E se o que sobra da cantina ajudar famílias carenciadas? Freguesias dão nova vida às coisas

Financiamento de projectos de economia circular vai repetir-se no próximo ano, com maior orçamento. Este ano juntas de freguesias candidataram 110 projectos, 55 aprovados. Tabuaço é concelho recorde, com iniciativas financiadas em 12 das suas 13 freguesias.

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Fernando Veludo n/factos

“Picuote de ruoda” é mirandês para Picote circular. O projecto foi buscar o nome à freguesia de Miranda do Douro onde vai ser desenvolvido e ao conceito económico em que se insere: é um das propostas de economia circular que 55 freguesias portuguesas vão pôr em prática até ao final do ano, com quase um milhão de euros do Fundo Ambiental. A ideia da junta de Picote é resgatar as sobras de refeições de diferentes instituições que gere – começando com um lar de idosos, três escolas e uma estalagem – para distribuir por famílias carenciadas da vizinhança. E depois encaminhar os resíduos para compostagem, para fertilizar um horto de espécies autóctones.

Há outros exemplos: um projecto de recolha e redistribuição de roupa de bebé (Benfica); uma oficina comunitária (Olivais); uma biblioteca de ferramentas e materiais (Campo de Ourique) e uma feita de livros usados (Matosinhos e Leça da Palmeira).

Esta é a chegada do financiamento público aos projectos de economia circular a nível local. Esse conceito, de que cada vez mais se fala, consiste na tentativa de alargar o ciclo de vida dos materiais, dando-lhe novos usos, reciclando ou apostando na redução. O Governo está, desde 2017, a promover a transição para este tipo de economia, tendo aberto cinco avisos para financiamento de projectos. O JUNTAr é um deles e o primeiro dirigido às juntas de freguesia. Até agora, estas, estando vedadas aos fundos comunitários, não tinham apoio nesta área.

A novidade colheu frutos: houve 110 candidaturas, 55 das quais aprovadas após avaliação de uma comissão. Cada projecto é financiado a 85% pelo fundo do Ministério do Ambiente, até um máximo de 25 mil euros. O que não impede as freguesias de irem bastante além do financiamento, como é o caso da União de Freguesias de Merelim São Paio, Panoias e Parada de Tibães, em Braga, que tem um seu projecto orçado em mais de 47 mil euros.

"Europa só tem 9% dos materiais físicos que precisa"

Os projectos distribuem-se por freguesias de 34 concelhos. Entre eles, Tabuaço, no distrito de Viseu, é o município com mais projectos financiados, atribuídos a 12 das suas 13 freguesias. Segue-se Lisboa com sete projectos e Braga, Famalicão, Cascais e Évora, com dois cada um.

“Há uma relação muito forte entre território e economia circular. Dito de outra forma, a proximidade conta”, diz o ministro do Ambiente. João Matos Fernandes vê nas juntas de freguesia “os parceiros de excelência” para fomentar este movimento a nível local, “a ver se se acaba com a heresia de achar que é melhor deitar fora e comprar novo do que mandar reparar”. Alguns projectos promovem a reutilização de materiais, outros fazem-nos a pensar especificamente na alimentação.

Para o governante, é urgente repensar a produção e o consumo. “O problema mais crítico que a Europa tem, pensado a prazo, é o dos materiais. A Europa só tem 9% dos materiais físicos que precisa para o desenvolvimento da sua economia. Por isso temos mesmo que dar mais vida aos materiais e garantir que o valor económico dos bens se mantém durante mais tempo”, sublinha Matos Fernandes. A intenção é que para o ano haja uma nova edição do JUNTAr, com maior orçamento e capacidade de apoiar mais projectos.

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