Madeira recorre a assessoria financeira para renegociar dívida regional

Contrato será pago através de uma taxa de sucesso (success fee) e pode chegar aos 15 milhões de euros, caso resulte numa poupança de 400 milhões de euros nos próximos nove anos. PS-Madeira desconfia e quer TdC e PGR a analisar processo.

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gc Gregorio Cunha - colaborador

É mais um capítulo no diálogo entre Funchal e Lisboa sobre os juros do empréstimo de 1500 milhões de euros, que a região autónoma está a pagar ao Estado. O governo madeirense decidiu avançar para a contratação de uma assessoria financeira para renegociar a dívida regional e está disposto a pagar até 15 milhões de euros através de um contrato por ajuste directo.

A meta fixada pelo executivo de Miguel Albuquerque é materializar uma poupança real a rondar os 400 milhões de euros nos próximos nove anos. Isto, numa carteira de dívida que o governo estima em 4,2 mil milhões de euros.

“A empresa vencedora será paga através de uma success  fee, isto é, caber-lhe-á uma percentagem proporcional à taxa de sucesso que obtiver durante a operação e apenas se concretizar, efectivamente, uma poupança líquida para a região”, explica a vice-presidência do governo madeirense, que foi obrigado a justificar a operação depois do número “15 milhões de euros” ter saltado com estrondo para a opinião pública regional. O valor da taxa de sucesso, apressou-se a dizer em comunicado o gabinete do número dois do executivo madeirense, vai variar entre os 0% e os 4% face ao valor da poupança alcançada. Assim, os tais 15 milhões de euros só serão pagos se a empresa contratada atingir a taxa máxima de sucesso, os tais 400 milhões.

O vice de Albuquerque, Pedro Calado, adianta ainda que no processo serão consultadas “cinco entidades credenciadas”, sendo adjudicada a empresa que apresentar a proposta mais baixa. “Dada a elevada tecnicidade dos contratos a negociar com a banca nacional e internacional, o governo regional optou pela contratação de uma entidade externa, cujo know-how e carteira de clientes garanta o sucesso da operação”, justifica o gabinete de Calado, dizendo que a Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública — IGCP também recorre a assessoria externa nestes casos. “[A operação] não representa qualquer forma de aumento do nível de endividamento da região.”

As explicações não convenceram a oposição. O PS, através do líder da bancada parlamentar na Madeira, Victor Freitas, foi o mais crítico e vai remeter para a Procuradoria-Geral da República e para o Tribunal de Contas toda a documentação relacionada com o este contrato de ajuste directo. Os socialistas consideram “escandaloso” o montante previsto para a assessoria financeira e desconfiam que está em causa um “encapotado” refinanciamento da dívida regional. Victor Freitas duvida mesmo dos números apresentados. “Como é possível o vice-presidente afirmar que vai poupar 400 milhões de euros em nove anos?”, questiona ao PÚBLICO o deputado do PS-Madeira, acusando o executivo de querer dilatar prazos, atirando responsabilidades financeiras para governos futuros.

O executivo madeirense devolve as críticas. Acusa Victor Freitas de “manipular a opinião pública” e insiste que, como a operação está indexada a um success fee, é extemporâneo falar da despesa com a adjudicação directa. Pelo caminho aponta o dedo a Lisboa. O valor de 15 milhões de euros, quantifica o gabinete de Calado, seria a poupança anual, caso o Estado já tivesse acedido às “justas reivindicações” da região de renegociação da taxa de empréstimo contraído por altura do programa de ajustamento económico e financeiro.

No centro do diferendo está a taxa de juro de 3,375%, acrescida de um spread de 0,15%, que o Funchal está a pagar desde 2012, quando a região autónoma pediu ajuda financeira. Na altura, essa taxa estava alinhada com os custos do Estado. Seis anos depois, Portugal tem gasto menos para ir aos mercados, mas essa poupança, diz a Madeira, não se reflectiu no empréstimo à região autónoma.

marcio.berenguer@publico.pt

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