Esquerda quer menos alunos por turma no ensino secundário

Debate do Orçamento do Estado para a Educação durou cinco horas. Ministro defendeu que redução de alunos no ensino básico tem benefícios mais evidentes. Os professores concentraram-se, em protesto, junto ao Parlamento.

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Professores concentrados à porta da Assembleia da República reclamam recuperação total do tempo de serviço que esteve congelado Miguel Manso
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O BE e o PCP querem que o Ministério da Educação reduza o número de alunos por turma no ensino secundário e vão apresentar propostas para que o Orçamento do Estado (OE) para 2019 contemple essa medida.

A discussão do orçamento da Educação que se realizou nesta sexta-feira durou cinco horas. No Parlamento, os partidos da esquerda pediram também que os direitos dos professores "sejam respeitados".

Enquanto o ministro Tiago Brandão Rodrigues respondia aos deputados, à porta da Assembleia da República docentes em protesto exigiam a recuperação dos mais de nove anos de tempo de serviço que estiveram congelados. Ainda antes do início da concentração, que começou pelas 15h00, Mário Nogueira, da Federação Nacional de Professores (Fenprof), desabafava, em declarações ao PÚBLICO: "Este OE para a Educação não vale nada." E concretizava: "Não tem nada sobre a recuperação de tempo de serviço e sobre os horários de trabalho. Esta é uma matéria que não é uma simples reivindicação. Há um compromisso do Governo e uma recomendação da Assembleia da República. Ou o Governo dá resposta ou terá o ano estragado."

A decorrer desde o início da semana, recorde-se, está uma greve ao trabalho extraordinário que Mário Nogueira disse estar a ter cada vez mas adesão. E garantiu que esta será cada vez maior se o Governo mantiver a sua postura.

Lá dentro, a deputada do BE Joana Mortágua anunciou que o BE vai apresentar uma proposta para reduzir o número de alunos por turma no secundário. “Há uma diminuição de alunos por turma até ao 9.º ano, mas esta não abrangeu o secundário. Há um estudo que diz que há benefícios na redução de alunos por turma até ao 9.º ano, mas depois parece que não há benefícios para o secundário. Mas sabemos que não é bem assim. O BE vai apresentar uma proposta para diminuir o número de alunos do secundário e queremos saber se o ministro está disponível para o discutir”, anunciou, durante a audição do ministro Tiago Brandão Rodrigues.

Mas ao desafio lançado, a deputada bloquista não obteve resposta. Na segunda ronda de questões, Joana Mortágua não deixou cair o assunto. “O estudo encomendado pelo ministério ao ISCTE diz nas conclusões que turmas mais pequenas tendem a produzir melhores resultados e que os professores têm mais tempo para dedicar aos alunos. Como é que um professor dedicar mais tempo aos alunos no 9.º ano é um benefício e no 12.º ano mantemos a medida tomada por Nuno Crato [ministro da Educação do anterior governo]? Tem de dizer se é por causa do impacto orçamental ou consegue mesmo dizer que não tem benefícios?”, questionou.

Vantagens "mais evidentes" no básico

O PCP foi pelo mesmo caminho. “Apresentámos já uma proposta de alteração ao OE para que seja alterado o rácio de auxiliares, no sentido do seu reforço, e apresentámos outra em relação ao número de alunos por turma, para que esta seja mais ampla”, afirmou Ana Mesquita. O PCP quer que a proposta de redução do tamanho das turmas seja uma realidade em todo o ensino básico e secundário, e não só em turmas com alunos com necessidades especiais ou em turmas de escolas situadas em territórios educativos de intervenção prioritária. E mais uma vez ficou a pergunta: “Está o ministério disponível para acompanhar a proposta do PCP?”

Já antes Ana Rita Bessa, do CDS, tinha igualmente abordado o tema do número de alunos por turma, referindo que “segundo as contas do estudo pedido pelo ministério sobre a redução de alunos por turma, os custos previstos para a redução com o ensino secundário eram de 29 milhões de euros”.

Sobre esta questão, Tiago Brandão Rodrigues afirmou que o estudo encomendado ao ISCTE dizia que “o ensino básico e o secundário têm estruturas distintas e que há vantagens mais evidentes no ensino básico do que no secundário”.

“O que dizia o estudo é que em todas comunidades, mas acima de tudo junto dos alunos com mais dificuldades socioeconómicas, as vantagens seriam mais evidentes. Por isso, começámos com as turmas dos territórios educativos de intervenção prioritária e agora este ano começámos com os três [primeiros] anos dos [três ciclos do] ensino básico. O estudo deixa claro as razões que evocam que assim seja.”

Mais tarde, durante o debate, o ministro voltou ao tema para repetir o que já tinha dito: “O estudo mostra vantagens mais evidentes no ensino básico do que no secundário. Um estudo que temos vindo a cumprir com proveitos pedagógicos grandes. Nunca me ouvirá dizer que turmas com menos alunos no secundário não pudessem trazer mais benefícios. O que disse é que no ensino básico tem efeitos benéficos mais imediatos."

