No EVOA, já se podem ver as aves a partir de um carro eléctrico

Fundo Ambiental permitiu a compra de um veículo que não produz emissões nem faz ruído para não afugentar as aves. Há também 66 painéis solares que permitem que o centro interpretativo do EVOA seja auto-suficiente em termos energéticos.

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Para lá chegar, é preciso percorrer mais de uma dezena de quilómetros por uma estrada de terra batida que rasga campos de arrozais e onde, de quando em vez, as aves que por ali voam passam a rasar o tejadilho do carro. 

À chegada, dá-se de caras com uma construção inspirada nos caniços — uma vegetação muito presente na área e que é também utilizada pelas aves para fazerem ninho — e que serve de sede do EVOA – Espaço de Visitação e Observação de Aves, e se encaixa na Reserva Natural do Estuário do Tejo, a mais importante zona húmida de Portugal e uma das dez mais importantes da Europa.

Partindo daquele centro, os binóculos vão ao pescoço, e apesar de serem uma ajuda, nem sempre são precisos para se avistarem centenas de aves que sobrevoam o estuário do Tejo, ou se aninham à beira da água junto de pequenas ilhas cobertas de vegetação.

Ali, onde o Tejo se encontra com o Sorraia, há 14 mil hectares de lezíria, que são um refúgio para mais de uma centena de espécies. Em Vila Franca de Xira, na parte sul da Companhia das Lezírias, há um espaço próprio para as observar, que é também um “local de sensibilização e introdução ao contacto com a natureza”, diz Sandra Silva, a coordenadora do EVOA.

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O espaço foi inaugurado em Dezembro de 2012 e abriu ao público a 7 de Abril do ano passado. Desde então recebeu mais de 28 mil visitas Sebastião Almeida

Todos os dias, excepto à segunda, Sandra guia um percurso com pouco mais de quatro quilómetros, em período de maré vazia, parando nos observatórios que estão pelo caminho para que se possam observar. Na maré cheia, visitam-se as três lagoas (a Principal, a Rasa e a Grande) que, em conjunto com os arrozais, a zona de salina e zona entre marés, constituem os principais habitats das mais de 200 espécies de aves que por ali aparecem e que nos períodos de passagem migratória podem chegar às 120 mil.

As aves do Tejo vivem ao ritmo das marés. São muito dependentes das marés do estuário, daí as visitas diárias serem próximas dos períodos de maré cheia ou da maré vazia. 

Num percurso pedestre, podem avistar-se flamingos, garças-brancas, pernilongos ou marrequinhas. Mas agora, o percurso pelos observatórios, que até ao final do ano passado era feito a pé, pode ser feito num carro eléctrico com 14 lugares e que permite a quem não tem tanta disponibilidade física para fazer o passeio a pé, como idosos e crianças, o possa agora fazer.

Dando a conhecer os valores naturais do Estuário do Tejo, e querendo que esta actividade seja inclusiva e acessível a todos, a missão passa também por manter a tranquilidade das aves e tornar este centro um modelo de auto-sustentabilidade. Para tal, além do carro eléctrico, que é silencioso e tem zero emissões, o centro conseguiu instalar uma mini central fotovoltaica e substituir os dois geradores que tinha —alimentados a combustíveis fósseis —, e que têm permitido ao centro ser auto-suficiente do ponto de vista energético. 

Estes investimentos foram possíveis porque o EVOA foi um dos 28 projectos apoiados pelo Fundo Ambiental, desenhado pelo Ministério do Ambiente e aprovado em Junho do ano passado, para ser uma “estratégia formal para a educação ambiental”, disse o ministro João Pedro Matos Fernandes, numa visita ao centro, na quarta-feira.

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No primeiro ano, o ministro do Ambiente disse que foram apoiados 28 projectos, num total de 1,5 milhões de euros, a que se juntam, já este ano, 53 projectos, envolvendo 1,9 milhões de euros em ideias que são da responsabilidade de Organizações Não-Governamentais, empresas públicas e privadas, ou das próprias autarquias. 

“Temos de criar uma nova cultura ambiental. E ela passa pela valorização do território, passa por descarbonizar a sociedade, passa por termos uma economia mais eficiente em recursos, mas sensibilizar as pessoas e levá-las a alterar comportamentos”, sustentou Matos Fernandes. 

Ainda dentro do centro de interpretação, além de uma vista privilegiada para a Lagoa Principal, há uma exposição que dá conhecer as riquezas naturais da Reserva Natural do Estuário do Tejo. Numa das paredes, um mapa dá a conhecer os destinos em várias partes da Europa por onde aves que foram anilhadas no EVOA já pousaram. “Isto poderá ajudar-nos a apoiar estratégias de conservação deste grupo de aves, uma vez que são espécies cinegéticas”, e estão debaixo do olho de caçadores. 

Agora, por exemplo, já é possível avistar íbis-pretos, espécie que até há uma década era muito rara naquela zona. E há até a desconfiança de que estejam já a nidificar ali no Tejo e no Sado, conta a bióloga. O EVOA tem também a decorrer um projecto que pretende que a águia-pesqueira volte a fazer ninho em Portugal. “É uma espécie que teve muitos problemas de conservação. O objectivo é que a águia-pesqueira se adapte a estas plataformas e passe a nidificar nelas”, explica Sandra. 

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O aeroporto do Montijo e as aves

Ali, as cores da paisagem também vão mudando. Já se começa a vislumbrar a vegetação mais avermelhada. Em pleno Outono, a paisagem pinta-se de “vermelho sangue”. É “uma área extraordinariamente sensível”, reconhece Matos Fernandes, e onde convivem as explorações agrícolas, com os valores ambientais. Uma área que, por isso, pode vir a ser afectada com a construção do novo aeroporto no Montijo. Questionado sobre o assunto, Matos Fernandes sustentou que essa foi uma das razões pela qual a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) rejeitou o primeiro estudo de impacto ambiental apresentado pela ANA - Aeroportos de Portugal. 

“Alguns dos descritores ambientais não tinham a robustez técnica e científica que era necessária para um projecto com esta dimensão”, explicou o ministro. Uma delas era precisamente a avifauna da Reserva Natural do Estuário do Tejo. É por isso que Matos Fernandes quer que seja avaliado com “muito, muito rigor o impacto que uma maior actividade aeronáutica naquele espaço pode ter sobre a avifauna”. 

Quem quiser visitar o centro pode fazê-lo sozinho, mas Sandra aconselha a que optem pelas visitas guiadas. O preço do bilhete (entre os seis e os 12 euros) é o mesmo. O principal público ainda são as escolas. Depois, são famílias que vão fazer a primeira observação de aves. “Este local funciona muito como local de sensibilização e introdução ao contacto com a natureza”, diz a bióloga. E há ainda um pequeno grupo de fotógrafos da natureza, nacionais e internacionais, cujas visitas são frequentes. 

Para já, o EVOA está a desenvolver um projecto com a Wetland Link International, que tem como objectivo “tornar os jovens ambientalmente mais activos, fazendo eles mesmos a monitorização do habitat”, explica Sandra, sendo para isso criada uma plataforma que poderá ser usada em toda a Europa para monitorizar alguns factores chave associados às alterações climáticas. 

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