As manhas dos dois últimos inquilinos de Belém

O país alarmado com tantos casos de justiça descansou: aqueles dois homens cumprimentaram-se. Uf, que descanso.

O atual não gosta do Palácio e troca-o por qualquer coisa que dê nas vistas. Anda por aí à procura de afetos. Tem essa queda. Por afeto ia ao Brasil com o dono disto tudo e pela mesma razão foi à Volta a Portugal em bicicleta, pois se falássemos de voltas ao país, bem, o homem já fez umas dezenas delas, tal é o afeto pelos portugueses. Está sempre em pé e em movimento, desde a nascença. Não há nada a fazer. O que ele quer é ar e o Palácio não lhe chega para os pulmões. Tem de sair. E largar afetos.

Há dias, o anterior, que se fechava no Palácio, caladinho que nem um rato, a escrever as memórias para que os vindouros soubessem quem por ali passou e que se não ria, tal o elevado sentido de Estado, largou uma castanholada que logo incomodou o atual. Como ele tem 20 anos de calo de governo e Presidência bem sabia que era o governo que nomeava a procuradora-geral, a outra sem geral está na SIC, dado o seu imenso saber.

E achou que a "gerigonça" fez uma coisa que ele não faria, o que ninguém era capaz de imaginar dadas as coisas que são como são. Carrancudo, atacou a "geringonça", a qual não lhe ligou a ponta de um cabelo.

Foi o atual que veio em tom solene, sim solene, dizer que há coisas que não se fazem, muito para além do que é admissível, como, por exemplo, um Presidente fazer comentários sobre outro, mesmo se o outro já foi.

Naturalmente que o ex-comentador, ao dizer o que disse, não comentava, não senhor, florentino, lançava uma farpa ao outro que jamais larga aquele peso de ser providencial que só se preocupa com as coisas de Estado, tal a sua envergadura.

Uma figura assim da estirpe das luminárias e de inteligência rara logo que soube do convite para a inauguração da nova Universidade Nova em Carcavelos, telefonou a dizer que ia, mas saía às dezanove e trinta e um minutos para ir ao jantar do neto que sendo neto de quem é, não se sabe o que poderá vir a ser, e daí nem mais um minuto porque o aniversário do anterior não se compara com a bagatela de um discurso de um Presidente da República. E saiu direitinho ao neto, que não aceitava esperar pelo avô quinze ou vinte minutos porque naquela família os Presidentes não contam, só os ex.

Notável sentido de Estado, próprio de quem andou 20 anos no topo das instituições e aprendeu a comportar-se com a elevação máxima.

Há quem diga que estava muito zangado com a não recondução de Joana M. Vidal e quis dizer ao país o que ninguém tinha tido a coragem de dizer, pois, como se sabe, desde o CDS ao PSD, todos amocharam e ele, o velho rebelde, quis mostrar a sua indignação. Diz-se que ele esperava que Joana Vidal levasse até às últimas consequências o caso do BPN e reabrisse o dos submarinos.

Só que o florentino resolveu voltar à sua arte de esgrimista e de cortesão para avançar com o elevado sentido de Estado e declarar solenemente que Cavaco e ele se cumprimentaram. Notável. Ninguém imaginava que seriam capazes de se cumprimentar por causa do sucedido. O país sossegou quando a mão direita de Cavaco encontrou a mão direita de Marcelo...

Há jornalistas que investigam o que as mãos disseram uma à outra, mas ao que parece não têm fontes na epiderme dos Presidentes. Nunca lhes passou pela cabeça este imbróglio. A Polícia Científica da PJ nega-se a colaborar. Se se cumprimentaram e o anterior deixou o atual a falar sozinho, qual é o problema, dizem.

O país alarmado com tantos casos de justiça descansou: aqueles dois homens cumprimentaram-se. Uf, que descanso.

O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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