Profissão – Património em mutação

Três questões emergem como fulcrais para a definição do presente e futuro da profissão de arquitecto.

Património. Paisagem.

Todos nós reconhecemos o valor e centralidade destas palavras e lhes dedicamos discussões, reuniões, conferências e congressos no arrastar das últimas décadas, confirmando a sua continuada pertinência.

No entanto, um mundo e uma profissão em mutação acelerada impõe desafios pendentes e toda uma classe profissional reclama um volte face nestas discussões.

Reflexos das forças políticas, sociais, tecnológicas, culturais e económicas que quotidianamente moldam o nosso destino colectivo, três questões emergem como fulcrais para a definição do presente e futuro da profissão de arquitecto:

- A prática profissional e a complexidade jurídica e dos procedimentos técnicos e administrativos;

- O impacto do novo paradigma tecnológico na Arquitectura e na Construção.

- A dignidade e viabilidade económica da profissão de arquitecto.

A complexidade jurídica e dos procedimentos técnicos e administrativos influencia profundamente a actuação dos arquitectos e tem impacto directo no desenvolvimento do país. Importa uniformizar a entrega dos processos e agilizar os procedimentos administrativos com a criação de um sistema único comum a todas as autarquias. É fundamental pugnar para que o Código Único de Construção deixe de ser uma quimera e passe a ser um compromisso e um objectivo calendarizado pelo Estado.

A resolução célere desses custos de contexto que brotam da máquina burocrática/administrativa é fundamental perante a aproximação iminente de um novo paradigma tecnológico na Arquitectura e na Construção. Das transformações tecnológicas mais difusas, que já influem na forma de desenvolver e gerir projectos, a um futuro não tão longínquo, onde num estaleiro cada vez mais robotizado, poderemos assistir à impressão de um edifício com projecto de catálogo online. Antecipar e criar condições para a mudança é garantir a sobrevivência e relevância da profissão de arquitecto. É sermos vanguarda e não um anacronismo aos olhos da sociedade.

Uma adaptação estrutural desta monta só é possível numa actividade cuja dignidade e viabilidade económica esteja garantida.

No entanto, a mesma tem sido posta em causa, sobretudo após contínuas iniciativas de liberalização e desregulação, como a abolição imposta pela UE da tabela de honorários, que paulatinamente – assente na falácia do interesse do consumidor – trilham um caminho de degradação do serviço prestado e uma desvalorização da formação técnica e científica especializada, curiosamente reconhecida nos quatro cantos do Mundo.

Usando como alibi o foco no resultado, à semelhança do que existe em vários países da Europa, há inclusive entidades (AdC/OCDE) a defenderem que a profissão de arquitecto deixe de ser reservada a quem possui formação em Arquitectura. Assistimos, assim, a um ataque ao valor do trabalho e da propriedade intelectual em benefício do aumento das margens do sector financeiro e especulativo.

É, por isso, urgente definir um valor mínimo por acto ou tipologia de projecto, prevenindo a concorrência desleal e de mecanismos de degradação económica, tais como o dumping.

Temos de debater e incorporar na actividade profissional a noção de “emprego e trabalho decente”.

Absorver todas estas questões de forma crítica e pró-activa é assumir que o património arquitectónico e a paisagem não se compadecem com intervenientes desqualificados, sub-remunerados ou com soluções à la carte. É afirmar convictamente que os arquitectos são essenciais e insubstituíveis no desenvolvimento e qualificação do território e do património seja ele internacional, nacional ou local, seja no projecto do grande equipamento ou da pequena habitação.

A adaptação à mudança será inevitável e é imperativo traçar um rumo, um futuro. Temos que estar aptos a actuar tanto local como globalmente, pois o território dos arquitectos portugueses também é o Mundo. Temos que perceber as dinâmicas e os fluxos que perspectivem as formas de evolução do exercício da profissão de arquitecto. Temos que ser capazes de introduzir novos elementos e novas metodologias. Temos que valorizar a cooperação e a partilha, na criação de um caminho.

Assumindo os ensinamentos do passado, respeitando as directrizes de ética e deontologia a que estamos obrigados, temos que reinventar a profissão e a Ordem dos Arquitectos tem que ser o ponto fulcral e a alavanca dessa transformação. 

A O.A. tem que se assumir como agente e catalisador dessa mudança, congregador de opiniões e de ideias, espaço de debate e de democracia.

Casa onde a grande maioria silenciosa dos arquitectos encontre eco.

Este texto reflecte a posição do Conselho Directivo da Secção Regional do Norte da Ordem dos Arquitectos e espelha a moção apresentada no 15.º Congresso dos Arquitectos

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