A culpa é nossa

Mais um grande restaurante regional que foi turistificado. Está irreconhecível. Os clientes são quase todos da mesma nacionalidade. Naturalmente gostam de ouvir a própria língua. Mas do que gostam mais é de uma cozinha que de há dez anos para cá foi cuidadosamente adaptada aos gostos daquela cultura até ficar a versão pseudo-mediterrânica, cheia de alho e de picante, que eles gostam de comer.

A maioria dos clientes já vive em Portugal há muito tempo. Aqui há duas observações a fazer. A primeira é que é natural que um restaurante se modifique para ir de encontro às expectativas da clientela. Que sentido faria continuar com a oferta regional destinada a clientes portugueses se a grande maioria dos clientes habituais é de outra nacionalidade europeia? O restaurante adaptou-se para sobreviver, para pagar as contas e para ganhar a vida. Está certo.

A culpa até é dos portugueses. É culpa de nós os antigos clientes porque deixámos de lá ir com frequência mal detectámos os primeiros sinais de turistificação. Se tivéssemos teimado, se tivéssemos ficado para protestar e para persuadir em número suficiente para poder fazer diferença, o restaurante até se teria mantido parcialmente fiel às origens.

Os segundos culpados são os empregados portugueses. São simpáticos e não têm ponta de xenofobia mas têm para com os turistas - a que chamam cámónes - uma atitude paternalista e condescendente. Em vez de lhes dar os mesmos pratos regionais que dão aos portugueses, dando-lhes oportunidade para se habituarem e virem a gostar, sugerem-lhe pratos meias-tintas como massas e hamburgers.

O resultado é pesaroso mas a culpa é nossa.

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