Bolsonaro quer Sergio Moro no Governo, o juiz da Lava-Jato está a “reflectir”

Donald Trump tem o New York Times, o Presidente eleito do Brasil tem também um jornal como ódio de estimação, a Folha de São Paulo. “Esse jornal vai acabar”, afirmou numa entrevista ao Jornal Nacional da Globo.

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Sergio Moro, o juiz Federal que dirige a Lava Jato Reuters
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Bolsonaro deu uma série de entrevistas na segunda-feira, a partir da sua casa no Rio de Janeiro Sergio Moraes/Reuters

O Presidente eleito do Brasil, Jair Bolsonaro, quer Sergio Moro no Governo ou no Supremo Tribunal. O juiz federal que lidera a mega investigação à corrupção conhecida por Lava-Jato disse ter ficado honrado com a ideia do convite — tudo indica que ainda não oficalizado — e que vai “reflectir”.

O convite, disse Bolsonaro numa série de entrevistas que concedeu segunda-feira à noite, pode ser para o Ministério da Justiça ou para uma próxima vaga no Supremo Tribunal Federal. A escolha será do próprio juiz, disse Bolsonaro, reconhecendo que o juiz se tornou “um símbolo no Brasil”.

O juiz federal não descarta a possibilidade de ser ministro da Justiça de Bolsonaro, dizem media brasileiros, e também aceitaria de bom grado a indicação para o Supremo. Sergio Moro, questionado sobre o assunto, limitou-se a dizer: “Não há comentário.”

Moro não manifestou as suas preferências eleitorais, mas o facto de a investigação à corrupção que chefia ter desvendado esquemas de corrupção que visaram em grande parte o financiamento do PT, denota que considerava inaceitável que este partido regressasse ao poder – dizem os jornais, citando “interlocutores” do juiz.

Por outro lado, Rosangela Moro, mulher do juiz, fez publicações no Instagram saudando a eleição de Bolsonaro – e não é a primeira vez que Sérgio Moro usa as redes sociais da mulher para, através dela, passar mensagens.

No depoimento que Lula da Silva prestará a Moro a 14 de Novembro, no processo que pretende apurar a propriedade e o pagamento das obras na quinta de Atibaia, no estado de São Paulo, pretende usar este namoro à distância entre o juiz e o Presidente eleito para pôr em causa a imparcialidade do magistrado, disseram próximos do antigo Presidente à Folha de São Paulo. Lula recordará que Bolsonaro declarou publicamente que quer vê-lo “apodrecer na cadeia”.

Numa mensagem que enviou para a manifestação de apoio na Avenida Paulista, uma semana antes do dia da segunda volta, Jair Bolsonaro declarou que “os marginais vermelhos serão banidos” do Brasil. Os jornalistas da Globo perguntaram-lhe o que queria dizer com estas palavras, ou se queria recuar em relação ao que disse.

O Presidente eleito não mostrou grandes arrependimentos. “Visava a cúpula do PT e do PSOL [Partido Socialismo e Liberdade]. O [Guilherme] Boulos [candidato presidencial pelo PSOL] tinha dito que invadiria minha casa na Barra da Tijuca por não ser produtiva, momentos antes. Foi um discurso no calor do momento, um momento de desabafo, mas não ofendi a honra de ninguém.”

De resto, nas entrevistas que se foram sucedendo nos vários canais de televisão – com tempo privilegiado para a Record, do bispo Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus, que o apoiou na eleição – confirmou as suas promessas polémicas, como reduzir a maioridade penal para os 14 anos ou alterar o Estatuto de Desarmamento de forma a tornar mais fácil a concessão do porte de arma. 

Folha é o inimigo

A clara ameaça ao jornal Folha de São Paulo marcou as cinco entrevistas a diferentes canais de televisão que o Presidente eleito do Brasil Jair Bolsonaro deu na sua casa no Rio de Janeiro. “Esse jornal se acabou”, afirmou na entrevista ao Jornal Nacional da Globo.

“Não tem mais prestígio nenhum, quase tudo o que é fake news veio desse jornal. Em tudo o que depender de mim, esse jornal não terá campanha institucional”, declarou, a partir da sua casa, na Barra da Tijuca, ameaçando cortar toda a publicidade governamental das páginas do diário, o que é uma fonte de rendimento importante para qualquer publicação.

A Folha de São Paulo manteve durante toda a campanha eleitoral uma posição crítica em relação ao candidato de extrema-direita – nas suas páginas saíram investigações como a que denunciou que um grupo de empresários ligados a Bolsonaro teria contratado empresas para, nas vésperas da segunda volta, domingo passado, fazer um disparo maciço de mensagens através do WhattsApp que seriam desfavoráveis ao Partido dos Trabalhadores (PT).

Bolsonaro tem o diário como alvo, numa atitude semelhante à que o Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tem com o New York Times.

As palavras de Bolsonaro geraram uma campanha em defesa da Folha nas redes sociais e apelos de várias pessoas a que se façam novas assinaturas do jornal – e de outras pedindo aos assinantes que cancelem a sua. A própria Folha disponibilizou uma notícia em inglês sobre as declarações do Presidente eleito no seu site.

Geraldo Alckmin, que foi candidato à presidência pelo Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) na primeira volta, disse no Twitter que os ataques de Bolsonaro “representam um acinte a toda a Imprensa e a ameaça de cooptar veículos de comunicação pela oferta de dinheiro público é uma ofensa à moralidade e ao jornalismo nacional”.

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