Protecção Civil desvaloriza obrigatoriedade de regras que criou para se organizar

Direcção da Autoridade Nacional de Protecção Civil considera que são “flexíveis” as regras e procedimentos que foram modificados depois de Pedrógão.

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Rui Gaudencio

O incêndio de Monchique foi a primeira prova à organização do combate este ano. E para explicar a sua actuação neste fogo, a Autoridade Nacional de Protecção Civil defendeu que a interpretação que tem das regras que construiu para organizar melhor o seu comando é que estas são “flexíveis” e dependentes da avaliação que é feita pelo comandante nacional.

Nesta quinta-feira, depois da notícia do PÚBLICO que dava conta de que as regras de procedimento nos fogos, definidas no Sistema de Gestão de Operações (SGO) aprovado em Abril deste ano e redefinido por causa das lições de Pedrógão Grande, tinham sido violadas, uma vez que o comando nacional não chamou a si a responsabilidade do comando do fogo logo no sábado, a Protecção Civil falou por duas vezes para defender a flexibilidade da aplicação do SGO.

Primeiro foi Patrícia Gaspar, a segunda comandante nacional, a defender que os valores que estão registados no SGO são valores de “referência” e que concorrem para a avaliação feita pelo comando nacional outros “critérios operacionais”, sem explicar quais. Em causa está o facto de a legislação definir que a partir de 648 operacionais mobilizados e havendo perspectiva de complexidade, o incêndio deve ser considerado de nível V e tem de ser comandado por um comandante de agrupamento ou pelo comando nacional. O que não aconteceu entre sábado e terça-feira.

Já ao final da tarde, a ANPC enviou um comunicado a reiterar a posição e a referir que estas regras permitem ao comandante nacional “a todo o momento” tomar a “decisão de accionar um nível superior de comando e controlo”, interpretação que não foi fornecida ao PÚBLICO no dia anterior quando recebeu as respostas da ANPC. Acresce que a legislação especifica que o comandante nacional apenas tem de decidir quando o incêndio passa para a fase VI (este caso refere-se ao nível V) e que até lá depende do comandante que estiver no terreno.

A legislação também não refere o seu carácter facultativo e “flexível” de forma clara. Num dos artigos é dito que é da “responsabilidade” do comandante de operações decidir pela mudança de nível de incêndio “sempre que os meios disponíveis na intervenção inicial e respectivos reforços se mostrem insuficientes ou quando a previsão do potencial dano o exigir ou aconselhar”. A seguir, o sistema define os tais mínimos (648 meios mobilizados e complexidade prevista) que enquadram essa avaliação para ela ser mais objectiva.

Além disso, o espírito da lei, definido no seu preâmbulo, diz que se trata de uma “definição clara de funções, responsabilidades e níveis de decisão” de quem está no comando de operações, fazendo subir essas responsabilidades à medida que os incêndios se tornam mais complexos. O PÚBLICO enviou perguntas adicionais à ANPC sobre este assunto para esclarecer a interpretação da lei feita pela ANPC, nomeadamente para que serve este sistema e quais os factores que levaram a que o comandante nacional não tivesse decidido elevar o nível de comando do incêndio mais cedo, mas até à hora de fecho desta edição não foi possível obter respostas.

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