Fifó: "Um dos meus sonhos é ser a melhor jogadora do mundo"

Estrela da selecção portuguesa de futsal na conquista dos Jogos Olímpicos da Juventude, a atleta revela que já recebeu propostas do estrangeiro e lamenta que a modalidade não esteja a evoluir ainda mais depressa.

Foto
DR

Fifó. Nos bastidores do futsal internacional, a alcunha tem circulado com insistência nos últimos dias. Por força da conquista de Portugal no torneio feminino dos Jogos Olímpicos da Juventude, claro, mas acima de tudo por força da prestação de Ana Sofia Gonçalves na competição. Aos 18 anos, a universal lisboeta não se limitou a sagrar-se melhor marcadora da prova, em Buenos Aires. Fê-lo com nota artística suficiente para motivar elogios de todos os quadrantes e um convite inesperado para ir jogar e estudar nos Estados Unidos. Ao PÚBLICO, apontou o estatuto de melhor do mundo como um objectivo de carreira.

Como é que tem vivido estes dias de reconhecimento generalizado?
Esta foi uma competição diferente de todas as outras. É um dos títulos mais importantes da minha carreira até agora, como foram os dois campeonatos nacionais que já conquistei pelo Benfica. Mas fico muito contente por poder estar a fazer história por Portugal e elevar ao mais alto nível o nosso futsal feminino. Fico contente por reconhecerem o meu trabalho e o grande esforço que tenho feito. Todos os dias tento aplicar-me ao máximo e ser melhor.

De que forma é que, nesta fase da sua vida, concilia os estudos com o futsal?
Estou a tirar o 12.º ano na área de Gestão Desportiva e quero seguir esta área desportiva quando entrar na faculdade. Apesar de não dever ser assim, o futsal para mim sempre foi uma das minhas grandes prioridades e aquilo que gosto mesmo de fazer. Agora, sei que vai ser difícil conseguir conjugar os estudos com a prática desta modalidade, porque não sei onde estarei daqui a cinco anos, por exemplo. Se em Portugal ou não. Mas, mesmo aqui em Portugal, vai ser sempre difícil conseguir conciliar os dois. Até agora tenho conseguido e isso é o mais importante.

A visibilidade e os títulos que tem conseguido já lhe valeram ofertas do estrangeiro?
Já tive propostas para ir jogar para fora, nomeadamente de Espanha e Itália. Não aceitei, também porque tinha de acabar os estudos. É importante saber conciliar estas duas coisas. É preciso ter noção de que só se o futsal feminino evoluir muito, e mesmo assim será muito difícil, será possível fazer vida só com o futsal. É importante ter outras habilitações. Mas também houve um senhor que tentou falar comigo sobre a hipótese de ir jogar nos EUA já neste torneio. Perguntou-me se eu por acaso gostaria de ir para lá e fazer lá a faculdade. Eles são lá muito bons em futebol de 11 feminino, mas creio que em futsal não têm uma Liga muito forte e competitiva.

Financeiramente, porém, poderia no futuro ser um desafio interessante.
Aqui em Portugal o futsal feminino ainda não é, obviamente, atractivo para se construir uma carreira, porque não há equipas profissionais sequer. Agora no estrangeiro, em Itália e Espanha, existe profissionalismo. Em Espanha principalmente, porque tem um campeonato muito competitivo, muito bom. Em Itália é onde pagam melhor às jogadoras, se calhar. Mas nos últimos anos esta modalidade tem evoluído imenso também em Portugal, com cada vez mais apoios e qualidade, com boas gerações de jogadoras. É importante sermos todas reconhecidas pelo esforço que temos feito e por tudo o que fazemos por esta modalidade.

Apesar da evolução que refere, há ainda um abismo a separar o futsal feminino do masculino.
Ainda se nota uma grande diferença entre o futsal feminino e o masculino. Mas é por isso mesmo que estas conquistas nos dão gozo. Jogamos por amor à modalidade e não por causa do dinheiro. Gostamos mesmo do que fazemos. É importante conseguirmos conquistas como estas, para demonstrarmos que temos tanta ou mais qualidade do que os rapazes.

E como é que começou a sua caminhada no futsal?
Comecei a praticar futsal com os meus sete/oito anos. O meu pai e o meu irmão jogavam futebol de forma recreativa, mas eu acabei por preferir o futsal. Desde pequenina que só queria bolas e jogar. Tive oportunidade de poder começar a experimentar futsal e na mesma altura em que comecei quiseram também que tentasse o futebol de 11. Experimentei os dois, tive de fazer uma escolha e acabei por optar na altura pelo futsal. Talvez pela intensidade do jogo em si, muito móvel, onde estamos sempre a mexer-nos. Dá mais pica, é um jogo mais emotivo e com um desfecho mais incerto. Não estou arrependida da escolha, mas tenho pena que o futsal feminino não esteja a evoluir tanto como o futebol feminino, apesar de ter evoluído imenso.

Foto

Explique-nos como é que apurou essa veia goleadora.
Sou uma jogadora que costuma marcar golos. Sou uma jogadora ‘universal’, que procura muito o golo, mas não estava à espera de estar a tão bom nível, ainda para mais porque regressei de uma lesão um bocado grave na coxa. Estive três semanas a fazer uma recuperação para conseguir estar bem, eventualmente não a 100%, mas apta para ir a jogo. Marquei 21 golos. Queria fazer um bom torneio, mas não estava à espera de fazer tantos golos e ser tão boa individualmente. Mas isso fica sempre para segundo plano e o que importa é que colectivamente conseguimos todas ganhar os Jogos Olímpicos.

Uma pergunta inevitável: de onde vem o nome Fifó?
A minha família começou a chamar-me Fifó quando era muito pequena. Não estou certa do motivo, mas suponho que venha por me chamar também Sofia. E é por este apelido que sou conhecida no mundo do futsal.

Por falar em família, que relação é que existe com o futsal?
A minha família apoia-me imenso em todas as minhas decisões e para mim isso é essencial. Mesmo estando longe, todos os dias trocamos mensagens e vídeo-chamadas. Estão sempre a apoiar-me antes e depois dos jogos.

Algum dos seus familiares próximos tem também alguma ligação ao mundo do desporto?
O meu pai é carpinteiro e a minha mãe trabalha no ramo da restauração e tenho ainda um irmão. Jogo com eles futebol de vez em quando, na praia, na brincadeira. Quando era mais nova jogava sempre com os rapazes na rua e no recreio da escola [em Carnide e na Quinta da Luz]. Na altura, a maior parte das raparigas nem sequer tinham jeito. Eles ficavam um bocadinho picados comigo, que já tinha alguma técnica.

Alcançado este título, que outros desafios tem em perspectiva?
Um dos meus sonhos é vir a ser profissional e ser a melhor jogadora do mundo. Caso não consiga tornar-me numa profissional de futsal, pretendo trabalhar em algo que tenha a ver com o desporto, que é aquilo que gosto de fazer. Ainda não sei bem em que área específica. Mas sou boa aluna e o futsal não me retira a concentração dos estudos, apesar de estar muitas vezes fora das aulas por causa dos estágios da selecção. Consigo conciliar bem, sem grande problema. Até porque tenho estatuto de atletas profissionais.

Sugerir correcção
Ler 1 comentários