Prognósticos, só no fim do jogo

A volatilidade das previsões de médio e longo prazo relativas à sustentabilidade da Segurança Social tem razões que importa identificar.

Numa altura em que se inicia a discussão do Orçamento do Estado (OE), a preocupação da generalidade dos jornalistas e comentadores políticos centra-se fundamentalmente naquilo que são as intenções do Governo para o ano seguinte (neste caso, 2019). Contudo, e talvez mais relevante do que discutir as orientações de curto prazo para a despesa e receita, importa perceber quais os pressupostos/objetivos de longo prazo em que assenta essa estratégia orçamental. Neste contexto, merece especial atenção o documento que anualmente integra o OE e no qual é analisada a sustentabilidade de médio e longo prazo do Sistema Previdencial da Segurança Social: Relatório sobre Sustentabilidade Financeira da Segurança Social.

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Apesar da importância do documento, o certo é que uma análise detalhada do mesmo permite identificar um conjunto de limitações relevantes. Em primeiro lugar, destaca-se o insuficiente quadro de pressupostos em que as previsões são realizadas (apesar das melhorias observadas). Em segundo lugar, e consequência do anterior, a “volatilidade” das previsões inscritas neste documento ultrapassa, em muito, o observado nos mercados financeiros nos dias mais negros.

Para ilustrar esta situação, considere-se as previsões inscritas no OE para 2014, 2017 e 2019 relativas ao saldo do Sistema Previdencial. Se o documento referente a 2014 previa um saldo do Sistema Previdencial em 2030 de -0,8% do PIB, já no OE para 2017 a previsão era de apenas -0,5%, tendo melhorado para -0,4% no OE de 2019.

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De igual forma, as previsões relativas ao Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS) têm variado de forma acentuada. Se no OE para 2010 a previsão para o valor do FEFSS em 2040 correspondia a 11% do PIB, no OE de 2014 e 2015 esse valor caiu para 0%, subindo para 6,1% na OE de 2018 e para 6,2% no OE para 2019.

A volatilidade das previsões de médio e longo prazo relativas à sustentabilidade da Segurança Social tem razões que importa identificar. Por um lado, e como já referido, a ausência de um quadro de pressupostos robusto. Por outro, a inexistência de uma cultura de avaliação independente das políticas sociais, conduzindo a que os responsáveis pela definição das políticas (i.e. governos) sejam os responsáveis pela avaliação dessas mesmas políticas. Por fim, porque as previsões de longo prazo têm sido utilizadas, frequentemente, como “instrumento político” dos diversos governos, quer quando servem para sustentar medidas paramétricas urgentes, quer quando são utilizadas para nada fazer.

Este constante adiar de uma inevitável reflexão profunda sobre a sustentabilidade da Segurança Social traz-nos à memória as palavras de João Pinto, o “eterno” capitão do Futebol Clube do Porto. Questionado por um jornalista sobre a antevisão de um jogo, resolveu responder dizendo algo que passou a fazer parte do imaginário futebolístico português: prognósticos, só no fim do jogo! Esperemos que nessa altura não seja tarde de mais.

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