No mundo “à parte” das escolas de negócios, crescer é a palavra de ordem

Os cortes sucederam-se no ensino superior público na última década, o número de novos alunos desceu, mas não é esse o clima na área das escolas de negócios. O aparente contraciclo em que vivem é ditado pelas necessidades das empresas.

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Novas instalações da Nova School of Business and Economics (SBE) NELSON GARRIDO

Poucos terão passado ao lado da inauguração das novas instalações da Nova School of Business and Economics (SBE), em Cascais, no final do mês passado. As atenções mediáticas estavam colocadas sobre um lugar onde se cruzaram dois Presidentes da República. O facto político ajudou a dar ainda maior visibilidade ao que já era um grande investimento: 50 milhões de euros e um campus com 90 mil metros quadrados e localização privilegiada.

Cinco anos antes, no pico da austeridade, nasceu a nova casa da Porto Business School (PBS). O caminho foi semelhante ao que foi feito pela Nova: a escola de negócios saiu da cidade-sede da universidade a que está ligada, o Porto, e mudou-se para Matosinhos. O campus tem cerca de 10% da área do da Nova SBE e custou 15 milhões de euros.

O ensino superior sofreu cortes no financiamento público ao longo da última década e viu diminuir, durante boa parte desse período, o número de novos alunos. Num contexto de crise, as inaugurações de novos edifícios universitários tornaram-se um acontecimento raro. E investimentos como os da Nova BSE ou da PBS parecem em contraciclo com o que continuam a ser as queixas públicas do sector.

“Este é um mercado muito específico”, sintetiza Paulo Bento, presidente do Indeg, a escola de negócios do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa. “O tipo de formação é diferente e o ambiente também tem que ser, o que justifica que os edifícios das escolas de negócios sejam habitualmente os mais nobres das instituições”, completa.

As formações das escolas de negócios destinam-se a uma elite: os executivos das empresas. E ainda que não tenham passado completamente ao lado da crise, que também fez diminuir a procura das suas formações nos primeiros anos desta década, vivem numa espécie de mundo "à parte", como afirma o CEO da Formação de Executivos da Nova SBE, Luís Rodrigues. A abordagem é sobretudo empresarial, angariando clientes e, por essa mesma via, financiamento.

Se deixarmos de lado os anos da crise, a curva de procura das principais escolas de negócios nacionais ao longo da última década tem sido de crescimento constante. Mais alunos – ou participantes como lhes chamam –, um maior número de empresas parcerias e uma diversificação evidente do portfólio de formações.

A comunicação faz-se sobretudo em inglês e até as faculdades adoptaram nomes nesse idioma, não só porque esse é a língua franca dos MBA e do mercado no geral, mas também porque o meio é internacionalizado como mais nenhum outro no ensino superior no país.

Há dez anos, a Porto Business School era “uma escola pequena e pouco internacional”. Hoje “duplicou de tamanho” e tem 10% de alunos estrangeiros, exemplifica Patrícia Teixeira Lopes, vice-dean da escola de negócios do Porto.

O sucesso das instituições que foram pioneiras nesta aposta – e que em grande medida continuam a liderar o mercado – fez com que o mercado das escolas de negócios e da formação para executivos se tenha tornado num mercado em crescimento ao longo da última década e meia, contagiando todo o sector do ensino superior.

Hoje, pelo menos 29 instituições de ensino têm ofertas nesta área e há mais de 700 formações de gestão e negócios nas universidades e politécnicos nacionais, tanto nos públicos como nos privados, segundo dados recolhidos pelo PÚBLICO (ver lista nas páginas 12 a 15) junto das instituições. Não existem dados centralizados e nem todas as instituições respondem. Nesta amostra estão, ainda assim, representadas as maiores instituições de ensino portuguesas, mas os números totais podem ser ligeiramente superiores.

No princípio era o MBA

Há dois factores que têm que ser considerados para entendermos o crescimento das escolas de negócios. Por um lado, o acordo de Bolonha que criou um sistema de equivalências entre os cursos superiores nos vários países europeus. Esse factor, aliado a um encurtamento das licenciaturas para três anos, criou um verdadeiro mercado europeu de mestrados, tornado cada vez mais comum a mobilidade no segundo ciclo de formação superior. Que começou por abranger os recém-licenciados, mas rapidamente se estendeu para profissionais que já estavam no mercado, mas procuravam novas qualificações.

Por outro lado, assistiu-se à emergência de um novo tipo de formação destinada sobretudo a este público mais adulto, o Mestrado Executivo. Esta oferta começou por se popularizar em algumas das principais escolas de negócios europeias e, rapidamente, passou a fazer parte dos portefólios das instituições portuguesas.

Este mestrado é uma versão “mais ligeira” do Master of Business Administration (MBA), que foi durante largos anos a solução para os profissionais que queriam adquirir competências nas áreas de gestão e liderança, contextualiza Luís Cardoso, da Católica Lisbon School of Business and Economics.

O MBA é “extremamente exigente e transtorna completamente a vida pessoal e profissional” dos participantes. O Mestrado Executivo nasceu, assim, para responder a um “imenso número de pessoas que sente necessidade de ter uma formação de qualidade, com uma razoável dimensão académica”, mas sem a mesma pressão dos MBA.

