A CPLP com novos olhos e um pouco mais de sal

Com a transmissão da presidência da CPLP, do Brasil para Cabo Verde, abre-se nova etapa, com novos olhos (mais observadores) e o sal de novas propostas.

Começa esta terça-feira, na cabo-verdiana ilha do Sal, a 12.ª cimeira da CPLP (Comunidade de Países da Língua Portuguesa), e logo num dia que coincide com o do seu 22.º aniversário. Motivo para festa? No seu contexto, nunca se sabe. Há sempre uma satisfação epidérmica, que emana dos discursos dos seus representantes, mas raramente a devemos dar por garantia de que algo muda de forma eficaz e com a ênfase necessária para que os objectivos de tal comunidade se imponham.

A alegria mais recente vai para as crescentes candidaturas ao estatuto de observador. Se imaginarmos a CPLP numa redoma de vidro, discutindo e limando arestas aos seus assuntos, o número de olhos em torno dela cresce e promete crescer ainda mais. Aos actuais dez membros (Maurícias, Senegal, Geórgia, Namíbia, Turquia, Japão, Hungria, República Checa, Eslováquia e Uruguai) pretendem juntar-se, e a isso se candidatam, Andorra, Itália, Chile, Argentina, Sérvia, França, Luxemburgo, Reino Unido e a Organização dos Estados Americanos. Por este andar, e sem ironia, teremos aqui uma pequena “ONU”, com nove países de pleno direito (Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste) e mais do dobro como observadores. E o que observam estes novos olhos? A pujança da língua portuguesa, a rica diversidade das culturas dos países que a têm por língua oficial (a Guiné Equatorial é, aqui, um erro de casting, já se disse e repetiu, embora seja uma inteligente jogada política dos que ditatorialmente a governam)? Em sonhos, sim. Na realidade, buscam oportunidades de negócio. O que, sendo “natural” num mundo onde o poder do dinheiro se sobrepõe a tudo o resto, deixa algo a desejar quanto aos objectivos traçados pela CPLP logo no primeiro artigo dos seus estatutos, arvorando-se em “foro multilateral privilegiado para o aprofundamento da amizade mútua, da concertação político-diplomática e da cooperação entre os seus membros.” Alguma vez o foi? Os seus membros que o digam, sem rodeios nem mistificações. Agora, com a transmissão da presidência da CPLP, do Brasil (o país mais populoso da comunidade) para Cabo Verde (um dos menos populosos), que irá exercer tal cargo nos próximos dois anos, abre-se nova etapa, com novos olhos (se aumentar o número de observadores) e um pouco mais de sal (Cabo Verde apresentará à cimeira “três grandes declarações” subordinadas ao lema “Pessoas, Cultura, Oceanos”). O que daqui sairá, só o saberemos quando as palavras se tornarem actos. Esperemos que com menos decepções do que no passado.

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