PT faz aposta de alto risco e mantém Lula o máximo de tempo possível na corrida eleitoral

O antigo Presidente brasileiro pode não ser autorizado a candidatar-se, mas o partido não quer lançar já o seu mais do que provável substituto. Sondagens dão Jair Bolsonaro, extrema-direita, à frente com 22% na corrida sem Lula.

Foto
Fernando Haddad grava vídeo de campanha em frente às instalações da polícia onde que Lula está preso RODOLFO BUHRER/Reuters

A incerteza sobre as eleições presidenciais no Brasil, as mais imprevisíveis das últimas décadas, continua com as primeiras sondagens após o início da campanha, na quinta-feira passada, a mostrar uma subida de Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores - é um "candidato virtual" que em breve deverá ver a sua inelegibilidade confirmada -, e de Jair Bolsonaro, de extrema-direita e militar reformado que, num cenário sem Lula, continua a aparecer como vencedor.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

A incerteza sobre as eleições presidenciais no Brasil, as mais imprevisíveis das últimas décadas, continua com as primeiras sondagens após o início da campanha, na quinta-feira passada, a mostrar uma subida de Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores - é um "candidato virtual" que em breve deverá ver a sua inelegibilidade confirmada -, e de Jair Bolsonaro, de extrema-direita e militar reformado que, num cenário sem Lula, continua a aparecer como vencedor.

Num cenário com Lula, este mantém, apesar de estar preso, uma liderança impressionante e aumentou até a percentagem nas intenções de voto: 39% segundo a Datafolha. Bolsonaro aparece em segundo, com 19%.

Sem Lula, o candidato da extrema-direita é o primeiro, com 22%, segundo ainda a Datafolha, seguido de Marina Silva (Rede, ecologista) com 16%, e Ciro Gomes (PDT, centro-esquerda) com 10%. Geraldo Alckmin (PSDB) tem 9% das intenções de voto e Fernando Haddad, o número dois na candidatura de Lula e que o deverá substituir no boletim de voto, conseguiu apenas 4%.

Mas a estratégia do PT não é ver o caso de Lula fechado o mais rapidamente possível - o Tribunal Superior Eleitoral deve decidir em breve se pode ou não ser candidato estando condenado e preso - para lançar Haddad, apesar de “apenas um milagre” poder manter Lula candidato, como diz a revista Forbes, e de Haddad, antigo presidente da câmara de São Paulo, ser quase desconhecido a nível nacional. A ideia não foi consensual no PT – afinal, os primeiros debates televisivos decorreram sem Lula e sem uma voz do PT (sem sequer uma cadeira vazia que indicasse a existência da candidatura). 

A estratégia, de alto risco como sublinha a edição brasileira do diário espanhol El País, é fazer justamente o contrário. Como Lula é visto como o maior trunfo do partido, a ideia é mantê-lo na corrida o máximo de tempo possível, para tentar colar Haddad, o candidato do partido a vice-presidente, a Lula e usar também o facto de este estar preso com base numa condenação num processo com algumas fragilidades para apresentar como ilegítima a impossibilidade de o antigo Presidente concorrer, diz também o diário Folha de São Paulo.

Nos primeiros dias de campanha, Fernando Haddad gravou vídeos em frente às instalações da polícia onde Lula está preso, em Curitiba, fez campanha rodeado de caras de Lula e até adoptou o estilo mais relaxado do antigo líder sindical que se tornou Presidente: numa visita a Salvador, Bahia, o académico cantou e dançou, descreve uma reportagem do jornal Estado de São Paulo.

“Esse aqui é o Lula, rapaz”, disse Haddad. “O Lula que mandou a voz dele, a mensagem dele”, declarou. A colunista Vera Magalhães escrevia, também no Estadão, que Haddad parece "disposto a abrir mão temporariamente da própria biografia para personificar a do padrinho". 

A questão da elegibilidade de Lula continua a ser analisada nos tribunais, com mais uma decisão judicial mantendo que o antigo Presidente não pode ser candidato, com base na chamada Lei da Ficha Limpa, que impede que candidatos condenados (cuja condenação seja confirmada em recurso) por corrupção concorram a eleições. Lula foi condenado no caso de obras pagas num apartamento triplex em Curitiba (contra favorecimento da empresa em contratos públicos), e a condenação confirmada em recurso.

O prazo para trocar o nome do candidato registado é até 17 de Setembro, 20 dias antes da primeira volta das presidenciais, a 7 de Outubro. Esta quarta-feira foi iniciada mais uma fase do processo – terminou o prazo para contestações da candidatura de Lula (foram entregues dez pedidos, alguns deles de procuradorias) e os advogados do antigo Presidente têm sete dias úteis para defender a candidatura de Lula. A ideia será apresentá-la no último momento possível, às 23h59 do dia 30 de Agosto, diz a revista Exame.

A grande incógnita será depois de ser claro que Lula não é candidato, quantos votos conseguirá o PT transferir para Haddad. As três sondagens mais recentes dão quadros um pouco diferentes, porque fazem a pergunta de maneira diferente (evidenciando o apoio de Lula a Haddad ou não, ou falando de um candidato indeterminado apoiado por Lula).

Qualquer que seja a questão colocada, o ponto de partida de Haddad é baixo. A sondagem do Ibope, que é a que tem a formulação mais directa (“Se Lula não puder concorrer e transferir o apoio a Haddad, votaria nele?”), 13% responderam “com certeza”, 14% “talvez”; por outro lado, 60% não votariam “de modo nenhum”.

Por isso, o analista político Marco Antônio Teixeira, da Fundação Getúlio Vargas, sublinha ao El País Brasil que não é possível medir neste momento a força da transferência de votos. A pergunta fulcral só vai ser respondida, sublinha, “quando a candidatura de Lula já não existir”.