Acórdão da Operação Fizz adiado. Arguido admite processar Estado

Alterações às imputações daa acusação podem indicar que juízes preparam condenação, mas não há certezas.

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Orlando Figueira Rui Gaudêncio

Foi adiado esta segunda-feira o acórdão do caso Fizz, em que Orlando Figueira é acusado de ter recebido 760 mil euros do ex-vice-presidente de Angola para arquivar um inquérito em que Manuel Vicente era suspeito de ter comprado um apartamento de luxo no Estoril para branquear dinheiro.

O adiamento relaciona-se com o facto de o trio de juízes do tribunal central criminal de Lisboa encarregue do julgamento ter decidido modificar algumas partes dos factos que vêm imputados aos arguidos na acusação. Perante isto, os advogados de dois dos arguidos pediram um prazo para reagirem, que não deverá ultrapassar os dez dias.

Em causa está, entre outras coisas, o crime de branqueamento de capitais alegadamente cometido por Orlando Figueira. Os juízes querem que seja também inscrita na acusação a alínea do Código Penal que remete para os locais onde a lavagem de dinheiro possa ter tido lugar. Segundo a lei, sujeita-se a uma pena de prisão entre dois e 12 anos quem “ocultar ou dissimular a verdadeira natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou titularidade” do dinheiro ilícito. Ora o ex-procurador sempre negou o recebimento de luvas, mas confessou ao mesmo tempo ter aberto uma conta bancária em Andorra para que o seu alegado patrão, o banqueiro angolano Carlos José da Silva, do Banco Privado Atlântico, pudesse escapar ao pagamento de impostos sobre o seu salário.

Orlando Figueira saiu do Departamento Central de Investigação e Acção Penal em 2012 para ir trabalhar para o BCP, banco que tinha entre os seus accionistas a Sonangol, petrolífera dirigida por Manuel Vicente antes de este ir para o Governo. O Ministério Público defende que este emprego correspondia na verdade ao pagamento de luvas – tal como o dinheiro que lhe foi pago também a título de salários entre 2014 e 2015 por uma empresa do grupo Privado Atlântico, entidade à qual acabou por nunca prestar serviço nenhum. O arguido contou em tribunal que viajou várias vezes de carro até Andorra para ir levantar o dinheiro, que trazia consigo em notas de 500 euros, porque o patrão lhe tinha posto como condição de pagamento a utilização de um paraíso fiscal.

O magistrado entende que entretanto já resolveu o problema, uma vez que mais tarde regularizou a situação rectificando o IRS e pagando os impostos em falta.

O adiamento da decisão judicial desagradou a Orlando Figueira, que se proclama inocente e se queixa de ter a vida suspensa desde que foi detido, em Fevereiro de 2016. Depois de quatro meses na cadeia, em prisão preventiva, o magistrado esteve mais ano e meio em prisão domiciliária, proibido de contactar com praticamente toda a gente. Hoje em dia admite processar o Estado, caso venha a ser absolvido. As alterações introduzidas na acusação pelos juízes podem, porém, indiciar exactamente o contrário: que se preparam para condenar Orlando Figueira e os dois outros arguidos, alegados intermediários dos pagamentos. Nenhum dos advogados do processo admite, porém, que o significado da decisão dos magistrados seja esse.

Entre as alterações acrescentadas esta segunda-feira à versão dos factos apresentada pelo Ministério Público está também um empréstimo obrigacionista feito pela Sonagol ao Banco Privado Atlântico em 2011, no valor de 50 milhões de dólares. 

“Pensava que hoje ia ser o fim de um pesadelo e ainda não. Tenho a minha vida suspensa e por uma loucura e isto provoca danos irreparáveis na vida de uma pessoa”, disse Orlando Figueira à saída da sala de audiências.

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