“A União Soviética acabou há muitos anos e o Putin não é a Rússia”

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Vladimir Putin e Gianni Infantino antes da cerimónia de entrega do troféu de campeão do mundo à França LUSA/FACUNDO ARRIZABALAGA

Quando, a 14 de Junho, se realizou o jogo de abertura do Mundial 2018, é provável que Gianni Infantino tenha antecipado os 31 dias que se iriam seguir com apreensão. As ameaças de terrorismo e de hooliganismo; a tensão política entre o Kremlin e meio Mundo, faziam da opção de oferecer a prova à Rússia uma aposta de risco. Porém, após uma maratona de 64 jogos, o presidente da FIFA entregou a taça de campeão do mundo à França encharcado, mas livre de qualquer embaraço. Após um Mundial quase perfeito, a Rússia (e Vladimir Putin) respirou de alívio. Mas o que fica para os russos após o fechar da cortina? Para Sara Alcântara, um das poucas portuguesas que vivem em Moscovo, um dos maiores legados deste Mundial é “deixar claro que a Rússia não é um bicho-de-sete-cabeças”.

Moscovo é uma metrópole frenética com quase 12 milhões de habitantes, mas encontrar portugueses na capital da Rússia é mais difícil do que descobrir uma agulha num palheiro. Sendo óbvio que lusofonia não rima com Moscovo, há quem tente remar contra a realidade. Sara Alcântara tem 31 anos, mas uma década de experiência russa. Em 2007, quando frequentava o curso de Línguas e Literaturas Modernas, aproveitou um intercâmbio para aprender russo durante um mês. Gostou. Encontrou em Moscovo “uma cidade fascinante”. Mudou-se definitivamente para a Rússia em 2012.

E, em seis anos, a actual directora pedagógica do Centro de Língua e Cultura Portuguesa ficou a perceber que é difícil criar laços com conterrâneos. Na Rússia, diz em conversa com o PÚBLICO, há “uma emigração diferente”, que “não é para todos”. Há quem veja o país do Kremlin como algo “misterioso e desconhecido”, mas a crise também não ajuda. “Antes da queda do rublo, havia bastantes portugueses. Nessa altura um grupo de 10 a 15 pessoas saía com regularidade. Em seis meses desapareceram todos. Trabalhavam em empresas internacionais e deixou de ser rentável estar na Rússia”, explica.

Sara Alcântara, no entanto, não poupa nos elogios a Moscovo, uma “cidade cosmopolita, moderna e aberta, com imensas possibilidades culturais”, que ficou “ainda mais moderna” com as obras feitas para receber o Mundial. Para um país habitualmente associado a uma imagem sisuda e fechada para o resto do mundo, a viseense espera agora que ao upgrade na qualidade de vida se associe uma viragem na imagem do país. 

“Há uma série de estereótipos que já não correspondem à realidade. A União Soviética já acabou há muitos anos e o Putin não é a Rússia. Nas maiores cidades, a maioria das pessoas não o apoia”, refere esta portuguesa. Sem rejeitar que o actual presidente russo teve “um papel importante, trazendo estabilidade, naqueles loucos anos 90 onde a Rússia era um faroeste”, Sara Alcântara considera que a permanência de Putin no Kremlin “arrasta-se há demasiado tempo, mas na Rússia moram pessoais normais, com os mesmos problemas dos restantes europeus”. “A projecção internacional neste momento é menos positiva, mas é inegável que essa é também uma questão política”, conclui.

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