A culpa do Brexit é dos jornais — e dos ingleses

Os jornais ingleses têm sido tão bem sucedidos que acabaram por levar todo um país à ignorância, xenofobia e ao precipício do isolamento num mundo global, tornando esta ilha na ilha que efectivamente é e sempre foi, sem precisar de o ser.

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LUSA/VICKIE FLORES

Ainda mal se sabia do prolongamento do prazo para a saída do Reino Unido da União Europeia e já os jornais do costume, vulgo o Daily Mirror, The Sun, Daily Mail, Daily Star, clamavam em grandes parangonas o horror de ficar um ano, ou mais, sob a égide da União Europeia, sob os grilhões da União Europeia, como se o Reino Unido não tivesse voz, como se a jangada de pedra não tivesse timoneiro, à deriva, sujeita aos caprichos dos 27, apenas interessados em rapinar as riquezas do Reino Unido através de vagas sucessivas de imigrantes.

No dia em que o Reino Unido sair da União Europeia, com a subida em flecha do desemprego através da deslocalização de empresas e do coração financeiro da City de Londres mais a queda da libra para metade do valor do euro, ou menos ainda, os tablóides não demorarão dois segundos a culpar, em grandes parangonas, o governo britânico pelas más opções, pelo mau acordo, pela saída do Reino Unido da União Europeia. 

Esquizofrenia? Não, economia. Porque é preciso vender jornais e, para vender, em nome do lucro, estes jornais fazem tudo, fazendo corar de vergonha os tablóides portugueses, muitos anos-luz atrás da pouca vergonha que por aqui grassa.

E por ser preciso vender, os jornais ingleses têm sido tão bem sucedidos que acabaram por levar todo um país à ignorância, xenofobia e ao precipício do isolamento num mundo global, tornando esta ilha na ilha que efectivamente é e sempre foi, sem precisar de o ser.

Mas a culpa não é só dos jornais, é dos ingleses também, e a Europa do lado de lá do canal, porque a Europa é lá, aqui é a Inglaterra, não é a Europa, e os ingleses sempre viveram com um pé dentro e um pé fora. Teimosamente divergentes do resto da Europa, desde a moeda à condução à esquerda sem esquecer o controlo fronteiriço, os ingleses foram sempre irredutíveis, orgulhosos, nacionalistas e religiosamente crentes no super poder do peixe com batatas fritas à sexta-feira.

Por tudo isto não é de surpreender a extensão do prazo para a suposta saída de um mercado único que precisa tanto do Reino Unido como o Reino Unido precisa do mercado único, para o bem e para o mal, na saúde e na doença, até que a morte nos separe.

Convenhamos, o Brexit nunca será uma realidade e a existência de tal fenómeno não é senão o espelho da eterna relação idiossincrática entre o Reino Unido e a Europa, no fundo mais um episódio, e desta vez longo, mas mais um, com princípio, meio e fim, pelo menos até fazer zapping e mudar de canal.

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