Biológica ou convencional?

Esta dicotomia forçada entre “biológico vs. não biológico”, que é promovida actualmente, não faz sentido e tem de ser travada.

O tema da agricultura biológica continua a marcar a agenda mediática, seja pelo crescente interesse por parte do consumidor por este tipo de agricultura, seja pela atenção sensacionalista que o tema tem vindo a despertar. Todo esse mediatismo contribuiu para aumentar o fosso entre a agricultura biológica e a convencional e só veio comprovar o expectável desconhecimento por parte da população, no geral, relativamente ao tópico.

No mais recente estudo feito à população portuguesa, realizado pela Universidade Católica, em colaboração com a Anipla, 65% dos inquiridos referiu preferir consumir alimentos biológicos por acreditar que estes reduzem o risco global de cancro. Como se estes resultados não fossem já suficientemente assustadores, acrescente-se ainda o facto de apenas 19% dos indagados ter conhecimento que a agricultura biológica também utiliza produtos fitofarmacêuticos químicos.

A constante luta pela protecção das culturas contra infestantes, pragas e doenças é um dos temas agrícolas mais controversos, mas também aquele que parece menos esclarecido, nesta alegada “bipolarização agrícola”. Grande parte da confusão sobre este assunto parte do desconhecimento da população quanto ao uso e aplicação dos produtos fitofarmacêuticos, pelo que há ainda a necessidade de esclarecer:

Existem vários tipos de fitofármacos, todos eles químicos, embora uns de síntese e outros de origem química, como o enxofre. No entanto, todos eles são produtos fitofarmacêuticos, todos eles estão sujeitos à mesma legislação e todos eles acarretam riscos se não forem aplicados de acordo com as recomendações legais. Em suma: os riscos para o aplicador, para o consumidor e para o meio ambiente não dependem do tipo de produção ou da sua composição físico-química, mas antes da forma como são utilizados. A questão está, assim, na forma como são usados os meios e não nos meios em si.

O que é certo é que a agricultura biológica tem vindo a reivindicar a não utilização de produtos químicos de síntese, fazendo com que esta passasse a ser encarada pela maior parte da população como sendo mais “amiga do ambiente” e geradora de alimentos mais saudáveis, quando comparada à chamada agricultura “convencional”.

A diferenciação que é feita entre as chamadas agriculturas “biológica” e “convencional” não está certa, quer do ponto de vista científico, quer até do ponto de vista semântico. Ainda assim, os nossos governantes têm vindo publicamente manifestar o seu apoio à produção biológica, num claro aproveitamento da necessidade emocional de uma população urbana que está distante da realidade agrícola e que é, como sabemos, bastante vulnerável e desconhecedora.

Esta situação de total ignorância sobre a realidade agrícola e os seus métodos de produção é o resultado de anos e anos em que não se investiu na própria agricultura e muito menos na literacia sobre o tema. Esta dicotomia forçada entre “biológico vs. não biológico” que é promovida actualmente, onde os consumidores são levados a acreditar numa agricultura da “Primeira Liga” e outra da “Liga de Honra”, não faz sentido e tem de ser travada. Estejamos mais atentos às ideias que nos são vendidas: os consumidores e a actividade agrícola merecem mais.

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