Vieira da Silva manda, Carlos César obedece

Pensava-se que, com a nova solução política criada em 2005, que pôs o foco da acção no Parlamento, as coisas poderiam mudar. Não mudaram.

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O Governo manda, o Parlamento obedece. O sistema tem funcionado assim, num torpor instalado que é o avesso do espírito da Constituição. Pensava-se que, com a nova solução política criada em 2015, que pôs o foco da acção no Parlamento, as coisas poderiam mudar. Não mudaram.

À medida que a autoconfiança do executivo nas suas proezas foi crescendo, a arrogância do Governo perante o Parlamento disparou. Costa manda, Centeno manda, Vieira da Silva manda; Carlos César obedece, Catarina Martins obedece, Jerónimo obedece. Em nome das respectivas sobrevivências políticas, estão todos disponíveis por razões diferentes para a submissão. 

Já não é a primeira vez que Vieira da Silva decide o que acha que deve decidir mostrando o seu desprezo pelo Parlamento, Partido Socialista e parceiros do Governo. Aconteceu com a assinatura do Acordo de Concertação Social, em que o líder parlamentar (e presidente) do PS deve ter sido dos últimos a saber – e que é suposto a Assembleia aprovar sem tugir. Na altura, César esbracejou, admitiu que o PS faria propostas de alteração ao Acordo de Concertação Social assinado pelo Governo. Até agora, nada se viu. 

O mesmo filme repete-se com a lei-travão das reformas e os protagonistas são os mesmos. Vieira da Silva anunciou que circunscreve o acordo conseguido para retirar a penalização do factor de sustentabilidade às reformas antecipadas de quem começou a trabalhar antes dos 20 anos. Carlos César acha que não era esse o espírito do que foi acordado à esquerda nem aceite pelo PS.

Vai acontecer alguma coisa? Não. Costa já veio defender Vieira da Silva, o assunto está arrumado.

Se publicamente o líder parlamentar (e presidente) do PS disse que "o que o Governo quer é que o regime seja melhor e não pior" e que "havendo dúvidas" dever-se-ia "clarificar a lei" e "perceber da parte do Governo se também partilha essas dúvidas", quem duvida que irá aceitar as migalhas que Vieira da Silva estiver disposto a oferecer?

É Vieira da Silva quem manda. Não é Carlos César (que teve poder efectivo durante 16 anos nos Açores mas que agora só dispõe de poder ornamental) nem o resto dos deputados do grupo parlamentar que fatalmente, tal como são todos Centeno, também serão todos Vieira da Silva. 

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