Reformou-se Souto de Moura, o procurador-geral a quem chamavam "Gato Constipado"

Souto Moura vai fazer 68 anos. O escândalo da Casa Pia e o processo Freeport fizeram parte do seu mandato.

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Foi Eduardo Prado Coelho quem o baptizou como "Gato Constipado" Miguel Manso

Foi procurador-geral da República durante uma das maiores e mais polémicas investigações da justiça portuguesa, a do escândalo da Casa Pia, tendo estado várias vezes debaixo de fogo entre 2000 e 2006.

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Foi procurador-geral da República durante uma das maiores e mais polémicas investigações da justiça portuguesa, a do escândalo da Casa Pia, tendo estado várias vezes debaixo de fogo entre 2000 e 2006.

Quando se foi embora do Palácio Palmela, José Souto de Moura havia de admitir que tinha sentido várias vezes o seu lugar em perigo durante o escândalo dos abusadores de menores, devido a tentativas para o colocarem contra o então Presidente da República Jorge Sampaio. "Não digo que não me tivesse passado pela cabeça deixar o cargo, mas achei sempre que havia pessoas que mereciam que eu continuasse: além dos que trabalharam no processo, as vítimas e a directora da Casa Pia", revelou o magistrado numa entrevista ao Sol.

A caminho dos 68 anos e agora juiz, depois de uma carreira de procurador, Souto de Moura não voltará ao lugar que ocupou até agora no Supremo Tribunal de Justiça: jubilou-se este Verão, que é uma condição semelhante à reforma a que passam os magistrados, mas que implica poderem ainda ser chamados ao serviço.

“Desde 2010 que o podia ter feito”, disse ao PÚBLICO o magistrado, que se encontra de férias no Minho.

Dos seus planos não faz parte dar aulas, como sucede com algumas figuras do universo da justiça. “Tenho estantes de livros para ler”, antecipa, enumerando alguns compromissos profissionais que mantém: colaborar com a revista Brotéria, dos jesuítas, com a Associação de Juristas Católicos e com a Comunidade Vida e Paz. “E também tenho desenhos para fazer. Faço retratos”, revela Souto Moura, que tem neste momento quatro netos.

No próximo dia 20 falará sobre o segredo de justiça numa conferência no Tribunal de Sintra, e a 4 de Outubro dará uma palestra subordinada ao tema dos direitos humanos na comarca judicial de Santarém. Pelo meio ainda tem agendadas férias na Borgonha.

Foi o colunista do PÚBLICO Eduardo Prado Coelho lhe pôs a alcunha de "Gato Constipado" logo em 2003. O Partido Socialista atacava o PGR sem dó nem piedade por ver algumas das suas figuras envolvidas no escândalo da Casa Pia e num álbum de fotografias com que as autoridades confrontaram as vítimas do processo apareciam personalidades como Mário Soares, o cardeal-patriarca e o próprio Prado Coelho, que viria a falecer quatro anos mais tarde.

O colunista escreveu que o magistrado parecia um gato eternamente constipado. Ainda hoje Souto Moura não aceita de bom grado o petit-nom: “Achou que eu parecia ter falta de ar. Mas não me parece que a alcunha tenha tido grande sucesso”.

Mas nem só de Casa Pia – e da prisão do socialista Paulo Pedroso, que o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem mandou recentemente o Estado português indemnizar – foram feitos aqueles anos difíceis: do seu mandato também fizeram parte o caso Freeport, em que o ex-ministro do Ambiente José Sócrates surgia como suspeito (havia de acabar ilibado) e o processo Portucale, que versava o alegado financiamento ilegal do CDS.

"A pior coisa que pode acontecer a um procurador-geral da República é ter um processo contra o primeiro-ministro do seu país. Seria de uma hipocrisia enorme dizer que é um processo igual aos outros porque não é", havia de dizer em 2009, três anos depois de deixar o cargo, admitindo que nem tudo tinha corrido bem. “Trinta por cento deveu-se a limitações da minha pessoa, nomeadamente em lidar com a comunicação social, e em 70 por cento esteve relacionado com interesses que estavam a ser atingidos, com pessoas com poder", justificou na altura. Do seu atribulado mandato, durante o qual viu duas funcionárias da Procuradoria-Geral da República serem condenadas por abuso de poder e tráfico de influência, fizeram ainda parte os processos da Universidade Moderna, de Fátima Felgueiras e do Apito Dourado.

A sua passagem pelo Supremo Tribunal de Justiça foi bem mais discreta, como de resto era de esperar. A sua presença fez-se notar já este ano quando esteve presente nas buscas à casa de outro juiz, Rui Rangel.