E os professores?

Tiago Brandão Rodrigues defendeu, de resto, que este é o “melhor dos quatro orçamentos da legislatura”, “financeiramente sustentável e tão ambicioso como o primeiro dia da nossa governação”.

“Este OE é, pois, o nosso compromisso para chegar mais longe. É o maior OE alocado à Educação dos últimos oito anos e alcança o maior investimento público por aluno de há oito anos: mais 21% de investimento em cada um dos nossos alunos”, destacou. Para enumerar, de seguida, medidas como o "aumento de mais seis mil vagas" no pré-escolar, ao longo da legislatura, mais investimento no combate ao insucesso escolar, a educação inclusiva e o programa de manuais gratuitos.

O ministro revelou que a oferta dos manuais escolares e do acesso às licenças digitais dos livros vai custar mais de 160 milhões de euros no próximo ano, altura em que a gratuitidade será alargada a todos os alunos do ensino obrigatório das escolas públicas (do 1.º ao 12.º ano).

O governante afirmou também que o OE reforça “o caminho de valorização da profissão docente e profissões educativas, com mais 13 mil profissionais vinculados aos quadros”, referindo-se ao programa de integração de trabalhadores que estavam em situação precária.

Na primeira intervenção do PSD, a deputada Margarida Mano afirmou que no OE de 2019 “há um alheamento em relação aos professores”, dizendo que “a contabilização do tempo dos professores não é uma prioridade do Governo”. “Neste OE há dinheiro para tudo, menos para os professores. Por que razão se prevê uma redução das despesas com pessoal de 190 milhões de euros apesar do descongelamento [da carreira] dos professores? Por que é que a portaria do descongelamento das carreiras ainda não foi enviada para publicação em Diário da República?”, questionou a deputada.

Também Joana Mortágua, do BE, insistiu na questão dos professores e na redução da despesa com pessoal. “Este OE orçamenta menos 194 milhões do que o que foi executado em despesas com pessoal este ano. O que me faz questionar se pretende cortar no pessoal ou se há uma suborçamentação nas despesas com pessoal? Outra ausência é o da recuperação do tempo dos professores. O ministro disse que o valor é residual. Quanto é este valor residual? Quanto está previsto em 2019 e onde está o decreto de lei da progressão? Quando vai ser enviado para o Presidente da República para promulgação, para a Assembleia da República poder fazer uma apreciação parlamentar?” Brandão Rodrigues afirmou que “a diminuição de 194 milhões de euros é só quando comparamos o orçamento inicial de 2018 com o inicial de 2019”.

O ministro defendeu ainda que 11.500 docentes vão poder ser reposicionados, com aumento muito significativo da remuneração. “Em 2023 praticamente todos os docentes vão ter uma ou duas progressões. 32% terão mais de três progressões remuneratórias, com um aumento dos salários médios de quase 20%”, afirmou o ministro que, sobre este tema, também teve de enfrentar as questões do PCP.

“Em relação aos trabalhadores ainda há tanto a fazer! A contagem integral do tempo dos professores e de outras profissões. Este direito é para cumprir e o PCP estará ao lado dos trabalhadores na defesa deste seu direito”, afirmou a deputada Ana Mesquita, apontando o facto de o OE prever um aumento da despesa nos regimes de avença ou à tarefa. “Ou bem que combatemos a precariedade ou ficamos aquém do que é justo e necessário."

"Já temos quatro mil requerimentos analisados pela comissão de avaliação bipartida [do programa de integração de precários] e foram lançados quase três mil concursos que permitirão vincular profissionais”, respondeu o ministro.

Educação para adultos

Brandão Rodrigues destacou ainda o investimento do Governo na formação de adultos através do programa Qualifica, que de acordo com o ministro conta já com uma rede de 300 centros Qualifica. “O nosso objectivo é que 50% da população activa até 2020 tenha o ensino secundário concluído.”

“Após uma reprogramação de fundos comunitários teremos 360 milhões de euros de reforço para o programa Qualifica. São 550 mil portugueses que são analfabetos, são 200 mil portugueses que são ainda força produtiva que não sabem ler nem contar e são muitas vezes estes que estão em franjas pobreza e no desemprego de longa duração”, afirmou.

Já o secretário de Estado da Educação João Costa explicou aos deputados o que está a ser feito para a integração de alunos que chegam da Venezuela, onde existe uma grande comunidade de portugueses. Muitas famílias estão a deixar aquele país devido à grave crise financeira e política que se vive actualmente.

De acordo com o responsável a aposta é o mesmo apoio que é dado aos estudantes refugiados. “Integração imediata nas turmas, uma facilitação de equivalências para alunos indocumentados que são colocados no grupo da sua idade. Isto abre campo para pensarmos se não será o caminho a aprofundar com os documentados. Existem planos de reforços de português língua não materna e reforço da acção social escolar, para que os alunos possam ter medidas de apoio extraordinário. Em particular na alimentação e acompanhamento extra-escolar e outros apoios previstos na acção social escolar”, disse.

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