“Foi por falta do PCP que não se foi mais longe? Não foi”

Um novo acordo PS PCP após as legislativas está em cima da mesa. O líder parlamentar do PCP, João Oliveira diz que “nunca será por falta do PCP” que falharão soluções benéficas para os trabalhadores e o povo. A opção é do PS. Mas João Oliveira garante que não é preciso assinar acordos: “A palavra dada é aquilo que é respeitado.”

“Foi por falta do PCP que não se foi mais longe? Não foi” São José Almeida (Entrevista) e Ricardo Sampaio (Vídeo)

O líder parlamentar do PCP, João Oliveira, admite que perante um cenário pós legislativas em que o PS seja minoritário e haja maioria de esquerda, os comunistas não deixarão de “garantir que a solução política e que a política a executar vá mais ao encontro dos interesses dos trabalhadores e do povo”. E lembrando os “governos minoritários de António Guterres”, garante: “O PCP estava cá e estava disponível para contribuir para tudo o que fosse positivo.” Lembra “a capacidade de influenciar as decisões nacionais”, que os comunistas tiveram na actual legislatura e sublinha: “Mais capacidade de influência com um reforço do PCP e da CDU naturalmente permitirá coisas ainda melhores.

Quem o ouve, parece que todas as negociações positivas em três Orçamentos foram negociadas só com o PCP. Nunca falam do BE?

Nós não falamos doutros. Cada um tem o seu posicionamento, faz a avaliação que entende fazer das medidas. Nós falamos por nós e pelo trabalho que fazemos. Em relação ao aumento das pensões, por exemplo, nós sabemos que andámos sozinhos a batalhar. Se bem se lembra, em 2016, a única coisa que o Governo fez foi descongelar a tal lei da actualização automática. Na altura dissemos que era insuficiente, que era preciso fazer um aumento real do valor das pensões. Estávamos sozinhos nessa altura. Estivemos sozinhos durante muito tempo.

Com a mudança da liderança do PSD há assuntos, como descentralização, leis laborais, Uber, orçamento comunitário e os fundos estruturais, que têm sido negociados entre PS e PSD. Teme que venha aí um Bloco Central?

Essa questão não se coloca tanto pelo temor do Bloco Central. Julgo que os portugueses já estão vacinados de convergências entre PS e PSD, porque percebem o que significam. Basta olhar para a legislação laboral e perceber aquilo em que o PS se entendeu com o PSD, o CDS, os patrões. Qual foi o resultado que isso deu para os trabalhadores? Foi um resultado negativo. É essa avaliação que tem de ser feita pelos portugueses. Do ponto de vista dos partidos políticos cada um fará as opções que entender e isso traduzir-se à também no caminho que o país vai poder fazer.

Não teme que o entendimento com o Governo leve as pessoas a dizer: bom, vamos votar directamente no PS?

As pessoas conseguem fazer muito bem a separação entre o PCP e o PS e de que lado está cada um, do ponto de vista das opções que são relevantes para a sua vida. Nesta circunstância, torna-se ainda mais evidente a necessidade de dar força ao PCP. Diria que a questão verdadeiramente decisiva é saber com que força é que o PCP e a CDU saem das legislativas. Naturalmente que se tivermos mais força, saímos reforçados, temos condições de fazer ainda melhor, de influenciar de forma mais decisiva a favor dos trabalhadores e do povo as decisões que são tomadas na Assembleia da República. A capacidade de influenciar as decisões nacionais, que tivemos nesta legislatura, traduziu-se em muita coisa positiva na vida das pessoas e as pessoas reconhecem isso. Mais capacidade de influência com um reforço do PCP e da CDU naturalmente permitirá coisas ainda melhores.

Esse seu discurso abre caminho à disponibilidade do PCP para, em caso do PS ganhar as eleições com maioria relativa haver um novo tipo de acordo, de aliança política, de apoio do PCP um Governo do PS.

A nossa solução política não é a de um Governo minoritário do PS.

É o PCP ser Governo.

Não apenas o PCP, consideramos que a solução política que é necessária é de um governo patriótico e de esquerda que concretize a política patriótica e de esquerda. Não esgotando ao PCP a composição desse governo, porque há um conjunto de patriotas e democratas, homens e mulheres de outros partidos e até mesmo sem partido, com quem tem de ser construída essa solução política. Agora aquilo que é verdadeiramente decisivo, é saber a força com que o PCP e a CDU saem das legislativas.

Mas num quadro concreto, que seja maioria relativa do PS, uma correlação de forças à esquerda maioritária, a disponibilidade do PCP mantém-se para continuar a influenciar as políticas?

