Descoberta de recursos naturais: bênção ou maldição?

A descoberta de recursos como o petróleo ou o gás natural está associada à entrada de capital nos países onde estes são encontrados, o que teoricamente levaria ao progresso económico e ao aumento da qualidade de vida das suas populações. Contudo, a realidade têm-se mostrado bastante distinta.

Todos os países do mundo possuem recursos naturais, porém, apenas alguns são abundantes em recursos que geram grandes retornos financeiros, como o petróleo, o gás natural ou o carvão. O comportamento das economias após começarem a receber as receitas da exploração é variável de caso para caso, mas após décadas de estudos económicos, sabemos hoje que, em média, países abundantes em recursos naturais têm registado menos crescimento económico do que os restantes países [1]. Por que razão estes recursos não se materializam em desenvolvimento económico e social, tendo deixando algumas zonas do mundo em situações de grande instabilidade? Esta pergunta revela-se um dos maiores paradoxos da Economia, com impactos reais numa escala global, tendo por isso recebido o nome de maldição.

A explicação deste fenómeno está largamente relacionada com o nível de desenvolvimento das economias e das respetivas instituições nacionais. Transparência e prestação de contas (accountability, no inglês) são dois fatores essenciais para garantir o sucesso destas descobertas, os quais estão associados à existência de entidades democráticas. Contudo, tal como escreveu Larry Diamond, professor da Universidade de Stanford, “há 23 países no mundo cujas exportações provêm pelo menos em 60% de petróleo ou gás, mas nenhum deles é uma verdadeira democracia" [2].

A inexistência de transparência pode manifestar-se em todas as partes envolvidas no processo: tanto nos governos locais como nas empresas exploradoras, as quais são, na sua maior parte, grandes empresas de cariz internacional. Para se perceber como se desencadeia todo o processo que dá origem à chamada maldição é necessário entender as suas fases. Numa primeira fase, decorrem os processos de pesquisa. Para a maior parte dos recursos este é um procedimento complexo e que envolve elevados investimentos. Muitos países não têm o know-how ou os fundos necessários e por isso negoceiam com empresas estrangeiras multinacionais, concedendo-lhes licenças de exploração. Quando os países não têm conhecimento para lidar com este tipo de contratos e sabendo que do outro lado se encontram empresas experientes, começam a surgir dúvidas sobre debaixo de que leis se vai desencadear o processo, isto é, se os políticos locais têm conhecimento suficiente para garantir que o país vai receber o maior proveito possível. Assim, quanto mais débeis forem as instituições, pior é para os negócios em questão. Esta relação está bastante patente no facto de serem os países com menos qualidade nas suas instituições os que sofrem mais a maldição dos recursos naturais e que consequentemente têm um pior desempenho.

Numa segunda fase, aquando da exploração, criam-se países dependentes da indústria extrativa, o que leva toda a economia a passar pela instabilidade do preço das matérias-primas nos mercados internacionais, gerando insegurança. Os outros setores ficam esquecidos para que as políticas se foquem no que dá mais rendimento.

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Adicionalmente, os benefícios diretos para as populações tendem a ser escassos. Apesar do esperado aumento de emprego, este tende a ter duas variáveis: por um lado, ser maioritariamente para mão-de-obra menos qualificada, uma vez que os locais nem sempre estão preparados para trabalhar em postos mais técnicos, e, por outro lado, tende a ter um curto prazo.

Em casos mais extremos, mas que não obstante têm sido bastante visíveis, a descoberta e exploração de recursos pode levar à instabilidade política e ao aparecimento de conflitos. Estudos econométricos confirmam que a presença de recursos naturais aumenta o risco de violência nos países dependentes dos mesmos.

Por todos estes motivos, impõe-se uma questão final: pode a descoberta de recursos ser uma bênção e não uma maldição? Tal como escreveu o Nobel da Economia, Joseph Stiglitz: “os recursos (...) podem ser uma bênção mas esta não irá acontecer por si mesma, nem facilmente.” [3] As soluções devem ser tanto internas ao país, passando por aumentar a transparência, treinar trabalhadores locais, desenvolver empresas locais e aproveitar os benefícios da indústria extrativa para alavancar a restante economia; bem como externas, aumentando a cooperação entre a comunidade internacional, e a regulação das empresas exploradoras.

A autora escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

[1] Torvik R. (2009), Why do some resource-abundant countries succeed while others do not?, Oxford Review of Economic Policy
[2] Larry Diamond (2008), The Spirit of Democracy
[3] The Guardian (2012), Africa's natural resources can be a blessing, not an economic curse

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