Kiki Challenge pode correr mal a David Carreira

Cantor decidiu fazer o desafio de sair do carro em andamento e incorre numa multa. Sindicato da PSP indignado com uso de veículo em videoclip.

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O Kiki Challenge tem sido feito um pouco por todo o mundo e há autoridades, como nos EUA, Egipto ou Arábia Saudita, que estão a proibi-lo, uma vez que é perigoso. Por cá, o cantor David Carreira fê-lo não com a música de Drake, mas com o seu último hit, e a PSP já entrou em acção. Entretanto, um sindicato do sector mostra-se indignado com uso de um veículo da PSP numa música onde o refrão inclui um palavrão, afirmando que “a dignidade e nobreza da PSP foi posta em causa”. 

Num vídeo gravado com a autorização do cantor, David Carreira, 27 anos, ao volante de um Porsche, pergunta-se: “Quando, basicamente, descobres que ’tás em primeiro lugar e ultrapassaste o Drake, o que é que tu fazes?” O cantor faz referência ao rapper canadiano e ao seu sucesso In  My Feelings, que tem dado lugar ao chamado Kiki Challenge, quer feito por anónimos quer por celebridades, e que nem sempre tem corrido bem. A PSP desaconselha vivamente a fazê-lo, pois põe em causa a integridade física de quem o faz e a dos outros. 

E Carreira, depois de um segundo de suspense, dá a resposta — “Fazes isto” —, abre a porta do veículo em andamento, ainda tem o cuidado de olhar para a esquerda e para a direita, e salta. De dentro do carro ouve-se a música do cantor em parceria com o brasileiro MC Zuka e com o angolano Deejay Télio, O Problema É Que Ela É Linda, a canção que ultrapassou Drake. Com o carro em andamento e com outros a passar em sentido contrário, o cantor de 27 anos faz uma parte da coreografia da sua canção, aquela que também já apelou aos fãs para aprenderem e publicarem os vídeos a dançar.

A gravação chegou ao conhecimento da PSP, que enviou uma declaração ao PÚBLICO sobre o que fará: “Iremos enviar uma participação à ANSR [Associação Nacional de Segurança Rodoviária], para que seja iniciado o procedimento contra-ordenacional.”

E a seguir? “Para que possa existir qualquer sanção, é ainda necessário apurar o local concreto e data aproximada em que a infracção foi praticada. Além disso, David Carreira tem de ser identificado formalmente e dada a possibilidade de este exercer o seu direito de defesa, o que certamente ainda levará algumas semanas.”

Mas em que sanção incorre o cantor e todos os que se puserem a fazer o Kiki Challenge em Portugal? Teresa Lume, advogada especializada em Direito Rodoviário, cita o número 2 do artigo 3.º do Código da Estrada: “As pessoas devem abster-se de actos que impeçam ou embaracem o trânsito ou comprometam a segurança, a visibilidade ou a comodidade dos utilizadores das vias, tendo em especial atenção os utilizadores vulneráveis.”

“É como comer um gelado ao volante ou pôr rímel [a quem também se aplica o mesmo artigo], só que aqui é mais perigoso porque se salta do carro em andamento e não fica ninguém ao volante”, explica a jurista.

O gabinete de imprensa e relações públicas da PSP confirma: “Pendente de uma avaliação caso a caso, quem adopta este comportamento pode ser acusado de infracção ao art. 3.º do Código da Estrada, ’praticar acto que comprometa a segurança (…) dos utilizadores da via’, que é sancionada com coima até 300 euros.” E acrescenta que “poderão estar ainda em causa outras infracções, dependendo do local e modo como a pessoa age, uma vez que poderá haver ainda desrespeito a sinalização ou outras regras de trânsito”.

Os trâmites deste processo prevêem que David Carreira seja notificado, chamado — “por que não houve flagrante delito”, justifica a advogada — e ouvido. Caberá ao Departamento de Investigação da PSP ou ao Ministério Público decidir se houve crime contra a segurança rodoviária. 

Sindicato contra uso de carros em filmagens

Por causa de David Carreira, também a PSP foi criticada pela Organização Sindical dos Polícias (OSP/PSP), que publicou no Facebook um post onde lamenta a “utilização desproporcional do material policial” para fins comerciais, citando o videoclip da música de Carreira onde Deejay Télio e um grupo de bailarinas posam, cantam e dançam em cima de um carro identificado. “O chamado material de guerra deveria ser unicamente para uso exclusivo da instituição e não para alugar a terceiros”, defende a organização, que critica ainda o palavrão que o angolano profere repetidamente e que faz parte do refrão da música.

“Incompreensível e intolerável que se coloque seja quem for naquele propósito numa viatura de serviço policial e mais grave e repugnável são as palavras que canta”, continua o post. “No entender da OSP/PSP, a música nada tem a ver com o serviço policial e desfigura a instituição como algo banal e indigno em que qualquer um pode espojar-se em cima de uma viatura de serviço policial e fazer e dizer o que bem lhe apetece. A OSP afirma que a dignidade e nobreza da PSP foi posta em causa, sendo desrespeitoso para com a instituição e para os profissionais que nela prestam serviço. Situações destas, banalizando a imagem de toda a corporação e seu efectivo, como sendo uma imagem promocional de tipo produto de marca branca.”

A associação dá ainda o exemplo de outro músico, Piruka, que publicou nas redes sociais em Junho uma fotografia onde se encontra sentado em cima de um carro da PSP “a fumar supostamente ‘um charro’”.

Também o gabinete de imprensa da PSP afina pelo mesmo diapasão que a OSP, informando que já manifestou o seu “desagrado junto da empresa que gravou o vídeo, pela gravação de cenas e conteúdos que diferem substancialmente do descritivo que foi enviado” e sobre o qual deu autorização para usar a viatura. 

A PSP lembra que há anos que cede meios para produção audiovisual, “mantendo sempre uma relação de boa -fé com as produtoras” e que estas “sempre se mantiveram fiéis aos descritivos/guiões” que remetiam para cedência de material.

Quanto à imagem de Piruka “não foi autorizada ou sancionada pela PSP, sendo da inteira responsabilidade do rapper que a colocou a circular”. Contudo, “dentro da estratégia de proximidade na comunicação em redes sociais, interagimos com a publicação no sentido de mostrar que estávamos atentos, sem assumir uma posição de confrontação com o jovem rapper”, informa a PSP ao PÚBLICO.

O gabinete diz ainda que “não se revê nas posturas adoptadas, sendo certo que nunca autorizará a utilização da imagem policial em situações que a coloquem em causa”.

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