Acusadora de Kavanaugh pede investigação do FBI antes de depor no Senado

Christine Blasey Ford, professora universitária na Califórnia, é alvo de “perseguição violenta e de ameaças de morte” após ter revelado que é a autora da carta onde acusa o candidato de Trump ao Supremo de abuso sexual.

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Brett Kavanaugh, candidato ao Supremo Tribunal, nega todas as acusações. Reuters/Joshua Roberts

A mulher que acusou Brett Kavanaugh, o candidato do Presidente Donald Trump ao Supremo Tribunal, de tentativa de violação, solicitou que o caso seja investigado pelo FBI antes de testemunhar no Senado. A audiência está agendada para a próxima segunda-feira.

Através de um comunicado enviado esta terça-feira ao presidente do comité judicial do Senado, Charles Grassley, as advogadas de Christine Blasey Ford disseram que esta “se mostra disponível a colaborar com a comissão”, mas que “uma investigação do FBI asseguraria que os factos cruciais e as testemunhas seriam avaliados de forma imparcial”.

Na carta, as advogadas de Ford, Debra Katz e Lisa Banks, denunciam que “nas 36 horas após o seu nome se ter tornado público, Ford foi vítima de perseguição violenta e até de ameaças de morte”, o que fez com que a sua família fosse obrigada a mudar de casa e ficasse com a vida "virada do avesso". Os dados pessoais que constavam da sua página da Universidade de Palo Alto, onde é professora, foram também removidos, depois de o seu email ter sido alvo de intrusão informática. Isto apesar de, como referem as advogadas, Ford também ter sido alvo de manifestações de solidariedade, como é o caso da carta assinada por 24 mulheres que foram suas colegas na Escola Holton-Arms, e que foi enviada ao Congresso.

As advogadas mostraram-se também preocupadas com os possíveis efeitos traumáticos de uma deposição perante o Senado, já que está planeada “uma audiência pública em que [Ford] testemunhará na mesma mesa que o juiz Kavanaugh, em frente a duas dezenas de senadores americanos, na televisão nacional, perante perguntas de senadores que parecem estar convencidos de que [Ford] está ‘enganada’ ou ‘baralhada’”. Em declarações à CNN, Banks afirmou que “[Ford] não está preparada para testemunhar na segunda-feira”, e que não existem razões para apressar a audiência. 

Ao mesmo canal de televisão, um amigo próximo de Ford, Jim Gensheimer, disse que a alegada tentativa de violação teve “um impacto duradouro” na vida da professora, que agora corre o risco de reviver o trauma perante as câmaras de televisão.

A senadora democrata e membro do comité judicial Dianne Feinstein, que alertou as autoridades federais quanto à existência da carta (inicialmente anónima) onde Kavanaugh é denunciado, declarou em comunicado concordar plenamente que um "processo apressado para convocar uma audiência é injusto”. Feinstein comparou o presente caso ao de Anita Hill, a professora universitária que acusou o juiz Clarence Thomas de abuso sexual, durante o seu processo de nomeação para o Supremo, em 1991. O Senado não aceitou chamar testemunhas favoráveis a Hill, a denúncia não evitou a nomeação de Thomas e a acusadora acabaria por ser alvo de uma campanha difamatória. No Twitter, a senadora da Califórnia afirmou ainda ter sempre acreditado em Ford, que “sabia que este caso teria um grande impacto na sua vida, e foi muito corajosa ao denunciá-lo publicamente”.

O presidente da comissão, Charles Grassley, respondeu esta quarta-feira em comunicado que uma hipotética investigação por parte do FBI não teria qualquer relevância para o testemunho de Ford, e que esta deve depor apenas sobre o que diz saber e recordar em relação ao incidente em que Kavanaugh é acusado, "não havendo razão para mais demora”. Grassley afirmou ainda ter oferecido a Ford “uma audiência privada ou pública, bem como entrevistas realizadas por membros do staff”, mas que a convocação para a audiência da próxima segunda-feira se mantém.

O senador Lindsey Graham, do Partido Republicano, declarou à Fox News que “se [Ford] não quiser estar presente na segunda-feira, quer em público ou em privado", os senadores devem seguir em frente e votar a nomeação de Kavanaugh para o Supremo.

Por sua vez, o FBI emitiu um comunicado na segunda-feira à noite no qual declara que o seu papel é verificar os antecedentes dos candidatos a todos os mais altos postos governamentais, de modo a determinar se estes constituem uma ameaça à segurança nacional, e não apurar a credibilidade ou veracidade de uma acusação.

Trump defende inocência de "uma pessoa incrível"

O Presidente Donald Trump continua a defender o seu candidato ao Supremo. Esta terça-feira, o chefe de Estado afirmou numa conferência de imprensa sentir-se “terrivelmente mal” pelo juiz e pela sua família. “Ele é uma pessoa incrível. Não merece isto. Esta questão devia ter sido levantada há muito tempo – há três meses”. Trump acusou os democratas de terem omitido a existência da carta e de Ford para fazer uma gestão política do caso e maximizar o seu impacto contra o Presidente, mas Feinstein garantiu no comunicado desta terça-feira que “a decisão de revelar a sua identidade ou não esteve sempre nas mãos de [Ford]”.

O Presidente também se manifestou no Twitter, onde alertou “os eleitores republicanos, e outros" para estarem atentos ao que diz ser o "manual de truques" dos democratas em período pré-eleitoral — os norte-americanos votam nas intercalares a 6 de Novembro.

Trump acrescentou ainda que deseja que Ford testemunhe, bem como Kavanaugh, afirmando que os representantes do Senado acabarão por votar a nomeação do seu candidato ao Supremo olhando "para a carreira [de Kavanaugh]" e tendo "em conta o que [Ford] dirá quanto há 36 anos".

"E veremos o que acontecerá”, disse.

As alegações de Ford remontam a uma festa, quando esta tinha 15 anos e Kavanaugh 17, ocorrida em 1982. A agora professora universitária conta que Kavanaugh e um amigo, Mark Judge, já embriagados, a seguiram e empurraram para dentro de um dos quartos da casa, atirando-a para cima da cama. Segundo Ford, Kavanaugh pôs-se em cima dela, apalpou-a e esfregou-se contra o seu corpo, enquanto tapava a sua boca. Em declarações ao Washington Post, Ford confessou ter receio que o actual candidato ao Supremo a pudesse matar “inadvertidamente”.

Kavanaugh já negou as alegações de abuso sexual várias vezes, garantindo em comunicado “não o ter cometido nem no secundário, nem nunca”.

Judge afirmou na terça-feira, numa carta dirigida a Grassley através dos seus representantes legais, “não ter memória do alegado incidente”, e que nunca viu Kavanaugh agir da forma como Ford descreve.

Texto editado por Pedro Guerreiro

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