O Carnide Clube pode respirar de alívio por mais dez anos

Esteve perto de perder a sede que ocupa há 90 anos, mas foi considerado estabelecimento de interesse para a cidade de Lisboa.

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Rui Gaudêncio
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No Largo do Coreto, em Carnide, Lisboa, há um prédio pintado de encarnado que esconde a história de um clube que já completou 90 anos. É provável que quem lá passa por acaso não preste muita atenção ao edifício ou repare sequer nas dezenas de taças que adornam as paredes do corredor de entrada.

Desde 1928 que o Carnide Clube aqui vive, funcionando como café, espaço de diversão e local de convívio para os sócios. Mas é sobretudo a sede de uma colectividade com mais de 700 atletas, mais de metade federados, que lá praticam basquetebol, futsal, karaté e taekwondo.

Quase centenário, o Carnide Clube esteve perto de ficar sem casa, pois o contrato de arrendamento, assinado há cinco anos, terminava no final deste mês e a senhoria já tinha avisado que não o ia renovar. Mas o clube viu a sua candidatura ao estatuto de “estabelecimento de interesse histórico, cultural ou social local” aceite pela Câmara de Lisboa, através de um despacho assinado por Fernando Medina há dois dias e esta quinta-feira publicado em Boletim Municipal. O que o salvou. 

Segundo a alteração à Lei das Rendas promovida no ano passado, esse estatuto traduz-se, na prática, numa impossibilidade de despejar o clube nos próximos dez anos, informação que consta no Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) que entrou em vigor a 15 de Junho de 2017. A lei protege também o clube no caso de a senhoria querer aumentar o valor da renda acima de 1/15 do valor em vigor para o espaço. No final desses dez anos, a senhoria poderá iniciar novo processo de actualização da renda.

“De qualquer forma não íamos abandonar o espaço, porque não tínhamos para onde ir. Mas este estatuto dá-nos um bocadinho mais de segurança, pelo menos durante alguns anos”, congratula-se Tânia Estronca, presidente do Carnide Clube.

“Está sempre presente a exigência para que a gente saia e por isso é um bocado difícil negociar nestas condições”, diz a dirigente, informando que tem estado sempre em contacto com a senhoria. Depois de saber que teriam de sair do espaço até ao final de Agosto, a direcção do clube procurou apoio junto do município e da junta de freguesia e foi daí que lhes veio a sugestão para se candidatarem ao estatuto que agora obtiveram. “Fomos vendo a nível jurídico o que podíamos fazer, além da candidatura, porque em 90 anos fizemos muitas obras financiadas por nós, incluindo o campo e o ginásio”, diz Tânia Estronca.

O advogado da senhoria, Miguel de Almada, explica que “há cinco anos, quando foi assinado o contrato actual, a vontade inicial era aumentar a renda porque é um espaço enorme no centro de Carnide.” Na ocasião, diz, as duas partes acabaram por chegar à conclusão que o clube não conseguia suportar uma renda muito mais alta. “Foi feito um acordo de parte a parte para que o valor da renda se fixasse nos 250 euros mensais e ficou acordado que também fariam obras leves e necessárias a requalificar o espaço”, acrescenta o representante da senhoria.

Apesar de estar no edifício desde 1928, só em 2013 é que foi assinado o primeiro contrato de arrendamento -- até aí havia apenas um acordo verbal. Miguel de Almada garante que não é a intenção da proprietária correr com o clube à força ou fazer cessar as suas actividades no espaço. “Há aqui vários interesses em presença e o que nós queremos é encontrar uma solução equilibrada, porque é um património da actual proprietária que há 90 anos está cedido ao clube e os proprietários têm todo o direito de equacionar qual a melhor solução ou melhor forma de o rentabilizar”.

“Gostaríamos que esta negociação fosse feita de mãos dadas com o clube e que fosse arranjada uma solução de parte a parte sem extremar posições”, afirma o representante da senhoria, apesar desta decisão da câmara municipal. “A certa altura o contacto não existiu mais da parte do Carnide Clube para negociar a saída. Nós chegámos a propor uma reunião esta semana, mas sem resposta”, acusa. A compra do espaço pelo clube nunca esteve em cima da mesa ou foi proposta por uma das partes, garante Miguel de Almada.

O despacho de Fernando Medina é saudado pela Junta de Freguesia de Carnide, que tinha pressionado a câmara municipal, participando na discussão pública e realçando que, caso o Carnide Clube tivesse de se mudar imediatamente, não haveria “outro espaço como solução imediata na freguesia”.

O presidente da junta, Fábio Martins Sousa, afirma que “era uma grande luta da população e do clube porque é um espaço muito significativo, quase centenário, e que está naquele local há noventa anos”. O autarca acrescenta que “o clube é quem organiza os santos populares de Carnide todos os anos, mesmo à frente da sede, no Largo do Coreto”.

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