De qualquer das formas, o MBA manteve o seu peso simbólico nas escolas de negócios. “São os estandartes das organizações”, ilustra diz Luís Cardoso, ainda que tenham deixado de ser a principal aposta das instituições para captação de alunos.

Há hoje 18 MBA em Portugal (em oito instituições de ensino superior) e 14 mestrados para executivos. Além destes, existe o mercado da formação para executivos que se faz sobretudo de mestrados, mas que não concedem um grau formal – são 265 no total, ou seja, 37% da oferta existente – e pós-graduações (há 226). No portefólio das instituições contam-se ainda 43 doutoramentos nas áreas de gestão e negócios.

A grande tendência deste mercado, que se vem acentuando nos últimos anos, é, todavia, os cursos para executivos. Estas formações não dão um diploma formal, como um mestrado ou um doutoramento, mas são procurados pela sua capacidade de aliarem o conhecimento dos professores das universidades e um aporte prático trazido por gestores que estão no mercado e são convidados para as formações.

Na lista recolhida pelo público há 136 destas formações, mas a lista é maior se forem considerados os programas “intra-empresa” ou costumizados, cursos desenhados pelas escolas de negócios em resposta a pedidos específicos dos “clientes”, as empresas. “Estes programas só fazem sentido se forem pensados numa lógica de co-criação”, defende o CEO da Formação de Executivos da Nova SBE, Luís Rodrigues.

Os planos de formação têm que ser “cada vez mais adaptados às necessidades das empresas”, sobretudo em termos de duração, já que estas “não conseguem ter os quadros disponíveis durante tanto tempo quanto era habitual”, explica Miguel Varela ISG, uma escola privada com sede em Lisboa.

Mercado internacional

A medida do sucesso das escolas de negócio num mercado que é internacional é o ranking do Financial Times – publicado todos os anos, em Dezembro, e que é baseado em quatro listas sectoriais que vão sendo lançadas ao longo do ano. Na última edição do “ranking dos rankings” da publicação britânica surgiram, pela primeira vez, quatro escolas de negócios portuguesas, com a entrada do ISCTE, 80º colocado entre 95 instituições.

A melhor colocada das portuguesas é a Nova SBE, que ocupa o 25.º lugar, seguida da Católica Lisbon School of Business and Economics, na posição imediatamente a seguir. As duas escolas pioraram a sua classificação face ao ano anterior (partilhavam a 23ª posição), mas têm conseguido manter, desde o início da década, uma posição consistente entre os 30 primeiros classificados.

A outra escola portuguesa presente no ranking compilado anualmente pelo jornal britânico é a PBS, incluída pela primeira vez em 2011 e que, na última edição da lista, estava na 59.ª posição.

Os rankings desempenham um papel “muito importante” na “estratégia de crescimento” das escolas de negócios, sublinha Patrícia Teixeira Lopes, da PBS, que passa "obrigatoriamente" pelo mercado internacional. A outra peça desse puzzle são as acreditações internacionais: da britânica Amba – Association of MBAs; o Equis atribuído pela European Foundation for Management Development e ainda a Association to Advance Collegiate Schools of Business (AACSB), norte-americana.

É a chamada “coroa tripla”, que Católica Lisbon e Nova SBE já detêm e a PBS está em vias de obter, estando em processo de acreditação pela AACSB. “Precisamos desses instrumentos para aparecermos nos radares das empresas e dos estudantes internacionais”, acrescenta a vice-deã da escola de negócios do Porto.

A internacionalização das escolas de negócios “é o futuro”, defende o director da escola de negócios da Universidade Católica de Lisboa, Luís Cardoso. O mercado português “será sempre importantíssimo” para estas instituições “mas tem uma dimensão limitada”. Por isso, se querem continuar a crescer, as escolas vão ter que apostar em atrair cada vez mais alunos internacionais.

Cerca de metade dos inscritos nos MBA das principais escolas de negócios são estrangeiros. A percentagem de estudantes internacionais, contabilizando todos os outros programas, está à volta dos 10%. “Esta indústria tem um grande potencial de crescimento”, defende Luís Rodrigues da Nova SBE, elencando o clima, a segurança e o baixo custo de vida como mais-valias que Portugal tem que saber explorar para atrair mais estudantes internacionais.

Contudo, o próprio mercado português tem ainda margem para crescer. A IMD, escola de negócios suíça que é uma das referências do sector na Europa, publica anualmente um Ranking de Talento Europeu, em que mede vários factores capazes de atrair e reter talento numa determinada economia.

Na lista de 2016, Portugal estava em 22.º, a sua melhor classificação de sempre, mas no índice que media a importância da qualificação dos trabalhadores dentro de uma empresa era o penúltimo (60.º em 61 países), apenas atrás de Espanha. No ano seguinte, Portugal conseguiu subir seis lugares nesta classificação, mas está ainda assim numa posição bastante baixa da tabela.

E quando se olham para indicadores como o custo de vida ou a capacidade no domínio de línguas, em que Portugal aparece, em ambos, em 12.º, torna-se ainda mais perceptível como “a aposta na formação de colaboradores dentro das empresas” é ainda “um mercado extremamente subdesenvolvido em Portugal”. "Há muito por onde crescer".

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