Rojas, dispensado do Benfica e herói do “Superclásico”

À boleia da final inédita da Libertadores entre Boca Juniors e River Plate, recordamos a história do lateral argentino (e internacional paraguaio) que foi pouco feliz na Luz e que deu em agricultor.

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Rojas esteve no River entre 2001 e 2005 Reuters

O "Superclásico" de Buenos Aires é um dos grandes espectáculos do futebol mundial. Seja na Bombonera ou no Monumental, os jogos entre Boca Juniors e River Plate são os que mais apaixonam uma Argentina também apaixonada pelo futebol, clássicos de cor, de barulho e de excessos. Pela primeira vez esta rivalidade será transportada para a final da Taça Libertadores, a maior competição de clubes da América do Sul, que será também uma inédita final entre duas equipas argentinas (que eliminaram duas brasileiras, Palmeiras e Grémio). Dessa final a duas mãos sairão heróis, como já foram no passado Diego Maradona, Juan Riquelme, Pablo Aimar ou Daniel Passarella. E Ricardo Rojas. Se o nome parece familiar, não é por acaso.

Este Ricardo Rojas é esse Ricardo Rojas lateral argentino internacional pelo Paraguai que jogou no Benfica dos tempos de Vale e Azevedo. Nunca foi um ídolo na Luz (poucos foram nesses tempos), mas será sempre recordado pelos “millonários” pelo espectacular golo que marcou em plena Bombonera há 15 anos com a camisola do River Plate e que ajudou a quebrar um jejum de vitórias em casa do Rival. Esse golo de Rojas é considerado um dos grandes momentos da história centenária do clássico que movimenta 70% dos argentinos e foi, sem dúvida, o momento mais alto da sua carreira.

Apesar de ter nascido na Argentina, Ricardo Ismael Rojas começou a destacar-se no futebol profissional em clubes do Paraguai. Essa estadia de cinco temporadas, mais o facto de os seus avós terem nascido lá, deu-lhe acesso à selecção paraguaia e ao Mundial de 1998, não tendo, no entanto feito qualquer minuto no torneio. Por esta altura já tinha regressado ao seu país, para representar o Estudiantes de la Plata e foi aqui que Jupp Heynckes o referenciou (e ao guarda-redes Carlos Bossio) para o Benfica.

Rojas e Bossio aterrariam em Lisboa em Junho de 1999, uma dupla transferência que ficou marcada por problemas de pagamento ao clube de origem como era, aliás, recorrente nos tempos de Vale e Azevedo. Bossio jogou muito pouco porque o jovem alemão Robert Enke foi sempre o preferido de Heynckes (e era bem melhor que o argentino), enquanto Rojas foi opção habitual na defesa “encarnada”. Ambos transitaram para a época seguinte, mas foram perdendo espaço e, nas primeiras semanas da época, ficaram sem o treinador que os tinha ido buscar. Vale despediu Heynckes e deu a primeira oportunidade a José Mourinho como treinador principal.

A estreia de Mourinho foi no Bessa, contra o Boavista. Rojas foi titular e o golo do triunfo da equipa de Jaime Pacheco, que seria campeã nessa época, apareceu logo aos 2’, marcado por Duda, num lance com culpas para Rojas. Vários anos depois, Rojas mereceria umas linhas na biografia de Mourinho, a recordar esse lance no seu jogo de estreia. “O Boavista apostava muito nos cruzamentos e nas diagonais das alas ao primeiro poste. Disse e redisse estas situações aos jogadores do Benfica. Nem de propósito! Na primeira jogada ofensiva do Boavista houve um cruzamento, com uma entrada ao primeiro poste e golo. Disse para mim: 'Que jogador é este, o Rojas? Será que ele percebe português ou tenho de falar em espanhol para me entender.”

Rojas acabaria por sair do Benfica a meio da época, “emprestadado” ao River Plate – Bossio ainda ficou no plantel até 2004. No Monumental, Rojas era dos mais bem pagos, mas não era assim tão utilizado como isso. Avancemos até 10 de Março de 2002, uma noite de chuva na Bombonera para receber o Boca Juniors-River Plate da sexta jornada do Torneio Clausura. O River já não ganhava no campo do Boca há quase sete anos, mas essa seca iria acabar. Cambiasso (26’) e Caudet (42’) marcaram dois terços dos golos da vitória, mas o que o momento que é recordado desse jogo aconteceu aos 88’.

Rojas recupera uma bola no seu flanco, avança até à linha do meio-campo, joga com Andres D’Alessandro e continua a correr. D’Alessandro mete em Ariel Ortega, que devolve a bola a Rojas à entrada da área. Ao primeiro toque tira do caminho um defesa do Boca e, ao segundo, remata de fora da área e faz golo. Toda a equipa do River caiu em cima de Rojas para celebrar aquele golo monumental, o único que Rojas marcaria na sua carreira pelo River, onde ficaria até 2006, deixando de jogar no ano seguinte. Depois, desligou-se do futebol, voltou para a sua vila natal e tornou-se agricultor.

Em Missiones, Rojas, agora com 47 anos, vive a sua vida no campo, um homem de família, religioso e sem tempo para o futebol – rejeitou todas as propostas que teve e é raro ver um jogo na televisão. Mas aquele golo continua a fazer parte da sua vida, como contava numa entrevista ao “La Nación” em 2012: “Até hoje, cada vez que me cruzo com um adepto do River ou do Boca, falam desse golo. Uns agradecem, os outros amaldiçoam a minha família.”

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