O Walkman, o frasco de molho de soja e o comboio-bala são puro design japonês no Porto

Japanese Design Today é a exposição que chegou a Portugal depois de mais de dez anos a viajar pelo mundo. "Estima-se que usemos regularmente na nossa vida quotidiana quase 20 mil produtos" mas estes 100 contam parte da história da cultura material japonesa contemporânea.

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Frasco de 1961, o primeiro que pode ser usado como dispensador tal como é vendido André Rodrigues
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A Nikon F (1959) integra uma série de funções envolta num design fácil de usar André Rodrigues
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Máscara First Face Mask (2011) André Rodrigues
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Tatamet BCP, um capacete dobrável para situações de emergência André Rodrigues
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André Rodrigues
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Garrafas de molho de soja G-Type (1958) André Rodrigues
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André Rodrigues

A exposição chega em caixotes. Vinha num kit, qual Ikea versão Japão, 23 caixotes com cerca de 100 objectos de design japonês no seu interior. Vêm com instruções e parafusos e as instituições que os recebem, como é agora a vez da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto (FBAUP), têm de montar tudo rigorosamente como já foi montado em mais de uma dezena de países. Tudo para o mundo ver o frasco de molho de soja Kikkoman, ou Walkman WM-2 da Sony ou o N.º1 Dress de Issey Miyake e perceber que no fundo está só a revê-los. Clássicos ou modernos, os frutos do design de produto japonês são o Japão, mas também o nosso fascínio por ele.

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Walkman WM-2 André Rodrigues

A mostra vinha então "num kit e é um modelo de exposição muito formatado e estandardizado, mas que funciona”, reconhece Lúcia Almeida Matos, directora da FBAUP na galeria de exposições da faculdade onde também considera que a exposição pode ser útil para "mostrar aos estudantes de museologia e curadoria". Japanese Design Today inaugura-se esta quinta-feira, às 18h, e está no Porto até 15 de Dezembro – também a duração da exposição, um mês certo em cada cidade, está previamente definida pela Japan Foundation, que organiza a mostra. A exposição começou em 2004 e até hoje já passou pela Ásia, América do Norte e agora faz o périplo pela Europa. Começa com uma palestra do designer japonês Hiroshi Tsunoda esta quinta-feira, às 16h, na Aula Magna da Universidade do Porto, e pretende resumir em parte a cultura do Japão desde o pós-guerra até aos nossos dias (o objecto mais recente é de 2012).

“Esta exposição apresenta 100 objectos, 89 exemplos de design de produto que podem ser vistos hoje no Japão e 11 produtos que são característicos do design de produto japonês ao longo das últimas décadas”, diz o crítico de design japonês Hiroshi Kashiwagi no catálogo da exposição. “Estima-se que usemos regularmente na nossa vida quotidiana quase 20 mil produtos, por isso em comparação 100 não é um número muito grande. Acredito, contudo, que estes 100 produtos nos dão uma boa imagem de muitos aspectos da cultura japonesa contemporânea.”

Numa sala, sobre mesas erguidas por cavaletes ou expostos por si só, estão então estes testemunhos da cultura material japonesa e do nosso olhar sempre curioso sobre ela. Um dos principais motivos pelos quais nos atrai, arrisca Luís Pinto Nunes, responsável pela área de exposições da FBAUP, “é a funcionalidade. São objectos que correspondem muito facilmente com uma função, mas há um respeito pelo material”, exemplifica apontando os diferentes usos dados ao papel, do vestuário ao mobiliário e papelaria. Um dos principais conceitos que transmitem, continua, “é uma ideia de respeito pela tradição”.

Como é visível no núcleo dedicado ao design japonês clássico, um de dez e o primeiro em termos cronológicos, que concentra obras-chave de Riki Watanabe – o banco Stool (1956), de orientação mais moderna e internacional, e o Small Clock (2007) que, como brinca Luís Pinto Nunes, “podia estar à venda na Muji”, a loja de design de básicos oriunda do Japão. Mas clássico é também o Walkman WM-2 (1981) “um produto que iniciou um estilo de vida totalmente novo”, como postula Noriko Kawakami, vice-directora do museu de design japonês 21_21 Design Sight, ou o tal frasco de soja (1961, desenhado por Kenji Ekuan) de 150 ml de pura eficiência e elegância discreta à mesa dos restaurantes de sushi de todo o mundo.

Além do design clássico, há outros nove núcleos: mobiliário, transportes, cozinha, roupa e acessórios, crianças, papelaria, hobbies, saúde e design para situações de catástrofe ou emergência. Transmitem, como escrevia em 2014 o crítico Hiroshi Kashiwagi, traços base do design japonês contemporâneo – “qualidades artesanais, minimalismo, atenção, compacto, fofinho”. No fundo, “características profundamente enraizadas na cultura tradicional japonesa”, garante o crítico.

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Vestido N.º1 de Issey Miyake André Rodrigues

Na exposição, aberta de terça-feira a sábado das 14h30 às 18h30, há imagens a representar objectos. Um deles, o mais recente e o número 100, é o comboio-bala que dificilmente caberia numa galeria. Há objectos nas suas mágicas versões “quadrado espalmado” que afinal é um desenho de 2010 do mestre das pregas e do design conceptual Miyake, ou um casaco vermelho que na verdade é um habitáculo para quase tudo transportar para situações de emergência a que o designer Kosuke Tsumura chamou adequadamente Final Home – “Home 1”. Loiça descartável, uma primeira máscara contra infecções para bebés com ursinho em decalque, a segunda versão do walkman da Sony.

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Casaco "Home 1" ANDRÉ RODRIGUES

Mais ou menos reconhecíveis, estes 100 objectos, próteses, motorizadas, rolos de fita-cola irresistíveis ou colheres de gelado que transmitem o calor da mão do utilizador ao doce e o tornam mais fácil de servir. “São objectos tão do nosso quotidiano que é impossível não os considerar – ou então devíamos considerá-los mais”, diz Luís Pinto Nunes, convencido da “organicidade muito própria dos japoneses” a desenhar produto. Aqui resume-se “quase a identidade de um país”.

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