Renúncia do cônjuge

A Lei n.º 48/2018, de 14 de agosto passou a reconhecer a possibilidade de renúncia recíproca dos cônjuges à condição de herdeiros legitimários um do outro.

No dia 1 de setembro de 2018, entrou em vigor a Lei n.º 48/2018, de 14 de agosto, nos termos da qual se passou a reconhecer a possibilidade de renúncia recíproca dos cônjuges à condição de herdeiros legitimários um do outro, renúncia esta que deverá ser feita na convenção antenupcial, nos termos da qual é, também, convencionado como regime de bens a vigorar na constância do matrimónio, o regime da separação de bens.

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No dia 1 de setembro de 2018, entrou em vigor a Lei n.º 48/2018, de 14 de agosto, nos termos da qual se passou a reconhecer a possibilidade de renúncia recíproca dos cônjuges à condição de herdeiros legitimários um do outro, renúncia esta que deverá ser feita na convenção antenupcial, nos termos da qual é, também, convencionado como regime de bens a vigorar na constância do matrimónio, o regime da separação de bens.

Refira-se que a renúncia pode ser condicionada à sobrevivência ou não de sucessíveis de qualquer classe (bem como de outras pessoas) não se exigindo que esta condição seja recíproca.

De todo o modo, a Lei n.º 48/2018 não desprotege completamente o cônjuge, pois permite que, em vida, o outro cônjuge lhe faça liberalidades (por meio de doações e legados) até à parte da herança que corresponderia à sua legítima, caso não tivesse renunciado à sua qualidade de herdeiro legitimário. Evidentemente, que poderá sempre acrescer o que vier a ser testado, em sede de quota disponível.

Pontualize-se, ainda, que o cônjuge sobrevivo que tenha renunciado à sua qualidade de herdeiro legitimário, se carecer de alimentos, não perde o direito aos mesmos, os quais serão prestados através dos bens da herança, nos termos previstos no artigo 2018.º do Código Civil. O cônjuge sobrevivo não perde, também, o direito às prestações sociais por morte.

Já no que respeita à casa de morada de família, a Lei n.º 48/2018 consagrou expressamente um regime de proteção ao cônjuge sobrevivo que tenha renunciado à qualidade de herdeiro legitimário, conferindo-lhe um direito real de habitação sobre a casa de morada de família se o imóvel em causa for da propriedade do cônjuge falecido. Este direito real de habitação perdurará pelo prazo de 5 anos, sendo que, se à data da abertura da sucessão, o cônjuge sobrevivo tiver 65 anos, este direito será vitalício.

Se à data da abertura da sucessão, o cônjuge sobrevivo não tiver 65 anos, mas caso se encontre numa situação de especial carência, pode o tribunal prorrogar este prazo de 5 anos de vigência do direito real de habitação e de uso do recheio.

Por outro lado, este direito real de habitação caduca caso o cônjuge sobrevivo não habite a casa por mais de um ano, ressalvando o legislador a situação em que tal ausência não lhe seja imputável.

Mais, tal direito real de habitação não será conferido ao cônjuge sobrevivo caso este seja proprietário de um imóvel sito no concelho da casa de morada de família ou neste ou nos concelhos limítrofes se a casa se situar nos concelhos de Lisboa ou do Porto.

Findo o prazo de vigência do direito real de habitação, o cônjuge sobrevivo poderá continuar a habitar no imóvel celebrando um contrato de arrendamento, devendo a renda ser fixada de acordo com as regras de mercado.

Por fim, durante o tempo em que habitar o imóvel e, em caso de alienação do mesmo, o cônjuge sobrevivo goza de direito de preferência.

Em suma, a nova Lei n.º 48/2018 permite a renúncia reciproca à qualidade de herdeiro legitimário do outro cônjuge, mas não deixa de consagrar um conjunto de direitos que permitem que o cônjuge sobrevivo goze de proteção jurídica em várias situações, nos termos supra expressos.

No entanto, não podemos deixar de salientar que a aplicação da lei, em determinados casos, poderá dar origem a situações complexas em que, por exemplo, filhos e enteados se tornem senhorios da mãe/madrasta ou do pai/padrasto, podendo até acontecer que tal se verifique, por exemplo, apenas quanto à quota-parte pertencente ao cônjuge falecido, numa situação em que a casa de morada de família tenha sido adquirida por ambos os cônjuges em regime de compropriedade atento o facto de os cônjuges terem (necessariamente) casado no regime da separação de bens, pelo que o que tenham adquirido após o casamento segue o regime da compropriedade.

São situações como estas que importa salientar com a crítica construtiva que a legislação sobre o tema nos merece.