Partidos brasileiros tentam formar blocos de oposição a Bolsonaro... e ao PT

Três partidos, o PSB, o PDT e o PCdoB, juntaram-se para formar um bloco de oposição deixando de fora os "petistas", retirando-lhes a hegemonia na Câmara dos Deputados. Ciro Gomes também quer fundar "um novo campo" para se opor a Bolsonaro e ao PT.

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Ao todo, os três partidos contam com 69 deputados, mais 12 do que o PT Reuters/UESLEI MARCELINO

Ainda que o Partido dos Trabalhadores (PT) tenha o maior número de deputados no Congresso brasileiro, e que tenha disputado directamente a presidência com Jair Bolsonaro, que venceu as eleições pelo Partido Social Liberal (PSL), não é seguro que sejam os “petistas” a liderar a oposição ao futuro Governo. Na Câmara dos Deputados está a ser formado um bloco de oposição ao Presidente eleito e que vai deixar o PT de fora. E Ciro Gomes, candidato que ficou em terceiro na primeira volta, já expressou o desejo de avançar ele próprio com uma oposição ao Presidente e também ao PT.

Não é só Bolsonaro que se tem movimentado desde que foi eleito, no dia 28 de Outubro, para formar o Executivo. Também a oposição se começou a mexer para preparar o futuro. E há uma ala que quer não só combater o próximo Presidente, que toma posse no dia 1 de Janeiro, mas também o PT.

Ou seja, perante a profunda polarização registada nas eleições, que foi um combate entre “petistas” e a direita radical representada por Bolsonaro, motivada por um acirrado sentimento anti-PT, há quem não queira escolher nenhum dos lados e aproveitar o espaço deixado vago para uma espécie de terceira via.

Na semana passada, três partidos de esquerda e centro-esquerda reuniram-se para formar um bloco de oposição que, juntos, ultrapassam o número de deputados do PT, o partido mais representado. Foram eles o Partido Socialista Brasileiro (PSB, de centro-esquerda), o Partido Democrático Trabalhista (PDT, centro-esquerda) e o Partido Comunista do Brasil (PCdoB).

Os três têm 69 deputados, mais 12 do que o PT que conta com 56. Já o PSL, de Bolsonaro, conta com 52.

Assim que foram sendo avançadas as notícias que davam conta da formação deste bloco, imediatamente surgiu a análise de que o objectivo é roubar o protagonismo e a hegemonia do PT na Câmara dos Deputados e na oposição.

Ainda assim, após a segunda reunião entre os líderes dos três partidos, na quarta-feira, André Figueiredo, líder do PDT, o partido que apoiou a candidatura de Ciro Gomes, explicou que, em determinadas matérias, este bloco poderá juntar-se ao PT: “O PT pode, eventualmente, compor connosco uma actuação parlamentar mesmo não fazendo parte do bloco, assim como o PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira)”.

"O que não podemos aceitar, de forma alguma, é o hegemonismo que infelizmente o PT quer impor aos demais partidos do campo dele", acrescentou.

Fernando Haddad foi a escolha do PT para candidato presidencial depois de o ex-Presidente, Lula da Silva, que se encontra a cumprir uma condenação de 12 anos e um mês de prisão, ter sido impedido de se candidatar. Como candidata a vice-presidente avançou Manuela D’Ávila, do PCdoB.

Orlando Silva, líder dos comunistas na Câmara dos Deputados, destacou a afinidade entre os três partidos: “O que nos uniu nesses três partidos foi a convergência que já temos há bastante tempo”. “Por que o PT tem necessariamente que estar dentro? O PT faz parte do mesmo campo político, mas isso não quer dizer que nossa acção parlamentar seja o tempo todo juntos", acrescentou ao El País Brasil.

"Como é que vão excluir o PT?"

Antes disto já Ciro Gomes, candidato presidencial do PDT que ficou em terceiro lugar na primeira volta das presidenciais (com 12,47%), estaria a preparar um bloco de oposição sem o PT. Aliás, Ciro não apoiou nenhum dos candidatos na segunda volta, deixando fortes críticas ao partido e, em particular, a Lula.

No mesmo dia da segunda reunião dos três partidos, foi publicada uma entrevista sua na Folha de São Paulo, onde Ciro Gomes garantia que será oposição não só a Bolsonaro como também ao PT, afirmando ainda que não está interessado em participar numa frente de esquerda: “Não quero participar dessa aglutinação de esquerda. Isso sempre foi sinónimo de hegemonia ‘petista’. Quero fundar um novo campo, onde para ser de esquerda não é preciso tapar o nariz com ladroeira, corrupção, falta de escrúpulo, oportunismo. Isso não é a esquerda. É o velho caudilhismo populista sul-americano”.

Ao mesmo jornal, Ciro Gomes revelou que queria fundar esse novo campo político de oposição com o PSB, o PSDB, o Partido Popular Socialista (PPS, de centro-esquerda) e os Democratas (DEM, centro-direita), deixando de fora o PCdoB. No entanto, o PSB e o seu próprio partido, o PDT, já começaram a dar forma ao seu próprio bloco.

Logo após as primeiras notícias sobre a articulação entre PSB, PDT e PCdoB, as lideranças “petistas” reagiram, garantido que será impossível deixar de fora o partido: “Eu não acredito que o foco principal desses partidos seja excluir o PT porque acho que estamos a viver uma situação bem dramática para qualquer actor ser excluído de um processo”, disse Gleisi Hoffmann, presidente do PT.

“Como é que vão excluir o PT? Nunca vi um negócio desses. Acho que essa conversa é de quem está no mundo da lua”, acrescentou, lembrando os 47 milhões de votos conquistados pelo partido na segunda volta.

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