Jovens médicos de família: 22% das vagas ficaram por preencher

Em Lisboa e Vale do Tejo vai ser possível dar médico de família a mais de 200 mil pessoas. Mas ainda há muitas unidades, tal como acontece no Alentejo, onde muitos utentes ficam a descoberto.

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Rui Gaudêncio

Mais de um quinto das vagas do último concurso aberto para a colocação de recém-especialistas em medicina geral e familiar ficaram por preencher por falta de interessados. São 86 lugares que ficam desertos em centros de saúde, do total de 378 no concurso lançado no final de Julho para jovens médicos de família.

Os lugares que ficaram desertos localizam-se basicamente em unidades de vários concelhos da região de Lisboa e Vale do Tejo (LVT), a que tem mais utentes a descoberto, e no Alentejo. 

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Estes médicos de família terminaram a especialidade este ano e concorreram agora a um lugar no Estado. No total, ficaram colocados 292 novos especialistas a nível nacional. 

O que se percebe, dos dados adiantados pela Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), é que algumas das unidades mais carenciadas não tiveram médicos interessados em ir para lá trabalhar. O caso mais gritante é o da Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados (UCSP) São Sebastião, em Setúbal, que tinha nove vagas a concurso e não conseguiu cativar um médico, sequer. Também as UCSP da Moita, de Olival, de Benavente e da Buraca, de Caneças e Famões e da Buraca não tiveram candidatos para os lugares disponíveis, segundo o mapa da ACSS.

No Alentejo, não foram ocupadas as vagas abertas na UCSP de Moura (dois postos de trabalho) e também ninguém escolheu as vagas disponibilizadas em Alcácer do Sal, Avis, Barrancos, Fronteira, Grândola, Mértola e Odemira. No total nesta região, dos 27 postos de trabalho a concurso, apenas foram ocupados nove. 

Este resultado final é bom ou mau? Depende da perspectiva. Apesar de admitir que há “dificuldades de fixação” de jovens médicos de família no Alentejo e em alguns concelhos da Administração Regional de Saúde (ARS) de LVT, o Ministério da Saúde sublinha “o grande impulso” observado em “concelhos de elevada densidade populacional”, dando o exemplo de Sintra.

Nota ainda que, nesta primeira fase do concurso, tanto a região Norte como o Centro se aproximaram da cobertura plena, “dando sinais de que o objectivo anunciado para esta legislatura [dar médico de família a todos os utentes inscritos] se pode alcançar”. No Norte, as 67 vagas foram todas ocupadas e, no Centro, apenas uma ficou por preencher.

O gabinete do ministro Adalberto Campos Fernandes destaca também o facto de “pelo segundo ano consecutivo, o Algarve [onde dois dos 27 lugares não foram ocupados] ter conseguido reter o maior número” de médicos de família.

“Isto é o que acontece todos os anos. É um problema abrir vagas assim”, contrapõe o presidente da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, Rui Nogueira, para quem um bom resultado seria conseguir ocupar pelo menos três centenas das vagas.

Lembrando que é provável que haja mais lugares a descoberto nos próximos dias, porque há profissionais que se candidatam mas mais tarde desistem, Rui Nogueira explica que a maior parte dos jovens médicos fizeram a especialidade no Norte e Centro e não querem ir trabalhar para longe de casa. “Quando acabam a especialidade, por volta dos 30 anos, muitos têm já família constituída e a vida organizada”, observa.

Discordando da estratégia da tutela, que “está a tentar forçar a ida de médicos do Norte e do Centro” para o Sul, o presidente da APMGF frisa que o problema de falta de médicos de família vai perdurar por "mais três ou quatro anos", uma vez que neste período haverá um pico de aposentações, acabando por deixar também mais tarde o Norte e o Centro com especialistas a menos.

Na associação está entretanto a germinar uma ideia que poderá vir a ser proposta à tutela em breve, revela. O objectivo é que os especialistas possam escolher o local para onde vão trabalhar num horizonte de três a quatro anos, disponibilizando-se transitoriamente a ocupar vagas em unidades carenciadas.

 "Um médico poderá escolher ir trabalhar para Cantanhede mais tarde, enquanto fica dois ou três anos na Amadora. Seria como se emigrasse”, exemplifica, frisando que o que cativa os jovens especialistas não é apenas ganhar mais dinheiro, mas sim ter condições de trabalho, nomeadamente poder exercer em unidades com equipas devidamente organizadas.

O balanço é “francamente positivo”, para o presidente da ARSLVT, Luís Pisco, porque vai ser possível, com as 130 vagas ocupadas nesta região, dar médico de família a mais de 200 mil utentes. Conseguiu-se não só reter praticamente todos os recém-especialistas (87 de um total de 89) formados na região como ainda cativar 43 jovens médicos formados noutras regiões (cerca de 50% a mais), frisa.

"As vagas por preencher eram de alguma forma expectáveis porque foram abertas muito mais vagas do que o número de especialistas formados na ARSLVT, algo que não aconteceu noutras regiões”, acrescenta.

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