Um quarto das escolas públicas não faz reutilização dos manuais

Secretária de Estado Adjunta e da Educação diz que um quarto das escolas “está a 0% de reutilização”. Este ano lectivo foram reutilizados 110 mil livros.

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Alexandra Leitão diz que os números "não são excelentes, mas são uma evolução importante" Nuno Ferreira Santos

As escolas públicas do 1.º ciclo do básico reutilizam para este ano lectivo 10% dos manuais escolares oferecidos pelo Governo no ano passado. Isto corresponde a uma poupança de 1,2 milhões de euros e a 110 mil livros.

Os números são oficiais e, segundo Alexandra Leitão, a secretária de Estado Adjunta e da Educação que desde 2016 conduz e luta pela nova política de reutilização, "45 mil crianças do 1.º ciclo têm pelo menos um manual reutilizado".

Estes números são "bonzinhos", diz a secretária de Estado Adjunta. "Não são excelentes, mas são uma evolução importante face ao ano passado e face aos anos em que ainda não há gratuitidade. É mau porque é pouco, mas é bom quando comparamos com os 4% de manuais reutilizados nos anos em que não há reutilização promovida pelo ministério."

Para Alexandra Leitão, esta diferença mostra o impacto positivo da nova política. "Os primeiros quatro anos do básico são os anos em que os manuais não estão preparados para serem reutilizados, pois têm muitos espaços em branco, e em que os miúdos são pequenos. Não tenho dúvidas de que no ano lectivo de 2019/20, quando já tivermos as devoluções dos livros do 5.º ao 6.º ano, a medida vai ter um impacto muito elevado."

Feito o balanço, no 3.º e 4.º anos do ensino básico há o dobro de livros reutilizados quando comparados com os do 1.º e 2.º. "Dos 110 mil livros reutilizados este ano, 40 mil são manuais do 4.º ano", diz Alexandra Leitão. "Os miúdos são maiores e têm mais capacidade para tratar bem os livros. No 3.º e 4.º anos, 20% das crianças têm pelo menos um livro reutilizado. Não sendo excelente, é animador."

Estudando a distribuição das taxas de reutilização por escola, o Governo conclui que o empenho das escolas é decisivo. "Temos escolas que fizeram 30% de reutilização, 40% e até 70%. E temos uma panóplia de escolas a 0%. Isso faz baixar muito a média nacional. O que é que isto significa? Que há escolas que nem tentaram. Não tem nada a ver com os meninos, porque há escolas com 30% de reutilização em contextos sócio-económicos muito diferentes e algumas difíceis. Pegamos no Excel e vemos: 30%, 25%, 40%, 30%... E depois 0%, 0%, 0%, 0%, 0%, 0%, 0%, 0%. O que é que isto diz? Diz que a reutilização é possível. Os 40% dizem que é possível e os 0% dizem que não se tentou."

Nos cerca de 800 agrupamentos escolares de Portugal, "algumas centenas fizeram 0% de reutilização". Quantos? "Das cinco mil escolas, não é injusto dizer que um quarto está a 0% de reutilização. Se víssemos que todas as escolas estão nos 9%, 10%, 11% ou 12% era uma coisa. Diríamos: 'É onde chega.' Mas não é isso. Há muitas com bons números e muitas a zero. Não falo dos que reutilizam 70%, porque esse número poderá resultar de um esforço muito grande dessa escola ou do facto de a escola ter poucos alunos. Mas há escolas — como a Escola Básica José Ruy, na Reboleira, Amadora, que fez 70% de reutilização no 1.º ciclo, ou a Escola Básica n.º4, em Camarate, Loures, que fez 20%, a Escola Básica São João de Deus, em Lisboa, que fez 25% ou a Escola Básica de Seixo Alvo, em Vila Nova de Gaia, com 22% de reutilização.”

Passados de mão em mão

Em cinco anos, a secretária de Estado imagina um país onde os manuais escolares "passam de mão em mão no fim do ano e no dia-a-dia ficam na escola e nos quais os alunos não escrevem porque fazem os trabalhos nos livros de fichas e não nos manuais". Vai demorar, mas "vai fazer o seu curso". Na sua defesa da medida, Alexandra Leitão sublinha que para a política de gratuitidade ser "orçamentalmente sustentável" — no ano passado foram investidos cerca de 10 milhões de euros — e para que haja "respeito pelo livro e pelo ambiente", todos têm que trabalhar.

"As escolas têm que empenhar-se e os pais não devem usar os vouchers quando têm livros usados dos irmãos mais velhos só porque 'é o Estado que dá'. Reutilizar dá trabalho. Uma coisa é um professor dizer 'toma o livro', outra é dizer 'estima-o, não o risques, devolve'. Dá algum trabalho e implica que se vá criando esta nova mentalidade.”

Na sua avaliação, o 2.º e o 3.º ciclos "vão entrar em velocidade de cruzeiro e vão fazer reutilização com níveis muito altos, senão mesmo a reutilização plena". A secretária de Estado diz mesmo ter "grandes expectativas para o ano que começou agora, porque já vamos ter a medida a ser aplicada no 5.º e no 6.º". E arrisca uma previsão: "Para o ano, espero poder dizer que de 10% de reutilização passámos para 20% ou 30% e que no 5.º e 6.º anos passámos para 80% de reutilização."

Reutilização vai ser de 90%?

Dá o exemplo de uma escola em Loures, em São João da Talha, que este ano teve 17% de reutilização no 1.º ciclo, mas cujo director antecipa que, agora que se avançou para o 2.º ciclo, a reutilização vai ser de 90%. "Eles sabem que os alunos deixam os manuais impecáveis." Já no secundário será mais difícil. "Com a pressão do exame do 12.º e o facto de o exame abarcar três anos de escolaridade, penso que vamos ter alguma dificuldade. Os alunos querem consultar os livros. Temos de estudar como vamos fazer."

Sobre os vouchers (atribuídos através da plataforma informática Mega para garantir manuais gratuitos aos alunos do primeiro ao sexto anos) a secretária de Estado diz que não há "bloqueios" nem problemas graves e que foram emitidos vouchers para 520 mil alunos (3,5 milhões de vouchers). Há casos, diz, em que os pais poderão ter ido encomendar os livros com o voucher quando a livraria não os tinha em stock (e teve de encomendar). "Isso acontece com ou sem voucher", sublinha.

Da nova política, identifica o que correu bem e o que correu mal com a plataforma e o sistema de vouchers: "Alivia as escolas, alivia os pais, permite às pequenas livrarias reentrarem no mercado dos manuais e é um sistema descentralizado.” O que correu mal: "A divulgação devia ter sido feita mais cedo pelo Governo e ainda falta literacia digital. Estes problemas foram agudizados este ano por causa de uma questão conjuntural: tivemos seis semanas de greve entre Junho e fim de Julho e o nosso enfoque nesse longo período foi avaliar os alunos. Conseguiu-se, mas houve trabalho de preparação que podia ter sido feito em Junho e que foi feito mais tarde. Não é por os professores estarem em greve, porque isto não é trabalho dos professores, mas porque ao não fazer-se um passo da avaliação permitindo avançar para a seguinte, atrasámos as fases seguintes. Não tem juízo de valor. É apenas um facto, mas temos de dizer que exigiu mais das escolas."

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