Os Emmys foram um jogo Netflix contra HBO... e no fim ganhou A Guerra dos Tronos

Uma noite marcada por um pedido de casamento em palco: os Emmys deram 23 prémios a cada um dos dois grandes "canais" concorrentes e foram um espectáculo entre o poder do blockbuster dos dragões e o poder da comédia feminina da Amazon The Marvelous Mrs. Maisel. Veja a lista dos principais vencedores.

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O elenco de "A Guerra dos Tronos", principal vencedor da noite dos Emmys
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George R.R. Martin, o autor dos livros que deram origem aos 45 Emmys de A Guerra dos Tronos MIKE BLAKE/Reuters
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Parte da equipa de O Assassinato de Versace NINA PROMMER/EPA
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Amy Sherman-Palladino e a equipa de The Marvelous Mrs. Maisel NINA PROMMER/EPA

A noite dos Emmys saldou-se com mais uma vitória de A Guerra dos Tronos e a distinção unânime da comédia da Amazon The Marvelous Mrs. Maisel nas principais categorias – e o que é que isso diz sobre a televisão hoje? Que depois de, em 2017, o streaming ter conquistado o primeiro Emmy de melhor série dramática com The Handmaid’s Tale, fenómeno semelhante se produziu este ano na comédia. E diz-nos que a revolução Netflix já está no mesmo patamar que o modelo de distribuição convencional e conseguiu, nesta 70.ª edição dos Emmys, tantos prémios quanto a suspeita do costume há 17 anos, a HBO. Mas sobretudo confirma que na televisão ninguém pára os blockbusters: mesmo não estando há mais de um ano no ar, a fantasia de dragões e gelo criada a partir dos livros de George R. R. Martin foi a mais premiada.

A cerimónia dos Emmys que decorreu na madrugada desta terça-feira em Los Angeles não foi uma noite de grandes afirmações sobre o estado da arte nem sobre os muitos temas que trespassaram este pequeno grande meio. E não por falta de tentativas, mas lá iremos.

A Academia de Artes e Ciências Cinematográficas Televisivas rematou uma noite longa com a entrega do Emmy de Melhor Drama à série A Guerra dos Tronos (HBO/SyFy/TVSéries), cuja ausência no ano passado (dada a sua tardia data de estreia) permitiu em parte a vitória de The Handmaid’s Tale (Hulu/Nos Play), que era também a sua mais forte concorrente em 2018. Também distinguiu Peter Dinklage como actor secundário na mesma série – o prémio para melhor actriz secundária numa série dramática foi para Thandie Newton, pela sua prestação em Westworld (HBO/TVSéries). O melhor actor dramático foi Matthew Rhys pela última temporada de The Americans (FX/Fox Crime), série que também recebeu o prémio de argumento mas que viu Keri Russell perder para Claire Foy, que no seu último ano como rainha em The Crown foi premiada como melhor actriz dramática. A real série Netflix foi também distinguida pela realização de Stephen Daldry.

A comédia foi uma das duas secções dos Emmys em que a dispersão da noite teve a sua excepção, com The Marvelous Mrs. Maisel a dar o prémio de melhor série à Amazon, de melhor actriz a Rachel Bresnahan, de melhor actriz secundária a Alex Borstein e de melhor argumento e realização a Amy Sherman-Palladino. A autora da popular Gilmore Girls tornou-se assim na primeira mulher a acumular esses dois Emmys. Bill Hader e Henry Winkler venceram respectivamente como protagonista e actor secundário da nova série Barry (HBO/TVSéries). A outra categoria que viu os prémios concentrarem-se foi a de série limitada, com a favorita American Crime Story: O Assassinato de Versace (FX/Fox Life) a ser distinguida pelo protagonista Darren Criss e pelo realizador Ryan Murphy, que subiria ao palco perto do fim da cerimónia também para recolher o Emmy de Melhor Série Limitada – batendo Genius: Picasso (National Geographic), Godless (Netflix), esta consolada pelos prémios de actuação para Jeff Daniels e Merritt Wever, e outras séries ainda por estrear em Portugal.

Contra o favoritismo de Laura Dern pelo filme The Tale (HBO/TVCine), Regina King recebeu o prémio para a actuação de uma actriz numa série limitada, por Seven Seconds, também Netflix. O serviço de streaming receberia ainda o prémio de escrita por Black Mirror, pelo episódio USS Callister, batendo, entre outros, David Lynch e Mark Frost por Twin Peaks. Last Week Tonight, de John Oliver (HBO/RTP3), bateu Trevor Noah ou Stephen Colbert, e Saturday Night Live foi a melhor série de variedades.

Mas, posto tudo isto, um dos pontos altos da cerimónia foi mesmo o pedido de casamento do realizador Glenn Weiss, que dirigiu os últimos Óscares e aproveitou o seu Emmy para surpreender a namorada e mergulhar uma plateia de estrelas em ovação e lágrimas, gerar uma leva de alertas noticiosos e pôr o Twitter em alvoroço romântico. “O melhor momento da noite”, para o Guardian, suplantou em parte os momentos criados pela Academia e pelos anfitriões da cerimónia, Colin Jost e Michael Che, para serem memoráveis. E distraiu momentaneamente o grande público do que fica no fim do fogo-de-artifício que enfeitou o número musical de abertura – as contas e os jogos de poder entre canais e produtores, mas também o futuro da televisão. “Com os contributos espantosos das pessoas nesta sala, podemos manter a televisão durante uns cinco, seis anos no máximo”, brincava Colin Jost.