Naturalmente que isso depende sobretudo da força que nós tivermos.

Se o PCP tiver 5% é difícil.

A capacidade de influenciar uma solução política num sentido que seja favorável aos trabalhadores e ao povo depende naturalmente da força que nós tivermos. Com esta força que tivemos nesta legislatura fomos capazes de influenciar até onde conseguimos. Naturalmente se tivermos mais força se houver uma outra correlação de forças, ainda mais favorável aos trabalhadores com mais força da CDU, nós estaremos em melhores condições de influenciar mais.

Se a correlação de forças for PS minoritário, em primeiro lugar mas sem maioria absoluta, maioria de esquerda e o PCP com um resultado idêntico ou superior ao actual, a disponibilidade mantém-se?

Repare que está a colocar um quadro de condicionantes que não é pouco pesado.

E o senhor deputado não está a querer responder.

Dou-lhe a resposta de outra maneira. Esse quadro que me está a descrever não é o quadro dos governos minoritários de António Guterres?

É, por exemplo.

Bem, se não foi possível na altura encontrar soluções mais avançadas que respondessem aos problemas do país, não foi por falta do PCP. O PCP estava cá.

O PCP colaborou em várias coisas com Guterres.

O PCP estava cá e estava disponível para contribuir para tudo o que fosse positivo.

E esteve disponível até para a reforma da Segurança Social.

Foi por falta do PCP que não se foi mais longe? Não foi.

Portanto, não será por falta do PCP?

Nunca será por falta do PCP que as condições de vida e de trabalho dos portugueses deixam de avançar. Nunca será por falta do PCP. A questão é, com mais força nós conseguimos fazer com que elas avancem mais, com menos força, naturalmente, estamos mais limitados nessa capacidade, mas isso não diminui a nossa determinação. Sabendo que as próximas legislativas colocam de facto esse quadro com uma grande clareza, a questão decisiva é que nós saiamos dessas eleições com mais força e mais capacidade de influenciar as decisões nacionais. Porque, mais reforçados, estamos em melhores condições de garantir que a solução política e que a política a executar vá mais ao encontro dos interesses dos trabalhadores e do povo do que foi esta política executada nestes últimos quatro anos, que é claramente insuficiente.

Sem papéis assinados?

A questão de haver um papel ou não haver um papel foi uma questão de cedência da parte do PS à exigência que era feita pelo Presidente da República na altura. Se bem se lembra houve até declarações, salvo erro do meu camarada Jerónimo de Sousa, que disse que, por nós, [haver] papel ou não haver papel, a palavra dada é aquilo que é respeitado.

Portanto, será isso.

Portanto, a questão de haver um papel ou não haver um papel assinado foi mais uma questão de imposição do Presidente da República, que o PS assumiu. Porque do nosso ponto de vista aquilo que era verdadeiramente decisivo era o compromisso com medidas que respondessem aos problemas dos trabalhadores e do povo. Nós sabíamos que com esta correlação de forças não era possível tudo aquilo que é necessário para resolver os problemas do país. E também não enganámos ninguém. Nunca alimentámos ilusões quer em relação às opções e aos compromissos do PS, quer em relação às possibilidades que esta correlação de forças permitia. Não desistimos de lutar por uma outra correlação de forças que seja ainda mais favorável aos trabalhadores e ao povo com mais força do PCP e da CDU.

E acredita que no futuro é possível então fazer mais com o PS?

Não. Acreditamos que quanto mais força tiver a CDU mais fácil...

Mais pode fazer com o PS?

Mais se pode influenciar as decisões nacionais. Isso depende sempre também das opções que faz o PS. Se, como dizia o ministro Augusto Santos Silva há uns dias atrás, se o PS mantiver a opção de dizer que o compromisso maior do Governo é com as regras da zona euro e da União Europeia, naturalmente percebe-se ai uma contradição entre esse compromisso que o PS assume como compromisso maior e as medidas que é preciso tomar, que acabam espartilhadas por esse compromisso. Mas isso é uma opção que o PS faz. Para nós não é surpresa que o Governo e o PS a façam. É preciso é que os portugueses digam o que é que é decisivo e o que é prioritário e o que é mais relevante, se são essas regras da zona euro e da União Europeia se são os problemas económicos e sociais do país que continuam por resolver. A nossa perspectiva é de que é a segunda, porque o nosso compromisso é com os trabalhadores e com o povo não é com as regras da zona euro nem com a União Europeia.

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