidade

Em 2019, a nova prova de seriação vai assentar sobretudo no raciocínio clínico, em vez de na memorização. Na próxima semana, 1500 candidatos testam o novo exame numa prova-piloto.

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Rui Gaudencio

Hoje é o último dia do controverso e temido “Harrison”, o exame que há quatro décadas assombra os recém-licenciados em Medicina, porque é a nota que obtêm nesta prova que lhes permite escolher a especialidade a seguir. Esta quinta-feira à tarde, mais de 2700 candidatos passarão duas horas e meia a responder a 100 questões na prova nacional de seriação que há anos vinha sendo muito contestada por assentar na capacidade de memorização até à exaustão de alguns capítulos de um tratado de medicina interna norte-americano, o Harrison.

“Estamos muito satisfeitos com o fim do ‘Harrison’, ainda que os candidatos que vão fazer o novo exame [que vai assentar num paradigma completamente diferente] estejam com algum de receio, porque se trata de uma prova nova”, diz Catarina Perry da Câmara, a presidente do Conselho Nacional do Médico Interno (CNMI).

O certo é que, “do ponto de vista científico, a nova prova faz muito mais sentido”, frisa a médica, que ainda se lembra dos meses que passou a estudar “dez horas por dia” para se preparar para o famigerado exame. Trata-se de uma prova que é determinante para o futuro dos recém-licenciados, porque a nota que obtêm vai permitir-lhes escolher a especialidade que vão exercer no futuro, numa altura em que esta escolha se tem afunilado cada vez mais, por não haver vagas em número suficiente para tantos candidatos.

Se o “Harrison” implica “marrar” ao longo de um ano para se decorar as cerca de mil páginas do tratado, a nova prova vai assentar sobretudo “no raciocínio” e servirá para “avaliar os conhecimentos clínicos” dos candidatos e a capacidade de aplicação prática destes conhecimentos, explica Francisco Mourão, que integra o CNMI e a Secção Regional do Norte da Ordem dos Médicos e participou na elaboração do teste.

A nova prova terá 150 questões de escolha múltipla e durará quatro horas (com um intervalo), integrando já muitas áreas que não eram consideradas para o “Harrison”, como a psiquiatria, a pediatria e a ginecologia, exemplifica. As questões partirão de casos clínicos e o candidato escolherá, no leque das respostas, aquela que representa a melhor forma de abordar as situações. E, em vez da bibliografia obrigatória e única, o tal tratado que recebeu o nome do cardiologista Tinsley Harrison, o seu primeiro editor, passam a ter vários livros recomendados, acrescenta.

O novo exame resultou de um trabalho complexo que vai ser posto à prova na próxima semana, num teste-piloto a que se vão submeter cerca de 1500 voluntários, diz Francisco Mourão. “Foi um parto prolongado e muito difícil”, enfatiza. 

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