A sombra do dragão

Os Emmys são os prémios mais importantes da televisão norte-americana, mas também uma cerimónia e uma academia que lutam contra o desfasamento – entre o meio televisivo, as suas audiências e as novas plataformas, entre as séries nomeadas e/ou premiadas e sua popularidade ou valorização crítica. Já lhes foi apontada falta de frescura, pela omissão dos produtos mais disruptivos (este ano, por exemplo, não houve grandes nomeações para Twin Peaks nem vitórias para Atlanta, por exemplo), e já foram pretexto para um estudo do Katz Media Group que, em 2017, o ano de The Handmaid’s Tale, concluía que a maioria dos americanos nunca tinha visto ou sequer ouvido falar de grande parte das séries nomeadas, devido à ausência de séries dos canais generalistas nesse panteão (a excepção este ano foi This is Us mas Uma Família Muito Moderna ou A Teoria do Big Bang não constaram da lista).

Os prémios da indústria televisiva constituem, no fundo, um espelho polido da situação actual da televisão, e é aí que entra A Guerra dos Tronos, a série que, sendo da televisão por subscrição, e ainda por cima premium, é um arrasador fenómeno de massas que mal voltou a entrar na corrida levou os prémios que pertenceram à dura série The Handmaid's Tale no primeiro ano de presidência Trump e três semanas antes da eclosão do movimento MeToo. Foi em parte sob as suas sombras que decorreu uma noite partilhada com “as muitas pessoas talentosas e criativas que ainda não foram apanhadas”, como brincou o apresentador Michael Che no número inicial da cerimónia, e com os “milhares na audiência e com as centenas em casa”, como resumiu o outro apresentador, Colin Jost.

A sombra do dragão parecia tímida, só com dois grandes prémios, mas a noite terminou mesmo como o célebre aforismo do futebol segundo o qual são 11 contra 11, mas no fim ganha sempre a eficaz máquina da Alemanha – neste caso, a eficaz máquina de A Guerra dos Tronos, que em 2019 chegará ao fim depois de anos de domínio, e que com 45 Emmys já é a série mais premiada de sempre. Com os seus nove prémios em 2018 (as contas finais incluem também os Emmys atribuídos na cerimónia prévia Creative Arts), permitiu em parte que as contas continuassem equilibradas para a HBO – ou empatadas.

A histórica casa de Os Sopranos ou The Wire e a nova morada online de Black Mirror ou The Crown receberam 23 Emmys cada depois de, pela primeira vez na história, o Netflix ter tido mais nomeações para os Emmys (112) do que a HBO (108). A Amazon levou mais oito prémios, todos de The Marvelous Mrs. Maisel (cinco na cerimónia desta noite e mais três nos Creative Arts), para o campo do streaming, a que se juntaram os quatro do Hulu, somando um total de 35 distinções para estes novos grandes produtores de TV que tanto investem – é célebre a revelação de que o Netflix gastará 6800 milhões de euros em conteúdos contra os dois mil milhões de um canal incumbente como a HBO. A NBC foi a terceira estrutura mais premiada, com 16 Emmys.

Nos últimos dias, escreveu a imprensa especializada, as festas dos Emmys e os mais de cem eventos de promoção para a cerimónia foram dominadas pelas conversas sobre as mudanças no sector, desde as grandes fusões Disney-Fox até às consequências do vendaval de denúncias de casos de assédio, como a saída do poderoso Les Moonves da presidência do canal generalista CBS. Mas na cerimónia propriamente dita os temas foram outros – a ausência de referências directas ao Presidente dos EUA, as mensagens sobre género e a comunidade LGBTQ de Ryan Murphy, e sobretudo a diversidade. Celebrou-se o grupo de nomeados mais diversificado de sempre – “estamos um passo mais perto de um Sheldon negro”, brincaria Kenan Thompson no número musical que dividiu com Kate McKinnon, Kristen Bell e Titus Burgess, entre outros –, e constatou-se que isso é uma trémula vitória – “vêem, não havia nenhuma e agora há uma”, diriam sobre a primeira nomeação para uma actriz de origem asiática no drama, para Sandra Oh, por Killing Eve (BBC America).

Os prémios nas principais categorias (vencedores a negrito)

Melhor série dramática

Melhor actor numa série dramática

Melhor actriz numa série dramática

Melhor actor secundário numa série dramática

Melhor actriz secundária numa série dramática

Melhor série de comédia

Melhor actor numa série de comédia

  • Donald Glover - Atlanta
  • William H. Macy - Shameless
  • Bill Hader - Barry
  • Ted Danson - The Good Place
  • Larry David - Curb Your Enthusiasm
  • Anthony Anderson - Black-ish

Melhor actriz numa série de comédia

Melhor actor secundário numa série de comédia

Melhor actriz secundária numa série de comédia

Melhor série limitada

Melhor actor num telefilme ou série limitada

Melhor actriz num telefilme ou série limitada

  • Laura Dern - The Tale
  • Jessica Biel - The Sinner
  • Michelle Dockery - Godless
  • Sarah Paulson - American Horror Story: Cult
  • Edie Falco - Law & Order True Crime: The Menendez Murders
  • Regina King - Seven Seconds

Melhor actor secundário num telefilme ou série limitada

Melhor actriz secundária num telefilme ou série limitada

Melhor série de variedades – talk show

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