De Le Pen a BdC, a feira do grotesco

Foi patente o embaraço em que ficaram o Governo e a Câmara de Lisboa, ao não quererem passar por censores da presença de Le Pen, remetendo-se a previsíveis manobras de bastidores.

Chegados a meados de Agosto, parecia mesmo fatal mergulharmos na "silly  season". Aí estão a polémica à volta do convite e desconvite a Marine Le Pen para participar na Web Summit e o mais recente e inusitado episódio da novela Bruno de Carvalho (BdC). A primeira deu azo a reacções e comentários muito egocêntricos - com declarações sonoras do tipo "eu sou da direita liberal" versus "eu sou da esquerda cosmopolita" -, alimentando a confusão sobre o que estava em jogo. Quanto ao segundo, foi mais uma ilustração do estado de anemia mental a que chegaram as televisões e outros media por causa da guerra das audiências (ou da conjugação de sonambulismo e carneirismo entre emissor e receptor da informação).

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Chegados a meados de Agosto, parecia mesmo fatal mergulharmos na "silly  season". Aí estão a polémica à volta do convite e desconvite a Marine Le Pen para participar na Web Summit e o mais recente e inusitado episódio da novela Bruno de Carvalho (BdC). A primeira deu azo a reacções e comentários muito egocêntricos - com declarações sonoras do tipo "eu sou da direita liberal" versus "eu sou da esquerda cosmopolita" -, alimentando a confusão sobre o que estava em jogo. Quanto ao segundo, foi mais uma ilustração do estado de anemia mental a que chegaram as televisões e outros media por causa da guerra das audiências (ou da conjugação de sonambulismo e carneirismo entre emissor e receptor da informação).

Vejamos o caso Le Pen. O que surpreende, desde logo, é a organização da Web Summit se ter lembrado de convidar a líder da extrema-direita francesa para intervir num debate onde ela seria uma presença absolutamente excêntrica e disparatada tendo em conta a natureza do evento (a não ser que se procurasse um mero efeito de provocação e oportunismo folclórico para ter eco nos media, o que, diga-se, foi efectivamente conseguido). Parece uma reedição do jantar programado (e desprogramado) para o Panteão em 2017, outra iniciativa disparatada mas com a intenção óbvia de chamar as atenções. Mas, cruzando as duas iniciativas, é legítimo suspeitar que os organizadores da Web Summit - ou, mais concretamente, o ultramediático sr. Cosgrave - estão à procura de um motivo para se indisporem com os patrocinadores oficiais da iniciativa e deslocá-la para outra cidade ou, então, negociarem um reforço do patrocínio em troca do seu comportamento compreensivo.

Em todo o caso, foi patente o embaraço em que ficaram o Governo e a Câmara de Lisboa, ao não quererem passar por censores da presença de Le Pen, remetendo-se a previsíveis manobras de bastidores enquanto durava o folhetim do convite-desconvite. Ora, uma coisa é não ter nada a ver com os critérios de programação do evento, outra é considerar despropositado o convite a Le Pen (a não ser, eventualmente, no contexto de um debate ideológico sobre os populismos, incluindo, por exemplo, o sr. Mélenchon).

Já agora, seria oportuno que o sr. Cosgrave esclarecesse quais são esses critérios que definem as fronteiras das escolhas para o palco da Web Summit, uma iniciativa dirigida ao chamado novo empreendedorismo tecnológico e a sociedade digital onde, convenhamos, os propósitos de Le Pen estão manifestamente deslocados. Não se trata de censurar ou não censurar escolhas, mas de considerar o sentido que fazem ou não num determinado contexto. É isso e só isso o que está em causa e não o legítimo direito de Le Pen e outros líderes populistas se exprimirem em todos os fóruns políticos e mediáticos apropriados.

Mas eis que voltamos a Bruno de Carvalho e à sua nova tentativa de assaltar o poder sportinguista e concentrar as atenções mediáticas (o que foi inteiramente conseguido, mesmo tendo contra ele o coro dos comentadores televisivos, batendo-lhe como num saco de boxe). Ora, uma das questões pouco abordadas mas que permitem esta nova gesticulação patética de BdC reside na formulação opaca da providência cautelar por ele interposta e que, pelos vistos, se presta a interpretações contraditórias. O chamado "juridiquês" é, aliás, responsável por muitas situações de confusão e bloqueio na nossa vida pública, alimentando conflitos e folhetins absolutamente desnecessários e de carácter perverso, como é o caso. Mas se não fosse esta feira grotesca de Le Pen e BdC, que seria feito da "silly  season"?