São os homens que falam de menos ou as mulheres que falam de mais?

O sexismo é mais frequente do que parece. Começa em casa. E alimenta-se do silêncio.

Tudo o que é estranho e diferente nos assusta. Porque que não se conhece por dentro. E é talvez por isso que o discurso sexista seja tão democrático. À luz dos lugares-comuns, os homens são distraídos, não escutam, não sentem, não se comovem e não falam. Sempre que uma mulher os questiona sobre aquilo em que estão a pensar - mesmo quando dão sinais de que estão compenetrados a medir forças com um pensamento - são capazes dessa façanha extraordinária de pensarem... “em nada”. E, é claro, se a gravidez fosse masculina a Humanidade tinha-se extinguido muito antes do desaparecimento dos dinossauros. As mulheres, à luz das mesmas banalidades, choram por tudo e por nada. Fazem cenas por coisas que “não lembram ao diabo”. São românticas (que horror!). E são “uma ameaça à segurança rodoviária”. Quando lhes dá para “pegar” não há quem as ature. Quando perdem os argumentos lacrimejam e metem qualquer homem “no bolso”. E - claro! - falam de mais. Elas não percebem das finanças; eles não percebem da casa e da família. É verdade que, feitas as contas, todos nós nos imaginamos com um “valor facial” muito acima daquilo que valemos. Mas, vendo bem, todos somos sexistas. Se preferirem, fomos educados para esta desconfiaçazinha que nos leva a supor, pensando baixinho, que somos todos diferentes e iguais; sim. Só que há uns que são mais iguais (isto é, melhores) que os outros. O problema dos lugares-comuns é serem formulações muito “prêt-à-porter” de ideias razoavelmente falsas.

Ora, esta ideia de que os homens não falam e que as mulheres falam de mais é perigosa e escorregadia. Porque funciona como os slogans, para a política: repete-se muitas vezes e, quando se dá por isso, transforma-se num “facto”. Os homens não falam porque são uma versão rudimentar da “natureza humana”. De preferência, quando se trata de falarem de tudo o que sentem ou “daquilo que é importante”. E as mulheres falam de mais porque “não dizem coisa com coisa”. Ou, talvez num registo mais “almofadado”, “falam muito e não dizem nada”. Quando os homens e as mulheres falam tantas vezes assim uns dos outros quem tem autoridade moral para atirar a primeira pedra sobre sexismo?

É claro que todos sabemos que os homens acham, cada vez mais, que a igualdade de oportunidades, as quotas de género e salários iguais para trabalho igual são opções justas e “politicamente correctas”. Embora, em surdina e entre eles, se achem melhores ou superiores. E que as mulheres, por seu lado, acham justa a guarda conjunta das crianças, após um divórcio; reconhecem que a violência doméstica e o assédio não são, infelizmente, exclusivas dos homens; e que as licenças de parentalidade, as dispensas para acompanhar os filhos ao médico ou as jornadas contínuas de trabalho deviam ser paritárias. Mas, nos comentários que fazem entre si desconsideram, minimizam e culpam, muitas vezes, os homens. Mesmo quando as responsabilidades daquilo que esteja mal são repartidas. E tratam-nos, para além do razoável, como os seus “filhos mais velhos”. Isto é, os homens e as mulheres são abertos à mudança. Mas, em imensas circunstâncias, fazem muito pouco para que ela se dê.

Os homens e as mulheres talvez ainda vivam enredados em lugares-comuns que alimentam uma desconfiançazinha que os afasta uns dos outros. E, se for assim, o sexismo é mais frequente do que parece. Começa em casa. E alimenta-se do silêncio. Talvez por isso as férias possam ser uma oportunidade preciosa para, de conversa afiada, irmos “para fora” cá dentro.

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