“Caso pode ser usado para extinguir PJ Militar. Será um grande erro”

Ex-subdirector da Judiciária Militar considera que outras polícias não estão vocacionadas para investigação de crimes de caserna.

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LUSA/PAULO CUNHA

Especialista em Direito militar, o coronel na reserva Gil Prata não tem visto com bons olhos o desenrolar dos acontecimentos ligados ao furto de material militar em Tancos. E acha que a chamada Operação Húbris – termo grego que remete para o orgulho exagerado, e no âmbito da qual foi detido o director da Judiciária Militar, por suspeitas de ter ajudado a encobrir o ladrão das armas, granadas e explosivos ­– pode ter uma consequência: “Levar à extinção da Polícia Judiciária Militar”, ou à sua integração na Polícia Judiciária civil. Decisão que, a acontecer, seria “um grande erro”.

Porquê? “As outras polícias não estão vocacionadas para investigar este tipo de crimes”, argumenta Gil Prata, que entre 2004 e 2008 foi subdirector da Polícia Judiciária Militar. “A justiça militar é um instrumento da defesa nacional, e a natureza destes crimes relaciona-se com a segurança, a disciplina e a hierarquia militar”. A par de delitos mais comuns, como a corrupção ou o homicídio, o código de justiça militar considera ilícita a traição à pátria, a deserção ou os crimes “em aboletamento”.

“O militar que, em tempo de guerra, matar o dono da casa em que estiver aboletado ou que tenha sido requisitada para o serviço, ou alguma pessoa que nela habite, é punido com pena de prisão de 15 a 25 anos, salvo se das circunstâncias não resultar especial censurabilidade ou perversidade do agente”, refere uma das normas desse código. Se provocar aos seus hospedeiros “doença particularmente dolorosa ou permanente ou anomalia psíquica grave ou incurável” habilita-se a até 12 anos de cadeia.

O mesmo coronel explica que mesmo na Europa não há uma orientação comum sobre a existência de uma Polícia Judiciária especial para os crimes militares, como é o caso de Portugal: “Uns têm-na, outros não. É variável. O Brasil, por exemplo, tem também procuradores militares”.

Num artigo publicado em Novembro de 2017 no site Operacional, que se dedica às questões relacionadas com a defesa e as Forças Armadas, Gil Prata aponta o dedo às autoridades policiais e judiciárias – leia-se Polícia Judiciária civil – por terem tido informações de que “estava a ser preparado um assalto a instalações militares na região de Leiria para ser furtado material de guerra” e, apesar disso, “não terem comunicado tal suspeita às entidades militares e à Polícia Judiciária Militar”.

Dá um exemplo: “Ninguém imaginaria que fosse possível que, havendo indícios de um possível assalto a uma agência bancária em determinada região, essa entidade bancária não fosse informada dessa ameaça para poder incrementar um reforço de medidas de segurança”. Para este especialista, no caso de Tancos o Exército “terá sido vítima da falta de cooperação institucional que, dada a matéria em causa (material de guerra como elevada capacidade de destruição) nunca deveria acontecer”.

“Se o tratamento que mereceu este caso for exemplo do respeito dedicado à instituição militar por parte de instituições que têm o dever de prevenir o crime, então valha-nos Santa Bárbara, a padroeira da nossa artilharia”, conclui ex-subdirector da Judiciária.

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