Bolsonaro escolhe "musa do veneno" para ministra da Agricultura

A deputada Tereza Cristina lidera a “bancada do boi” e o seu papel na aprovação de uma lei que torna mais rápida a regularização de pesticidas valeu-lhe uma alcunha pouco simpática.

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A futura ministra da Agricultura, Tereza Cristina,A futura ministra da Agricultura, Tereza Cristina Michel Jesus/Câmara dos Deputados do Brasil,Michel Jesus/Câmara dos Deputados do Brasil
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Campo de Soja em Mato Grosso; nesta cultura são utilizadas grandes quantidades de agrotóxicos Paulo Whitaker/REUTERS

O Presidente eleito do Brasil Jair Bolsonaro escolheu a deputada Tereza Cristina para ministra da Agricultura, após ouvir a sugestão dos dirigentes da influente “bancada do boi”, que reúne os parlamentares apoiados pelo agro-negócio. Cristina era até agora a líder desse grupo e foi a principal responsável pelo avanço de uma lei que liberaliza a utilização de pesticidas na agricultura.

A futura ministra da Agricultura era deputada pelo partido Democratas (DEM), eleita pelo Mato Grosso do Sul, e liderava a Frente Parlamentar Agro-Pecuária (FPA) do Congresso, como é conhecida oficialmente a “bancada do boi”, um dos grupos parlamentares temáticos mais influentes. Entre deputados federais e senadores, há mais de 200 parlamentares de partidos diferentes unidos pelo apoio a uma agenda favorável aos interesses da indústria agrícola.

Bolsonaro anunciou o nome da nova ministra através do Twitter depois de um encontro com membros da bancada ruralista, de acordo com o portal de notícias G1, em que Tereza Cristina foi sugerida para ocupar o cargo. Não é a primeira vez que a líder da “bancada do boi” passa para o Ministério da Agricultura. No final de 2014, Dilma Rousseff nomeou a então deputada e líder da FPA Kátia Abreu como ministra, onde permaneceu até ao impeachment da Presidente. Abreu foi candidata a vice de Ciro Gomes nas últimas presidenciais.

Cristina ficou conhecida como a “musa do veneno” por causa dos seus esforços para que a utilização de pesticidas fosse liberalizada. A deputada presidiu a comissão que em Junho deu luz-verde ao diploma legislativo – que terá ainda de passar pelas duas câmaras do Congresso. Há 12 anos que a proposta estava bloqueada no Congresso. A campanha de recandidatura da deputada recebeu 350 mil reais (82.117 euros) de doações de empresas ligadas ao sector agrícola, de acordo com uma investigação do Repórter Brasil.

Entre outras alterações ao actual regime de aprovação de pesticidas, conhecidos no Brasil como agrotóxicos, o diploma vai permitir que a regularização destes produtos seja mais rápida. Actualmente, há três órgãos que controlam o processo de aprovação dos pesticidas, mas a nova lei irá unificar o procedimento que passa a ficar totalmente sob tutela do Ministério da Agricultura.

O Brasil é já o maior consumidor de pesticidas e herbicidas a nível mundial e os ambientalistas temem que a sua liberalização tenha um impacto ainda maior na saúde de produtores e consumidores. A Greenpeace Brasil cita dados da ONU que apontam para a morte de 200 mil pessoas por ano em todo o mundo por intoxicação causada por pesticidas. O uso destes produtos, diz a organização ecologista, “destrói recursos, afecta a saúde dos trabalhadores, da população e sustenta um modelo de produção injusto”.

A nomeação de Tereza Cristina não foi, porém, pacífica no seio do sector agro-alimentar. O presidente da União Democrática Ruralista, Luiz Antonio Nabhan, outro grupo de defesa dos interesses agrícolas no Congresso, contava com a sua nomeação para ministro, dada a sua proximidade com Bolsonaro, de quem foi um apoiante de primeira hora. Mas desentendimentos com o futuro ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, terão enfraquecido a sua posição, de acordo com a imprensa brasileira. Em reacção à escolha de Cristina, Nabhan afirmou que foi um produto da “força do poder político”.

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