Bolsonaro e o voto do protesto

Se queremos reformar o sistema político, a única hipótese que temos é votar em candidatos que vão fazer melhor política. O voto de protesto é um voto contra a ideia de política e a negação da política é puro conservadorismo.

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LUSA/FERNANDO BIZERRA

Jair Bolsonaro lidera sondagens para a segunda volta das eleições presidenciais. Há uma forte probabilidade de sair vencedor e, com isso, ampliar a base do ódio. Votar em Bolsonaro pode ser considerado um gesto de protesto contra os antigos governantes do Partido Trabalhista (PT). O voto de protesto, que ganha especial ênfase no caso do Brasil — basta pensarmos no caso de Tiririca —, não é um voto contra um candidato, uma vez que nele estão representados todos os segmentos ideológicos, mas sim um voto contra o sistema político como um todo.

O eleitor não se sente representado pelo candidato em que votou pois, chegado ao poder, este vê-se impotente perante uma máquina que actua em causa própria. O que significa que estamos perante um sistema blindado e opaco virado para si e com baixa intensidade democrática. Assim, o eleitor começa a recusar o sistema como um todo e a democracia começa a perder força.

Há sempre opções para melhorar o sistema político tornando-o mais democrata e a desistência não pode ser uma opção. Do ponto de vista prático, o voto de protesto, materializado no voto branco ou nulo, é absolutamente estéril. Se fizermos uma retrospectiva do voto eleitoral das últimas décadas, podemos observar que não só no Brasil, mas em diversos países, temos vindo a assistir ao fenómeno da antipolítica. É curioso notar que este voto tem vindo a encontrar candidatos representativos de uma larga fatia da população profundamente inculta, descontente e detentora de uma força avassaladora e perigosa. Conseguindo, deste modo, canalizar uma energia de revolta social contra os sistemas políticos absolutamente selvagem.

A classe mais baixa tende a votar de acordo com uma leitura mais imediata da sua realidade, porque oprimidos por esta, tem mais dificuldade em fazer um voto estrutural, ou seja, de entender que a questão concreta está na reforma estrutural do sistema político e não no candidato que promete melhorar um problema concreto. Tomemos como exemplo, o candidato que promete ir a casa do eleitor dizendo: "Vou colocar aqui um cano, fazendo um saneamento precário." Na verdade, esse candidato vai resolver os problemas de forma imediata, mas apenas contribuirá para o aumento da precarização da sociedade.

Falta, por parte do eleitor, uma perspectiva estrutural, que aniquile a perspectiva imediatista. Estas candidaturas vestem-se de transformação quando, no fundo, são as mais conservadoras. Os candidatos da antipolítica são, na escala da transformação social e política, os que têm menos hipóteses de transformar o sistema político. É urgente identificar e reflectir no seguinte: se queremos reformar o sistema político, a única hipótese que temos é votar em candidatos que vão fazer melhor política. O voto de protesto é um voto contra a ideia de política e a negação da política é puro conservadorismo.

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