As palavras baratas

As palavras mítico, lendário e icónico foram tão abusadas durante tanto tempo que precisam de ser deixadas em paz durante umas décadas.

No século XX os adjectivos mítico, lendário e icónico foram banalizados por publicitários americanos à procura de palavras aparentemente difíceis para impressionar públicos incultos que acham que são sinónimos de "muito bom" e "universalmente reconhecidos como muito bom".

Mítico e lendário referem-se a criaturas e coisas que, por definição, não existem. Os mitos e as lendas são ficções. Dizer que uma cervejaria é mítica só faz sentido se essa cervejaria nunca existiu. Dizer que é lendária obriga a contar a lenda em que essa cervejaria figura.

Icónico significa representativo. O ícon representa uma criatura maior, abstracta e difícil de representar. O ícon é um pobre substituto. Enfim, não é bom ser icónico e ser mítico ou lendário é não existir.

As palavras mítico, lendário e icónico foram tão abusadas durante tanto tempo que precisam de ser deixadas em paz durante umas décadas. Em vez delas usem-se palavras mais claras como famoso, conhecido, popular, tradicional, original, consensual, reconhecido, antigo, vanguardista, elogiado, representativo e típico.

Em Portugal abusa-se agora do "e não só". É o etcetera etcetera do século XXI, um tique de preguiça.

Outra fórmula insuportável é o "dispensa apresentações". É como o "não há palavras" e o "o que é que ainda não foi dito sobre Cristiano Ronaldo?"

Nauseabundo é também o "sem esquecer os inevitáveis". Fala-se da cervejaria lendária, dos icónicos pregos, das míticas mariscadas e da lendárias imperiais sem esquecer os inevitáveis tremoços.

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