Governo argentino procura alternativa a rejeição da despenalização do aborto

Segundo o jornal Clarín, o Governo tenta encontrar meio de pelo menos deixar de prender mulheres que abortem

Fotogaleria

Mal o Senado da Argentina rejeitou, na quarta-feira, a proposta de despenalização do aborto até às 14 semanas, já nos gabinetes do Governo se procuravam modos de evitar as consequências, pelo menos penais, para as mulheres que abortam. Segundo o jornal Clarín, o Governo deverá aproveitar o processo de revisão do Código Penal em curso para deixar de penalizar as mulheres que abortem.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Mal o Senado da Argentina rejeitou, na quarta-feira, a proposta de despenalização do aborto até às 14 semanas, já nos gabinetes do Governo se procuravam modos de evitar as consequências, pelo menos penais, para as mulheres que abortam. Segundo o jornal Clarín, o Governo deverá aproveitar o processo de revisão do Código Penal em curso para deixar de penalizar as mulheres que abortem.

Depois de um enorme debate e mobilização, que levou à aprovação, em Julho, da despenalização na Câmara dos Deputados, o Senado chumbou a proposta de lei por 38 votos contra e 31 a favor, deixando o aborto legal acessível apenas em casos de violação ou risco de vida ou de saúde para a mulher.

Isto deixa excepções, como mulheres que precisem de tratamento que possa prejudicar o feto mas que lhes salvaria a vida (por exemplo, nos casos de grávidas com alguns cancros), ou obriga grávidas com fetos com malformações congénitas, que se sabe que morrerão nas primeiras horas após o parto, a levar a gravidez até ao fim.

Isto para além das mortes decorrentes de complicações de abortos clandestinos, feitos pelas próprias mulheres com medicamentos cuja aplicação principal é outra, ou com agulhas, ou de procedimentos feitos por clínicas sem condições. Estima-se que uma mulher aborte a cada minuto e meio na Argentina, apesar de ser crime.

A Igreja Católica e o Papa Francisco – que era arcebispo de Buenos Aires antes de ser eleito Papa em 2013 – foram vistos como tendo sido decisivos para o voto “não”. O Clarín dizia que o Papa pediu pessoalmente a deputados anti-aborto para fazerem pressão junto de senadores indecisos.

Alguns observadores criticam o Presidente Mauricio Macri por ter aberto o debate sobre o aborto, dizendo que se tratou de uma maneira de desviar a atenção para outros problemas do país. Apesar de o Presidente se ter dito pessoalmente contra, poderia beneficiar da aprovação de uma lei histórica. Com a rejeição do Senado, o efeito será, especula-se, neutro ou negativo, diz o Clarín. Daí a tentação de retirar a pena de prisão (até quatro anos) para a mulher no Código Penal.

Segundo o Clarín, há várias hipóteses em cima da mesa. Uma seria a substituição de penas de prisão por um outro tipo de penalização, outra seria eliminar qualquer pena para a mulher (mantendo em ambos os casos as penas para quem realize o procedimento). A assistência médica do Estado continuaria reservada para os casos actuais: violação e risco de vida para a mulher. A hipótese de retirar totalmente o crime do código parecia afastada.

A discussão política ficou suspensa até à próxima legislatura, ou seja, até Março de 2019, mas activistas e ONG como a Amnistia Internacional ou Human Rights Watch activistas prometiam continuar a lutar para que o aborto seja despenalizado na Argentina, sob a hashtag VaASerLey (“vai ser lei”).

“Só porque a proposta de lei foi chumbada, isso não vai parar o movimento”, disse Paula Avila-Guillen, do Centro para a Igualdade das Mulheres, citada pela agência Reuters. “Estaremos aqui na próxima oportunidade legislativa.”