Em 2019, a Casa da Música viaja pela riqueza musical das Américas

Sob o tema “Novo Mundo”, a sala portuense receberá nomes como o clarinetista Jörg Widmann e a pianista Khatia Buniatishvili. Destaca-se, ainda, o ciclo Grandes Canções Orquestrais, a Integral das Sinfonias de Tchaikovski e o festival Música no Feminino.

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Khatia buniatishvili Frank Schwichtenberg
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Jörg Widmann Marco Borggreve
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A maestrina Sian Edwards dr

Após dez anos a programar o ano musical segundo um país-tema, a Casa da Música alarga horizontes e volta-se, no próximo ano, para o “Novo Mundo”. Foi o explorador florentino Américo Vespúcio que, no século XVI, defendeu a existência de um novo continente cheio de mistérios e riquezas e escreveu ao mecenas Lourenço de Médici a famosa carta que se intitularia Mundus Novus. De norte a sul, as Américas deram ao mundo o contributo de uma multiplicidade de sons e músicas, criada pelo confronto entre a música dos nativos e a música dos colonos europeus. Foi no continente americano que nasceram géneros musicais como tango, jazz, samba ou bossa-nova. “Existe, no Mundo Novo, uma atitude muito descomplexada de apropriação e utilização da música popular nas composições eruditas”, explica António Jorge Pacheco.

O director artístico da Casa da Música refere que o casamento entre as grandes composições europeias e a música produzida pelos povos indígenas americanos e africanos é uma “tradição muito diferente da tradição musical europeia”, resultando num “repertório muito rico”. Depois de explorar obras musicais do Brasil e dos Estados Unidos em 2009 e 2010, respectivamente, a Casa da Música regressa às sonoridades das Américas e inaugura o “Novo Mundo” em Janeiro com o festival Dar Novos Mundos ao Mundo. O compositor checo Antonín Dvorák, europeu radicado em Nova Iorque, merece destaque com a célebre Sinfonia do Novo Mundo, que terá sido “inspirada nas canções dos trabalhadores das plantações de algodão”, ou seja, em música de escravos.

Também no início do ano se inauguram dois dos ciclos mais aguardados da temporada como a Integral das Sinfonias de Tchaikovski, que terá ao leme da Orquestra Sinfónica reputados maestros como os russos Michail Jurovski ou Vassily Sinaisky, e o ciclo Grandes Canções Orquestrais. Os vários agrupamentos residentes da casa, como a Orquestra Barroca, o Remix Ensemble e a Sinfónica, percorrerão os 400 anos deste género musical, do barroco de Pergolesi ao multifacetado Jörg Widmann, clarinetista, maestro e compositor alemão.

Tocar e debater a música no feminino

 “Widmann é uma das coqueluches actuais da cena musical internacional”, afirma António Jorge Pacheco, acrescentando que o músico “será artista residente nessas três qualidades e sempre com obras suas”. Também gigantes da música clássica como Mozart, Wagner ou Strauss estarão presentes no ciclo. Destaca-se, ainda, o ciclo Música & Revolução, que permitirá visitar de forma aprofundada a obra do compositor húngaro György Ligeti, “um grande revolucionário do século XX”, defende António Jorge Pacheco.

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Widmann Marco Borggreve

Ainda nos ciclos temáticos, regressa em Fevereiro o Invicta.Música.Filmes, festival de “filmes icónicos com música tocada ao vivo” que “procura dialogar com um público que não é o habitual, os cinéfilos, e fazê-los ouvir música”, reconhece o director artístico da instituição. Estão agendadas a interpretação de A Quimera do Ouro (1925) pela Orquestra Sinfónica, com música e filme de Charles Chaplin e o Drumming – Grupo de Percussão terá a cargo A Idade do Ouro (1930), filme de culto de Luis Buñuel com guião de Salvador Dalí e música de Martin Matalon.

O Música no Feminino leva a Casa da Música à esfera política, tendo a igualdade de género como bandeira de um ciclo dedicado a mais de 20 compositoras, com um repertório que vai do século XII à actualidade. “Enquanto instituição cultural, a Casa da Música não deve estar ausente da discussão dos grandes temas da sociedade”, atira António Jorge Pacheco. O festival, que decorre em Setembro, colocará os cinco agrupamentos residentes sob a direcção de maestrinas como Sian Edwards, que terá a seu cargo a direcção do Remix Ensemble. O alinhamento do festival inclui nomes internacionais como Sofia Guibadulina e Rebecca Saunders e as portuguesas Clotilde Rosa e Ângela da Ponte.

“Associa-se, normalmente, a direcção de uma orquestra à figura autoritária do maestro homem”, diz António Jorge Pacheco. “Algumas orquestras até oferecem resistência [a ser conduzidas por mulheres], por isso é um tema que queremos debater”.

A conferência A Mulher É o Futuro do Homem? será um dos pontos altos do programa e reunirá a deputada Mariana Mortágua, a pianista e ex-ministra da Cultura Gabriela Canavilhas e a secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade, Rosa Monteiro.

Encontro com a população

Ao virar de cada estação há um novo ciclo temático, como é o caso do Rito da Primavera, que parte da ideia de “renovação da natureza para focar novos valores musicais e novos talentos”. É nesse sentido que surge a aposta em iniciativas como o Spring On!, que destaca as novas tendências do jazz europeu, e do ECHO Rising Stars, onde se destacam promissores intérpretes de música de câmara a nível internacional.

Como já é habitual, o sol e o calor do Verão levam a Casa da Música a sair à rua, num conjunto de concertos ao ar livre que pretendem “levar a música a toda a população, nomeadamente a quem não tem acesso à música erudita e sinfónica”. O Verão na Casa leva a Orquestra Sinfónica a tocar em espaços urbanos de Vila Nova de Gaia, Maia, Matosinhos e na Avenida dos Aliados, onde a iniciativa tem tido especial sucesso nas edições passadas. “Já estiveram 20 mil pessoas [nos concertos dos Aliados], o equivalente a encher 20 vezes a Sala Suggia”, nota António Jorge Pacheco.

O jazz volta a merecer lugar cativo em Outubro com o festival Outono em Jazz, “que quer mostrar novas linguagens do jazz e dar palco a músicos que ainda não estão integrados no circuito musical”. Algumas das propostas incluem músicos como Danilo Pérez, John Pattiucci, a dupla Tony Allen/Jeff Mills, além da habitual colaboração com a Orquestra Jazz de Matosinhos.

O director artístico ressalva, ainda, a esperada estreia da pianista Khatia Buniatishvili, “que já tocou nas mais reputadas salas internacionais”, e o regresso de Péter Eötvös, maestro e compositor que conduzirá a Orquestra Sinfónica e o Remix Ensemble e estreará o seu Concerto para Violino. A temporada de 2019, tida como o Ano da Voz, será ainda marcada por vários concertos a capella do Coro Casa da Música, que celebra dez anos no próximo ano.

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