Ensaios para um melhor futuro

A guitarra coimbrã de Jorge Tuna volta a soar, vibrante, num disco que sintetiza o fulgor dos seus ensaios com Durval Moreirinhas. Um registo histórico.

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Ensaios faz um apanhado das gravações feitas em casa de Jorge Tuna com Durval Moreirinhas, desde 1989 até 2015, dois anos antes da morte deste último

“O que tocamos é aquilo que vai pela alma, transmitido pelas mãos, neste caso nas cordas de uma guitarra. E a transmissão de estados de alma é que é importante.” Isto dizia Jorge Tuna em 2003, comentando o lançamento do seu disco As Mãos e a Alma, gravado com Durval Moreirinhas, que durante décadas (desde 1958 até 2015) o acompanhou à viola, formando ambos uma dupla de relevo na música coimbrã. Quinze anos passados, surge nas lojas um novo registo, Ensaios, que faz um apanhado de algumas das muitas gravações feitas em casa de Jorge Tuna (autor de todas as composições) com Durval, desde 1989 até 2015, dois anos antes da morte deste último. Daí que o presente disco seja dedicado à sua memória, expondo a diversidade de um trabalho musical irrepetível.

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“O que tocamos é aquilo que vai pela alma, transmitido pelas mãos, neste caso nas cordas de uma guitarra. E a transmissão de estados de alma é que é importante.” Isto dizia Jorge Tuna em 2003, comentando o lançamento do seu disco As Mãos e a Alma, gravado com Durval Moreirinhas, que durante décadas (desde 1958 até 2015) o acompanhou à viola, formando ambos uma dupla de relevo na música coimbrã. Quinze anos passados, surge nas lojas um novo registo, Ensaios, que faz um apanhado de algumas das muitas gravações feitas em casa de Jorge Tuna (autor de todas as composições) com Durval, desde 1989 até 2015, dois anos antes da morte deste último. Daí que o presente disco seja dedicado à sua memória, expondo a diversidade de um trabalho musical irrepetível.

Não sendo músicos profissionais (Tuna é médico-cardiologista e professor, Durval era bancário) mas tendo dedicado à música grande parte das suas vidas, ao longo de seis décadas, Jorge Tuna e Durval Moreirinhas confirmam nestes Ensaios a completude do seu trabalho conjunto, sendo as composições de grande apuro e sensibilidade e as execuções instrumentais, à guitarra e à viola, exímias e deveras tocantes. Da Dança das águas, que abre o disco, ao tríptico dedicado a Monserrate, que o encerra, viaja-se para lá das raízes coimbrãs, em pormenores que o historiador Armando Luís de Carvalho Homem anota, no texto inserido no livrete do disco, como passando pela dedilhação, pela construção da melodia (“por grupos de 3 notas, uma novidade na Coimbra dos anos 60”), pelos acompanhamentos (nas “descidas de meio-tom em meio-tom”), acordes e relação com outros universos musicais (ele cita o barroco, a música descritiva e a ambiental).

Mas aparte as observações estruturais, virtuosísticas, ou técnicas (o registo fonográfico, na transcrição para CD, exibe bom recorte sonoro), é em audições despreocupadas que Ensaios revela o seu poder de sedução, mostrando que à guitarra de Coimbra (como já antes haviam provado Artur Paredes e o filho, Carlos) se abre um melhor futuro, mais vasto do que o ditado pela tradição académica ou o estritamente ligado à canção estudantil coimbrã. Jorge Tuna e Durval Moreirinhas seguiram esse caminho e este disco confirma-o, de forma eloquente.