"Há uma direita encantada pelos cantos de sereia" de extremistas como Bolsonaro, alerta Assis

Para o eurodeputado socialista, as declarações de Paulo Portas sobre o Presidente eleito do Brasil são "uma afronta absoluta a quem luta por determinados valores e princípios, no Brasil e no mundo”.

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Jair Bolsonaro RICARDO MORAES/EPA
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Francisco Assis Rui Gaudencio

A aparente disponibilidade de vários dirigentes políticos nacionais para compreender e normalizar o discurso de extrema-direita de Jair Bolsonaro, é um “perigoso sinal” de como a direita em Portugal "se deixa encantar pelos cantos de sereia da extrema-direita", diz o eurodeputado socialista, Francisco Assis, surpreendido com as “declarações absolutamente incompreensíveis” sobre o homem que este domingo foi eleito Presidente do Brasil com uma maioria de 55% dos votos.

No seu habitual espaço de comentário político na TVI, Paulo Portas, ex-líder do CDS e ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, disse não ter encontrado nas mais de duas décadas de vida política de Jair Bolsonaro qualquer “indicador” que pudesse ser considerado “eticamente reprovável em termos pessoais”. Uma afirmação que para Assis é de “uma gravidade extrema”, e que só pode ser interpretada como “uma afronta absoluta a quem luta por determinados valores e princípios, no Brasil e no mundo”.

“O doutor Paulo Portas disse que andou a vasculhar a vida de Bolsonaro e concluiu que não havia nada de censurável no comportamento dele. Isto é, no comportamento de um homem que faz a apologia da tortura, da ditadura militar e do incitamento à violência; que no momento da votação do impeachment [destituição] de Dilma Rousseff homenageou o homem que a torturou e que ainda na semana passada, em plena campanha eleitoral, dizia que com ele as oposições mais à esquerda teriam de fugir do país ou iam parar à cadeia”, recordou o eurodeputado, que classificou as afirmações de Portas como "absolutamente inadmissíveis e contrariadas por qualquer abordagem: não era preciso ir à história de vida do Bolsonaro, era só ver o que ele disse nos últimos quinze dias”.

Para Assis, as palavras de Portas, como de várias outras personalidades políticas portuguesas que se revelaram compreensivas em relação ao discurso de Jair Bolsonaro, mostram que “há uma parte da direita que muito facilmente se deixa arrastar numa aproximação à extrema-direita”, e que se sente mais à vontade em alinhar do que em denunciar esse discurso. "Uma parte da direita está a decair no seu combate com a extrema-direita, e o doutor Paulo Portas com este episódio revelou que também decaiu. Isso é preocupante."

O eurodeputado diz que as eleições brasileiras demonstraram que “apesar das suas vestes democrático-liberais em tempos de acalmia política, em momentos de grande tensão e em que é preciso construir uma frente contra a extrema-direita,”, vários dirigentes de direita estão mais dispostos para compreender a extrema-direita do que para aliar-se àqueles que estão empenhados em combatê-la. Perante a escolha entre um candidato democrata, de quem é possível divergir, e um “proto-fascista, defensor da violência e desrespeitador das minorias”, Assis lamenta que estes responsáveis “não tenham tomado posição a favor do democrata. Ou ficaram calados, ou se ficaram num meio-termo ou, até, despudoradamente, se puseram ao lado de Bolsonaro”, criticou.

O socialista faz uma distinção entre estes dirigentes e os representantes de “outra direita, absolutamente democrática e que tem mantido posições de grande coerência”. Mas uma vez que as eleições europeias estão aí à porta, o membro do Parlamento Europeu receia que esta tolerância a um fenómeno para já invisível em Portugal venha finalmente abrir a porta à extrema-extrema-direita no país.

"O discurso político de uma parte da direita é cada vez mais duro” — o que o faz temer que os políticos que para já se mostram “compreensivos” com a extrema-direita, e de certa maneira aceitam “pactuar com ela”, estejam em breve a coligar-se com ela. “A História ensina-nos isso”, alerta Assis.

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