O ódio no amor

O que interessa é que o amante que diz que odeia não fala nem quer falar de outra pessoa.

Quando uma pessoa diz que odeia a pessoa por quem diz já não estar apaixonada é porque ainda está apaixonada por ela. O que ela odeia é a ideia e o medo que a outra pessoa já não esteja apaixonada por ela.

A intensidade do ódio é a mesma que a do amor. É uma maneira de manter a febre de envolvência com a pessoa amada. Odeia-a para estar sempre a pensar nela. Odeia-a para o amor não morrer. Odeia-a para atirar gasolina para as brasas.

Odeia para haver continuação. Não há ódio sem objectivos: vinganças, lições, juramentos. O ódio garante que o amor não acaba ali.

O contrário do amor não é o ódio - é a amizade, é a indiferença, é a satisfação, é o esquecimento. Não é o ódio - é o tédio e a vontade de amar alguém e o medo saudável que isso nunca mais aconteça.

A prova que o ódio é só amor zangado é a dificuldade de criar ódio a outra pessoa. Não se consegue forçar. Talvez se consiga fingir durante pouco tempo. Mas será um fingimento pouco convincente, semelhante a outro fingimento pródigo em quem ama: o da indiferença, esse popular aperitivo.

É o equivalente amoroso da manobra "quem desdenha quer comprar". Não interessa se está a dizer mal ou bem. O que interessa é que está sempre a falar duma pessoa. Escolheu ocupar assim o tempo.

O que interessa é que o amante que diz que odeia não fala nem quer falar de outra pessoa. A raiva é como estar possesso e o diabo é a pessoa que se ama que não nos larga só porque nós não queremos.

Este ódio é o amor zangado por não ser sempre só amor.

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