Arguidos do caso GPS não vão responder em tribunal por corrupção

Antigo secretário de Estado José Canavarro e ex-director regional de Educação de Lisboa foram ilibados. Juiz Ivo Rosa entendeu não existirem indícios suficientes deste crime.

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Rui Gaudencio

O juiz de instrução criminal Ivo Rosa decidiu não levar a julgamento por corrupção os sete arguidos do caso dos colégios GPS. O magistrado entendeu não existirem indícios suficientes deste crime.

Em causa estão, entre outros, os apoios concedidos pelo Governo a algumas das escolas particulares que o grupo privado detinha em 2005. Depois de terem viabilizado a construção nos concelhos das Caldas da Rainha e de Mafra de quatro novos colégios beneficiários dos chamados contratos de associação - através dos quais o Estado incumbe o sector privado do ensino de suprir a carência de oferta do sector público -, tanto o então secretário de Estado da Administração Educativa, José Canavarro, como o director regional de Educação de Lisboa, José Almeida, acabaram por ir trabalhar para o GPS. Fizeram-no após a queda do Governo de Santana Lopes, que José Canavarro integrava, e antes de os primeiros subsídios terem sido concedidos. 

No entender do Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa, estes dois responsáveis levaram o Estado a financiar o grupo privado para arranjarem emprego nos colégios. No entanto, Ivo Rosa acolheu parte significativa dos argumentos dos advogados de defesa dos arguidos para os ilibar. Desde logo, o facto de os subsídios provenientes dos contratos de associação terem uma duração de apenas um ano. A partir do momento em que José Canavarro e José Almeida deixaram de exercer funções no Ministério da Educação, não podiam garantir que os colégios fossem subsidiados nos anos seguintes, alegaram os defensores.

De resto, sublinha Ivo Rosa, o investimento na construção de novos colégios que o grupo GPS se propunha fazer era francamente superior aos apoios estatais que iria receber no seu primeiro ano de funcionamento. Só no colégio Rainha Dona Leonor, nas Caldas da Rainha, foram gastos seis milhões de euros. Prova de que a carência de estabelecimentos de ensino era real, assinala, é que os contratos de associação com estes colégios se mantiveram vários anos e vários Governos depois. Nalguns casos mantêm-se ainda. E aos tribunais "não cumpre sindicar a forma como o Estado cumpre a sua obrigação constitucional de assegurar a todos o acesso ao ensino gratuito em zonas carecidas de escolas públicas", escreve o juiz - sob pena de violação do princípio de separação de poderes.

Por outro lado, sublinha ainda o magistrado, os despachos em que aqueles dois responsáveis reconheciam a carência da rede pública nas Caldas e em Mafra e em que autorizavam os quatro novos colégios não vincularam o Estado à celebração de contratos de associação. Foi, aliás, já o sucessor de José Canavarro na pasta da Administração Educativa -  Valter Lemos, nomeado por um Governo socialista - quem acabou por dar a autorização de pagamento, uma vez que também ele reconhecia a ruptura do parque escolar público nos concelhos das Caldas da Rainha e de Mafra. 

Ivo Rosa reconhece que a contratação dos dois homens pelos colégios pode ter até sido lesiva do interesse público - mas que por si só não chega para os fazer julgar por corrupção. Tal como não é necessariamente crime, refere também, uma eventual violação das exigências legais no que concerne à contratação pelo Estado do fornecimento de serviços. Uma eventual ilegalidade deste tipo até poderá vir a ser sancionada, mas pelo Tribunal de Contas. Presumir que sempre que um decisor público vai trabalhar para o sector privado que tutelou enquanto governante é sinónimo de corrupção constitui, para o juiz de instrução criminal, uma conclusão arbitrária e especulativa. 

"Não podemos confundir realidades susceptíveis de configurarem conflitos de interesses - que podiam e deviam ser evitadas através de legislação adequada - com situações susceptíveis de configurarem a prática de corrupção", repete o magistrado. 

Coisa diferente seria perceber se os processos do grupo GPS foram despachados com maior celeridade que os de outros empresários do ramo. Mas isso não foi investigado pelo Ministério Público, observa Ivo Rosa. Para acrescentar ainda outra conclusão favorável ao ex-secretário de Estado: os menos de seis meses que passou no Ministério da Educação nunca lhe teriam granjeado confiança suficiente para levar por diante um esquema que lhe permitisse impor aos seus subordinados orientações contrárias ao interesse público. 

O caso dos colégios vai, porém, seguir para julgamento, uma vez que, por falta de tempo para prepararem a defesa, os advogados dos arguidos optaram por não submeter outras acusações deste processo - burla qualificada, falsificação de documentos e peculato - ao crivo do juiz Ivo Rosa. Por isso, tanto o líder do grupo GPS, o socialista António Calvete, como os restantes administradores dos colégios irão ser julgados por estes delitos. 

Contactado pelo PÚBLICO, José Canavarro mostra-se satisfeito: “Fez-se justiça. Nunca ninguém do grupo GPS me procurou para pedir o que quer que fosse. Não fiz nada de errado”. Apesar de compreender que as decisões da justiça levam o seu tempo, o hoje professor da Universidade de Coimbra lamenta que nalguns casos a lentidão seja tão grande. Foi suspeito de corrupção durante mais de cinco anos.

O Ministério Público encontra-se a analisar o despacho de não pronúncia de Ivo Rosa para decidir se irá recorrer dele.

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