Macron: a fractura na Europa é entre nacionalistas e imobilistas e os reformistas

Fractura na União Europeia é entre os nacionalistas, com a cumplicidade do statu quo, e os europeístas reformadores, defendeu o Presidente francês em Lisboa.

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Emmanuel Macron, à sua chegada à Gulbenkin, em Lisboa, com António Costa Rui Gaudêncio
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Emmanuel Macron Rui Gaudêncio

A União Europeia vive uma divisão entre os nacionalistas, com a cumplicidade do statu quo, e os reformadores que querem responder aos desafios actuais, declarou esta sexta-feira o Presidente francês, Emmanuel Macron, na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.

O Presidente francês falava no âmbito de uma iniciativa de Encontros com os Cidadãos, que promoveu e que pretende ter pela Europa, e que contou também com a participação do primeiro-ministro português, António Costa.

Recusando uma dicotomia simples entre posições contra e pró Europa, Emmanuel Macron defendeu que na fractura actual – e que será vista nas eleições europeias do próximo ano – o imobilismo está ao lado do nacionalismo contra os reformistas. A “timidez” e “hesitação” dos líderes europeus deixou espaço aberto para uma oposição à Europa baseada na sua rejeição. É preciso, defendeu, dar agora lugar aos “progressistas que estão prontos a assumir riscos para reformar” a União Europeia.

Os políticos pró-europeus mas imobilistas, criticou, deixaram o conceito de soberania “livre” para ser apropriado pelos nacionalistas, quando deveria ser usado pelos reformadores: “A soberania significa decidir o nosso destino, e se estivermos divididos não o conseguiremos fazer”.

Todos os desafios, sejam de migrações, de digital e inovação, seja de clima ou de política comercial, “têm de ser abordados no quadro da soberania”, ou seja, de uma União Europeia que saiba o que quer e siga uma política unida, defendeu o Presidente francês. 

Antes, Macron falou do estatuto absolutamente excepcional da União Europeia enquanto espaço de liberdade e cooperação na Europa, por oposição ao que foi sempre antes, um espaço de guerra e domínio e competição. E a União Europeia também é um caso único assente em três ideias fundamentais, a democracia e respeito de direitos fundamentais, uma economia social de mercado e a ideia de progressão das classes médias, notou. Tudo isto é muitas vezes esquecido, disse: “O que para mim é um erro moral e político”.

Mas Macron também concede que há anos que ser pró-europeu não está na moda. E defendeu que é preciso deixar os cidadãos sentir a Europa: todos os que fizeram o programa Erasmus falam do intercâmbio, “é uma experiência real”. “Nós criámos uma Europa um pouco burocrática”, admite. “Não podemos simplesmente dizer que a Europa são regras, objectos frios que se impõem de um exterior longínquo”. E esta visão, acrescentou, “não é uma fatalidade”. “Cabe-nos a nós mudar.”

Ao responder a uma das perguntas da plateia (estes Encontros de Cidadãos pretendem responder às perguntas dos cidadãos e ouvir o que estes têm a dizer) sobre como comunicar as questões europeias, Macron notou o paradoxo dos críticos que dizem “isto é Bruxelas que decide”. “Mas quem é Bruxelas?” perguntou Macron. “É o Parlamento Europeu, que é eleito pelos cidadãos, o conselho que representa os Governos, eleitos pelos cidadãos, e a Comissão, que tem pessoas de todos os Estados, e que é aprovada pelo Parlamento Europeu. Ou seja: Bruxelas é a capital de todos nós”, concluiu.

Estes encontros são uma ideia de Macron nascida da necessidade de aproximar a Europa dos cidadãos e até Outubro vão ter lugar em todos os países, excepto a Hungria, diz o diário francês Le Monde.

Aprender com o passado

Tanto Macron como Costa falaram do momento actual de pós-crise do euro para pedir uma mudança.

António Costa disse que é agora momento de prevenir novas crises: “É uma boa ocasião para olhar para o passado e aprender com os erros, é a altura para resolver os problemas estruturais”. “Isso significa ter, como propôs o Presidente Macron, uma capacidade orçamental para absorver choques”. Porém, sublinhou, o essencial é “assegurar o que é o verdadeiro estabilizador, que é a convergência económica”. Isto porque “está provado que as uniões monetárias não reduzem as diferenças mas acentuam sim as assimetrias”, afirmou.

Também Macron notou que é preciso “não só responsabilidade mas convergência” entre os países da zona Euro, e por isso defende “um orçamento e investimentos conjuntos”.

Antes, o primeiro-ministro português apelara a um maior investimento para que a Europa possa fazer mais face aos vários desafios. “É preciso pôr no Orçamento da Europa o que seja preciso para cumprir o que tem de cumprir”.

As perguntas da audiência não espantaram nenhum dos intervenientes (o diário Le Monde dizia mesmo que a plateia num país de francófonos e com um grande sentimento pró-europeu era a audiência ideal para as ideias de Macron), mas uma questão destacou-se (e mereceu aplausos). Era sobre a diversidade da equipa de futebol que ganhou o Mundial, e a falta de diversidade nas pessoas que estavam na pequena plateia.

Macron lembrou como as coisas mudaram. “Em 1998 eu era estudante - lembru - e dizia-se que a equipa era preta-branca-magrebina". Em 2018, "os jogadores não pararam de dizer ‘Viva a República! Viva a França!’". O que "quer dizer que qualquer coisa mudou”.

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