Rui Rio tem razões que algumas razões desconhecem

Não há líderes políticos sem estratégia. Nem sempre ela é inteligível ou inteligente, mas existe.

Há sete meses que Rui Rio é líder do PSD e ainda nos custa a perceber o que lhe vai na alma. Não que seja uma personagem totalmente inesperada ou cheia de surpresas, mas porque sai da normalidade a que a política nos habituou.

O esforço para compreender Rui Rio levou-me, nos últimos tempos, a conversas bem interessantes com sociais-democratas que lhe são próximos e a conclusões que nem sempre são compreensíveis para quem está a tentar ver a política pelo olhar de outra pessoa.

O líder do PSD acredita que está a fazer (quase) tudo bem. É possível que venha até a fazer alguns ajustes estratégicos mas, no essencial, não encontra erros crassos no caminho que o partido está a fazer desde o congresso de Fevereiro. Casos como o de Feliciano Barreiras Duarte ou o da difícil eleição de Fernando Negrão ou ainda o da bancada que votou à revelia do líder são vistos como mero ruído que não chegará às eleições.

Os seus indefectíveis entendem que a aproximação do PSD ao PS criou dificuldades à esquerda e acreditam que isso terá consequências eleitorais. Desde que Rio tomou posse, as relações entre os parceiros agudizaram-se e, num futuro próximo, vão obrigar PCP e BE a trabalhar junto do seu eleitorado para fidelizar o voto, o que impedirá o PS de ir buscar mais votos à esquerda nas eleições de 2019.

Essa luta por mais espaço eleitoral que se desencadeará entre PS, PCP e BE a seguir ao Orçamento, como prevê o núcleo duro de Rui Rio, vai beneficiar o PSD (é nisso que se acredita nas proximidades do líder), mas vai sobretudo dificultar a maioria absoluta do PS. Daqui se deduz que o PSD (ainda) não está a lutar para ganhar as legislativas.

Se não houvesse ruído de fundo, o líder do PSD conseguiria passar a mensagem de que as suas propostas são boas para o país e para os portugueses (como o caso da taxa de IRS a aplicar às mais-valias). Esta também é uma tese em que acredita a direcção do partido. A guerra aos críticos internos (e também à imprensa) é, por isso, uma tentativa de calar o ruído.

Rio acredita que o ambiente incendiário que existe no partido não existe no país e foi isso que o moveu a falar primeiro para dentro como quem diz, à moda de Jorge Coelho: “quem se mete com o PSD, leva (mesmo que seja do PSD)”. E é isso que o leva a dizer, sem hesitações: “Podem esperar sentados, porque vou cumprir o meu mandato até ao último minuto”.

Rui Rio é austero, íntegro e provavelmente um dos líderes mais autoritários que o PSD teve, mas quem está ao seu lado acha que a direita não desgosta disso, o que pode ajudar a cativar eleitores. Ninguém nega que lhe falta juventude, acção e inovação, mas valorizam-se outros atributos: “o sentido de responsabilidade” (do qual tentou dar provas ao assinar acordos com o Governo) e “a integridade à prova de bala” (imagem a que nem todos os políticos se conseguem colar).

As cúpulas do PSD acham que estão a trabalhar em dois tempos. O primeiro foi para criar dificuldades à “geringonça” e, pelo caminho, gerir os obstáculos que o próprio partido foi levantando. O segundo será para apresentar propostas mais concretas, o que não acontecerá antes do Orçamento do Estado, mas sim no início do ano, quando o país começar a visualizar o calendário eleitoral.

O que estas conversas me recordaram é que não há líderes políticos sem estratégia. Nem sempre ela é inteligível ou inteligente, mas existe. Estamos habituados a que seja posta em prática para ganhar eleições no curto prazo, mas pode não ser. A estratégia de um líder pode ser delineada para salvar o país da bancarrota, virada para fazer dele o melhor primeiro-ministro da História ou para pôr uma “geringonça” que repõe rendimentos a funcionar. Às vezes parece apenas navegação à vista. 

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